A identidade brasileira: mito e literatura – José de Paula Ramos Jr.
A identidade brasileira: mito e literatura
– José de Paula Ramos Jr.
A identidade brasileira não é uma essência, mas o processo de construção de uma grande narração coletiva em que o mito exerce papel decisivo. Porque é o mito que consolida em lendas e figuras toda experiência mágico-fantástica do povo. Tudo que apavora, tudo que alegra fundamente o povo está no mito, em suas raízes. Ele narra, conta.
Se não faz isso, as coisas se perdem por entre rezas, rituais, festanças, assombrações – coisas míticas também – mas que o vento pode levar. Isso se evidencia na literatura, especialmente na obra de autores românticos e modernistas, que insistiram na providência do folclore, das festas rurais, no registro das façanhas caboclas…
Todas dão o perfil de nossa identidade. Mas o mito tem também o poder de destilar realidades nunca imaginadas antes, e, neste sentido, ele não é só passado, mas vanguarda, nem só Brasil, mas universo. Idealizadora ou crítica, a literatura apropria-se do mito para reconstruir o imaginário nacional.
José de Paula Ramos Jr.
Possui graduação em Letras pela Universidade de São Paulo (1989) e
doutorado em Literatura Brasileira pela mesma instituição (2006).
Atualmente é professor doutor no Departamento de Jornalismo e Editoração
da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Tem
experiência nas áreas de Letras e de Editoração, com ênfase em
Literatura Brasileira e Portuguesa, atuando principalmente nos seguintes
temas: crítica literária, história literária, ecdótica e crítica
textual.
Veja a entrevista: http://cmais.com.br/nossalingua/bloco-02-nl-cmais
E... poeta
Epifania
Ninfa da manhã, matinal magia,
miragem na bruma plúmbea.
À margem do trêfego tráfego,
que trepida estremunhado,
esvoaças distraída na calçada,
como um langoroso sonho.
..........................................
Solavancos no meu coração.
De Inventione1 Fico parado, quieto.
Se espero, nada vem,
Ou vem (pior!) postiço,
Fala falsa do que não há,
Palavras ocas, palavrório.
Nenhuma poesia pousa
Na página atulhada de signos.
E não há sintaxe que anime,
Prosódia melíflua que encante,
Ou truque de imagem que esconda
A só carcaça de versos.
O poema impostor não se impõe, perece. 2
Fico parado, quieto. Se nada espero, nada vem,
Ou vem (bem!) sem querer,
Não se pode evitar;
Palavras aladas assumem controle
E semeiam a folha muda de signos,
Que dançam e cantam e rompem
A espessa caligem das coisas.
É quando a poesia pousa
Numa flor inútil
E nela deposita, como borboleta,
O pólen que a fertiliza.

A Machado de Assis
Menino, no caminho da escola primária,
teu nome eu soletrava na placa de rua,
sem saber mais que o som daquelas letras nuas
entre os ramos dourados de cachos de acácias.
Quem foste, velho bruxo?
Ao desnudar falácias,
expor que a vida é um vício e um vaso de imposturas,
os livros, que escreveste na idade madura,
mostraram a alma humana,
e como ela é precária.
Bentinho, Capitu, Cristiano, Sofia,
Quincas Borba, Brás Cubas, Simão Bacamarte,
Dona Carmo, Virgília, Paulo, Pedro, Flora,
e tantas personagens que não digo agora,
criaste, entre o riso irônico e a melancolia,
como acácias eternas no jardim das artes.

Murilo Mendes ad Oraculum
Serei pastor de meus dias?
O que a alma e as cordas do cor?
Suaves sirenas sopram serenas a manhã abismal ou delicada?
A voz do piano no caos,
firmamento, movimento, equilíbrio do azul rendilhado,
sussurra que segredo ao vento, sol, lua, marés...?
............................................
Todo mortal lamento não passa de escuma:
miragem de um susto, apenas.

A um Poeta
para Frederico Barbosa
Agudo pensamento, coração preclaro,
o poeta
cata um grão esconso
no labirinto nada.
O poeta
a palavra vela e o signo
rala na linha vasa:
muda geometria.
Eis, súbito, um projétil,
que não falha,
a língua tesa prepara.
O poeta,
zarabatana calada,
no silêncio do rigor,
raro artefato dispara.

Lição de Elementos
Para faca, água;
para murro, terra;
para fera, fogo; para vida, ar.
Em você se acanhe o medo,
em você se mostre a raça de água,
terra, fogo e ar.

Aquiles
A minha morte escolho nesta hora,
ao pé do corpo frio que jaz inerte.
No campo de batalha, junto a Tróia,
não mais verei, entrando nessa tenda,
sentado no divã, tocando a lira,
o amigo que foi morto em meu lugar.
Tristes despojos, Pátroclo divino,
regressas sem a vida e sem o escudo,
teu cadáver saqueado à tenda torna,
pilhado da armadura que envergaste.
Heitor, que te deu fim,
e agora empunha as armas que brandiste bravamente,
ufano está do feito vitorioso.
Pois regozije enquanto a Moira escura
no gume de meu gládio não provar.
Bem sei que morrerei dessa vingança,
assim me foi predito pelos deuses;
mas nada vale a vida sem a cólera,
que me dará na morte eterna glória.

Canção de Anquises
Não reflete o bronze polido
a imagem dos passados anos:
a fronte sem marca de cãs, sem rugas,
braços vigorosos, luz no olhar, aprumado dorso,
o viço na pele rosada, pernas firmes.
Oh, juventude!
Um dia, no passado esplêndido,
subi ao leito de Afrodite.
Agora, vejo a decadente massa deformada insinuar,
na comissura de meus lábios pensos,
a pena iniludível, que aguarda a todo ser humano.
Ao pé das muralhas de Tróia devastada,

http://www.jornaldepoesia.jor.br/jpr.html
http://radiofm.cmais.com.br/jose-de-paula-ramos-jr
Li-Sol-30
Fonte:
Café Filosófico - CPFL Cultura
http://www.discussoesereflexoes.com.br/2010/11/08/a-identidade-brasileira-mito-e-literatura-jose-de-paula-ramos-jr/#.UBv_5sDw94s.blogger
Sejam felizes todos os seres.Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.



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