sexta-feira, 22 de outubro de 2010

CÂNDIDO PORTINARI



Exposição traz 25 momentos de Portinari
Mostra com reproduções das obras do artista, 
que ilustram o Relatório de Atividades 2009 da FAPESP,
é inaugurada na sede da Fundação e ficará aberta
ao público até 30 de novembro

Exposição traz 25 momentos de Portinari

Por Fábio de Castro

Uma exposição com as 25 obras do artista Candido Portinari (1903-1962) que ilustram o Relatório de Atividades FAPESP 2009 foi inaugurada nesta quarta-feira (20/10), em São Paulo, na sede da Fundação. A mostra ficará aberta ao público até o dia 30 de novembro.

O evento teve a participação do fundador e diretor-geral do Projeto Portinari João Candido Portinari – filho do pintor –, do presidente da FAPESP, Celso Lafer, dos membros do Conselho Técnico Administrativo – diretor presidente Ricardo Renzo Brentani, diretor administrativo Joaquim José de Camargo Engler e diretor científico Carlos Henrique de Brito Cruz –, além dos membros do Conselho Superior da Fundação.
Pelo quinto ano consecutivo, o Relatório de Atividades homenageia artistas plásticos que nasceram ou se radicaram em São Paulo. A edição de 2005 apresentou obras de Francisco Rebolo (1902-1980), seguida por Aldo Bonadei (1906-1974) no ano seguinte, Lasar Segall (1891-1957) em 2007 e Tarsila do Amaral (1886-1973) em 2008.

“O relatório de 2009 homenageia esse homem e esse extraordinário artista que foi Portinari. Uma das obras reproduzidas, os painéis Guerra e Paz, foi considerada pelo próprio Portinari como sua melhor obra. Pessoalmente, também acho que essa obra é uma síntese do trabalho de um artista de muitas facetas”, disse Lafer.

A seleção das obras, segundo João Candido, procura mostrar os principais momentos da carreira do artista. “Uma carreira com mais de 5 mil obras, com uma temática muito abrangente: temas sociais, históricos, religiosos. Ele abordou com muita recorrência as festas populares, o trabalho e a criança. Além das questões universais, sua obra é um grande retrato do Brasil”, disse à Agência FAPESP.

Durante o lançamento da exposição, João Candido apresentou a palestra Do cafezal às Nações Unidas. O título remete à longa trajetória artística de seu pai, que teve início nos cafezais por ele retratados – o pintor, filho de imigrantes italianos, nasceu em uma fazenda na região de Brodowski, no interior paulista – e culminou com a criação dos dois painéis de 14 metros de altura com o tema Guerra e Paz, concebidos especialmente para a sede das Nações Unidas em Nova York.

“Sua obra pode ser sintetizada na famosa frase do escritor russo Leon Tolstoi: ‘se queres ser universal, começa por pintar a tua aldeia’. Esse movimento de universalização ocorre paulatinamente em seus trabalhos”, disse João Candido.

Os painéis Guerra e Paz mostram o ápice desse movimento em direção ao universal. As crianças de todas as raças que brincam no painel Paz, por exemplo, claramente não são mais os meninos de Brodowski, segundo João Candido.
“No painel Guerra não há armas, 
tanques ou soldados 
– há apenas dor,

que ele retratou no maior sofrimento conhecido pelo ser humano: a imagem da mãe que perdeu o filho. O painel tem seis a oito dessas figuras, que são autênticas pietàs. Na série Retirantes, da década de 1940, encontramos também a mãe com o filho morto. Sem dúvida, trata-se também de uma pietà, mas inserida em um drama brasileiro. No painel Guerra, vemos o drama universal”, explicou.

De acordo com João Candido, o trabalho de seu pai tem como característica um experimentalismo incessante – a ponto de críticos dizerem que na obra de Portinari há uma dezena de pintores diferentes. Mas a temática é sempre a mesma: a profunda preocupação social.
“Ele foi mudando o estilo e a forma de expressão. Dava importância à técnica, dizia que sem ela é impossível expressar o que vai na alma, mas destacava que seu tema era o homem. Está presente invariavelmente em sua obra esse desejo profundo de solidariedade e de compaixão. É uma obra permeada de valores sociais e humanos”, disse.

Uma versão on-line das reproduções expostas no hall da FAPESP está disponível em: www.fapesp.br/publicacoes/portinari.

Candido Portinari

Pintor fundamentalmente realista, Candido Portinari – filho de imigrantes italianos nascido em 1903, em uma  fazenda de café em Brodowski, SP, e falecido em 1962, no Rio de Janeiro – demonstra, desde logo, a vontade de enfocar o habitat nacional, visto a partir dos personagens a ele associados. Fiel a esse programa, elabora uma vasta galeria dos tipos sociais e étnicos brasileiros. Trabalhadores gigantescos, grupos de retirantes – ora “clássicos”, ora expressionistas –, crianças brincando convivem lado a lado com uma vasta produção de retratos, que se distinguem pela captação da essencialidade psicológica dos modelos.

O prêmio ganho por Café (1935) na Exposição Internacional de Arte do Instituto Carnegie, de Pittsburg (1935), chama a atenção do ministro Gustavo Capanema, que lhe encomenda a feitura dos afrescos dos “Ciclos econômicos” (1936-1944) para o edifício do Ministério da Educação e Saúde. Uma concepção altamente sintética é o traço distintivo do conjunto. Inspirando-se no exemplo dos primitivos italianos, o pintor reduz o ambiente natural a poucos elementos referenciais, recorre a uma arquitetura simbólica para alguns fundos, a fim de poder melhor destacar o aspecto colossal e escultórico dos trabalhadores e dar a ver o equilíbrio alcançado entre a deformação das figuras e o rigor geométrico da composição.

Outra encomenda oficial marca o ano de 1936: a realização de quatro painéis para o friso do Monumento Rodoviário da estrada Rio de Janeiro-São Paulo. Lançando mão de uma técnica insólita, Portinari confere um tratamento metálico e mecânico a uma composição dominada por um realismo gigantesco e, desse modo, antecipa o realismo radical dos anos 1960. Nas décadas de 1940 e 1950, o pintor dedica-se a trabalhos de vastas proporções, alguns dos quais de caráter histórico, como os murais para a Fundação Hispânica da Biblioteca do Congresso de Washington (1941), A primeira missa no Brasil (1948), Tiradentes (1949) e Chegada de D. João VI ao Brasil (1952). 

Apesar da temática, o que deve ser ressaltado nessas obras é a leitura particular que o artista faz da história: o que lhe interessa é destacar a dimensão humana dos acontecimentos, suas relações com o cotidiano, e não a celebração oficial do herói ou do episódio.

Nos anos 1940, o realismo de Portinari transforma-se num expressionismo exacerbado, em virtude do impacto de dois acontecimentos: a Segunda Guerra Mundial e a visão de Guernica (1936), de Pablo Picasso. Os tons cinza da obra deste migram para a paleta do pintor brasileiro na Série bíblica (1942-1943), em que a deformação se torna muito contundente e agressiva. Outras obras do período trazem igualmente a marca do impacto de Picasso: a série Retirantes (1944), mais controlada do que as figuras bíblicas em termos dramáticos e caracterizada por uma rica gama cromática; e o painel São Francisco se despojando das vestes (1945), em que é alcançado um ponto de equilíbrio entre a deformação expressionista e uma concepção mais clássica e mais contida.

Aspectos do Portinari expressionista estão também presentes nos painéis Guerra e Paz (1953-1956), doados pelo Itamaraty à sede das Nações Unidas em Nova York. Inspirados no livro do Apocalipse e nas Eumênides (Ésquilo), os painéis, concebidos de maneira intemporal, podem ser considerados uma espécie de síntese iconográfica da trajetória do pintor. Cenas da vida na roça, a mãe com o filho morto, os retirantes, os meninos de Brodowski, dentre outros, transformam-se em símbolos de toda a humanidade, enfatizando o compromisso humanista de Portinari e justificando, mais uma vez, sua opção por uma linguagem realista.

Annateresa Fabris

Apresentação

 Fonte:
Agência FAPESP
21/10/2010
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres. 
Sejam abençoados todos os seres.

Nenhum comentário: