sábado, 12 de março de 2011

VONTADE DE PODER EM NIETZSCHE





Sobre a Vontade de Poder em Nietzsche
Paula Ignacio

O filósofo alemão Friedrich Nietzsche, no livro Genealogia da Moral, mostra em um primeiro plano a necessidade de desconstruir a moral já dada do homem ocidental, afim de descobrir como seria a moral ideal, de acordo com a natureza humana.

            Para isso, ele analisa e critica a historiografia da moral do homem ocidental, o valor que têm todos os valores construídos até então. Questiona o uso de ideologias, de crenças, pois essas estabelecem valores falsos e ofuscam a realidade.       

            E nos mostra que por trás dos valores construídos pelo homem, tais como a justiça, liberdade, igualdade, esconde-se a Vontade de Poder pervertida.
Os homens construíram a história como se existissem fenômenos morais. Nietzsche nos adverte de que o que existe são as interpretações morais dos fenômenos.

Ao interpretar, o homem necessariamente estabelece um valor, que é dado pela sua perspectiva. O perspectivismo é subjetivo, e, nesse caso, falta ao conceito de realidade, uma vez que não há nada que justifique o imaginário.

Nietzsche passa então a desconstruir a moral como a conhecemos, e tenta estabelecer uma nova moral, de acordo com a natureza do homem, tal como ele observa ao longo da história. A sua moral nada tem a ver com efetividade, como a moral aristotélica, por exemplo. A moral que Nietzsche nos apresenta procura elevar em muito a verdadeira natureza dos homens.

            Em um primeiro momento, ele vai sugerir a gênese da vontade de poder, partindo de dados históricos, e principalmente através das relações entre senhores e escravos, os soberanos e os submetidos à soberania.
           
            Os soberanos estabeleciam valores. E partiam de si mesmos para definirem primeiramente o conceito de “bom”. Logo, de uma afirmação de si mesmos, para a aceitação e definição de tudo o que poderia ser considerado como “bom” para todo o restante.
           
Já os escravos valoravam a bondade a partir de um ressentimento, de um sentimento de negação dos seus superiores. Como a origem do conceito de bom segundo Nietzsche é aristocrática, os escravos viam em seus senhores tudo o que eles não poderiam ser, ou seja, tudo o que era bom, era a negação de si mesmos. Para que pudessem se vingar dessa negação, não estabeleceram nada do que fossem eles mesmos como “bom”, então negaram seus senhores. “Se ele for mau, logo, eu serei bom”. Enquanto os nobres eram bons afirmando a si mesmos, os submissos só eram bons enquanto negavam os nobres. E negar atitudes nobres não pode ser considerado necessariamente como uma coisa boa. Pelo contrário, para o filósofo, é sinônimo de fraqueza. E essa é a moral tal como a conhecemos hoje. Tudo o que vem da fraqueza é considerado como “bom”.

Os homens, no decorrer da história ocidental, foram agregando significações pervertidas aos valores que iam se estabelecendo, tal como fizeram os escravos. 

O homem é o único, dentre os animais, capaz de medir e calcular o poder do outro. Por essa razão, os submetidos transformaram-se em homens do ressentimento. Os homens fracos, aqueles que esperavam pelo momento oportuno para tentarem se vingar dos mais fortes, exatamente por serem fracos e reprimirem seu desejo de vingança. E por conta dessa necessidade de vingança oprimida alimentaram mais o ressentimento. Só foram capazes de agir quando do surgimento das leis e da justiça, que foi criada exatamente para desviar a vontade de poder dos ressentidos.

A valoração dada à justiça também partiu do ressentimento dos fracos. A justiça é uma maneira desses homens se vingarem através das leis, que exaltam o comportamento submisso, numa tentativa de efetivarem sua vontade de poder, quando alguém é castigado por não agir de acordo com os princípios básicos da submissão.

Assim se imaginou o castigo como inventado para castigar. Mas todos os fins, todas as utilidades são apenas indícios de que uma vontade de poder se assenhoreou de algo menos poderoso e lhe imprimiu o sentido de uma função (…) colocou-se em primeiro plano a “adaptação”, ou seja, uma atividade de segunda ordem, uma reatividade, chegou-se mesmo a definir a vida como uma adaptação interna às circunstâncias externas, mas com isso se desconhece a essência da vida, a sua Vontade de Poder; com isso não se percebe a primazia fundamental das forças espontâneas, agressivas, expansivas, criadoras de novas formas, interpretações e direções”.[1]

           
            Através das leis, são valorados conceitos de liberdade, justiça e igualdade como bons e necessários a uma sociedade de paz. Mas todos esses conceitos nascem da força do ressentimento, uma vez que a justiça é a sede de vingança, a igualdade não é o fim último dos homens, pois não comporta a vontade de poder, e a liberdade não é dada aos homens para agirem conforme sua natureza.

            Na “sociedade de paz”, o homem se viu obrigado a reprimir seus instintos agressivos. E a crueldade, que antes voltava-se para fora, ou seja, para outros homens, acabou sendo sufocada e internalizada. O homem da moralidade foi inibido de sua descarga para fora. A hostilidade, a crueldade, o prazer na perseguição, no assalto, na mudança, na destruição – tudo isso se voltando contra os possuidores de tais instintos.

            A vontade de poder, que comporta todos esses instintos naturais do homem, foi pervertida e internalizada, e agora procura desesperadamente tornar-se imperceptível através do estabelecimento de determinados valores morais, tais como nos são dados.

Violentamos a nós mesmos hoje em dia, não há dúvida, nós, tenazes, quebra-nozes da alma, questionadores e questionáveis, como se viver fosse apenas quebrar nozes; assim nos devemos tornar cada vez mais passíveis de questionamento, mais dignos de questionar, e assim mais dignos talvez – de viver? Todas as coisas boas foram um dia coisas ruins; cada pecado original tornou-se uma virtude original (…) os sentimentos brandos, benevolentes, indulgentes, compassivos – afinal de valor tão elevado, que se tornaram quase “os valores em si” – por longo tempo tiveram contra si precisamente o auto-desprezo: tinha-se vergonha da suavidade, como hoje se tem vergonha da dureza”.[2]

            Após colocar esse problema, da falsa moral, Nietzsche procurou tentar estabelecer uma moral verdadeira, onde o homem pudesse agir seguindo esses instintos naturais, sufocados até então. Podemos chamar de imoralidade, pois parte de princípios diferentes da moral tal como a conhecemos. Uma tentativa de restauração do egoísmo humano.


Uma Nova Moral Adaptada à Vontade de Poder

            Os homens da “imoralidade” nietzscheana deveriam ter almas frias e rudes, e o distanciamento de qualquer tipo de afetuosidade.

            Seria de extrema importância a estima por si próprio. Esse homem deveria deixar-se guiar apenas pelas “paixões afirmativas”, que são as maiores fontes de força, tais como o orgulho, a saúde, o instinto sexual, a hostilidade, o amor pela guerra e a vontade de poder.

            Neste caso, o elogio seria apenas e tão somente uma maneira de exercer e manifestar o sentimento de poder, pois “o que elogia afirma, avalia e julga, arroga-se o direito de conceder, de atribuir honras e louvores[3]. Só é capaz de elogiar aquele que exalta a vida e tem a consciência do seu poder. O elogio pode atuar até mesmo como vingança dos mais fortes sobre os fracos. Uma forma de manifestação do poder de se impor ao outro, de dar o seu parecer, e essa é uma manifestação da sua vontade de poder.

            No entanto, exaltar o heroísmo é para os fracos. O homem da vontade de poder não quer perecer, pois a vontade de perecer num ato heróico não é vital e não diz respeito à natureza. O homem forte entrega-se às paixões afirmativas, dessa maneira, contemplando a vida.

            O instinto sexual é de suma importância, dentre as paixões afirmativas. “A excitação sexual crescente mantém uma tensão que tem alívio na sensação de poder. Querer dominar é sinal distintivo de homens sensuais, o declínio do instinto sexual traduz-se por uma diminuição da sede de poder (…) o poder alberga o prazer de provocar sofrimento, em conseqüência a uma imitação profunda do organismo, que incessantemente deseja vingança”.[4] Dessa forma, quanto mais reprimidos forem os desejos sexuais, maior a ambição de poder.

            No entanto, o maior dentre os instintos dos homens é o desejo de atacar. E isso foi reprimido na sociedade de paz. O homem forte tem instinto belicoso. A subordinação, a submissão e a obediência não fazem parte dessa parte belicosa, mas sim dos homens que seguem a moral cristã. O homem que é capaz de atacar é o que mais interessa nessa nova moral. Aqueles que são capazes apenas de se defenderem de ataques têm a necessidade de virtudes, e sobrevivem com elas numa falsa moral, com falsos valores “virutosos”.

            Predominam nos homens as sensações de força ou de fraqueza, antes mesmo das sensações de prazer e dor. O prazer e a dor podem também estimular a sensação de poder, mas antes delas, a força ou a fraqueza são aquelas que guiam os seus instintos e as paixões as quais irão seguir.

            Ao tratamos de paixões, não podemos confundi-las com as paixões “desvirtuosas” como vícios, ou impulsividade. Nietzsche questiona a impulsividade. Os fortes agem conforme os instintos, buscando as paixões afirmativas, mas não necessariamente com pressa nas suas tomadas de decisões.

            Dessa forma, seguir aos instintos deve servir ao propósito de desenvolver a sua própria força dominante. Ser virtuoso apenas para agradar aos outros é, de certa forma, uma falta de respeito por si mesmo e pela própria natureza.

A falta de respeito por si próprio vinga-se, através de todo o gênero de deficiências: na saúde, na firmeza, na coragem, no bem-estar, no orgulho, na vivacidade. Mais tarde não perdoamos à nós mesmos por essa falta de verdadeiro egoísmo, encaramos isso como uma objeção, uma incerteza, quanto à natureza do eu verdadeiro”.[5]

            É necessário muito cuidado ao estipular valores virtuosos, pois se estes não seguirem a natureza humana que comporta a vontade de poder, elas podem constituir numa renúncia de si mesmo e ao poder, à vontade de dominação.

            Aqueles que compreendem que não se deve odiar o mal, mas que ele também não deve ser enfrentado, procuram agir “virtuosamente” afim de evitar provocá-lo. Podemos perceber este tipo de comportamento nos ascetas, nos tipos “búdicos” amolecidos. E seres “amolecidos” agem contra toda a energia vital e belicosa. Também percebemos esse tipo de comportamento nos cristãos.

            O ser virtuoso aristotélico,ou mesmo o ser da bondade cristã, não age senão de maneira discreta a disfarçar sua moral estúpida, uma vez que agir contra os próprios instintos e a própria natureza é renunciar à própria força. As virtudes diminuem o mal. E o mal é um fenômeno natural. É necessário esquecer a compaixão e exaltar o egoísmo, uma vez que a compaixão pela humanidade só pode se dar através do menosprezo para consigo mesmo, e isso não faz parte da natureza, nem dos instintos afirmativos.

            A vontade de poder age sobre os homens como uma força acumulada que precisa ser desprendida, mas que, para isso, precisa encontrar algum tipo de resistência para se efetivar. As paixões afirmativas buscam declarar-se contra as coisas, atacá-las com crueldade.

            Para Nietzsche, é necessário que se perceba a crueldade de maneira diferente. Ser rude para com outros homens, além de satisfazer o desejo de poder, também coloca os outros à prova, o que faz com que eles também possam demonstrar sua força.

            Podemos falar sobre o amor, ao tratarmos da crueldade. Amar e ser amado também consiste em crueldade, tanto para com o outro, quanto para consigo mesmo. Aquele que ama, é cruel consigo mesmo, e satisfaz o seu desejo de força através do masoquismo, internalizando a crueldade, no lugar de direcioná-la ao outro. O ser amado também pode exprimir a sua força exercendo a crueldade para com aquele que o ama.

Tanto num caso como no outro, há um duplo exercício de poder: o que se faz tiranizar, e o que tiraniza. A vontade de poder torna-se então a necessidade de um confronto tanto externo, como interno”.[6]

            Os homens fortes são cruéis, e encontram um meio de vingarem seu orgulho através da crueldade. No entanto, os fracos também podem ser cruéis, se solicitarem a piedade de outros. E nesta relação entre orgulho e crueldade é que se exprime a vontade de poder. Uma espécie de sadomasoquismo da alma, no eterno embate entre o prazer de ser cruel e a dor, que também oferece satisfação e sensação de poder internalizados. A dor e o prazer são interligados, “fenômenos concomitantes”.

A decisão do sujeito quanto ao que desperta prazer ou dor depende do grau de poder. Uma coisa que, para uma fraca quantidade de poder parece um perigo, que sugere uma rápida defesa, pode produzir – no caso de existir um maior poder, um encanto voluptuoso, um sentimento de prazer (…) e o prazer é: a sensação do aumento de poder”.[7]

            Por essa razão, os homens fortes desejam a guerra. Nada lhes causa mais prazer do que exercer sua força, e a guerra endurece a alma, é um forte estímulo para a imaginação que cria dor e prazer, e sentimentos de poder.

            A guerra exige constantemente tomadas de atitudes belicosas, e faz os homens procurarem instintivamente pesadas responsabilidades, criar inimigos, e arriscarem tornarem-se inimigos de si mesmos. Assim, exercitam sua força e a vontade de poder, que faz parte da natureza, ao contrário do agir da sociedade de paz, que nos faz agir segundo uma falsa moral, sobre uma “natureza trágica”.

A hipocrisia cautelosa da inaptidão para o poder apresenta-se:
- na forma de obediência – subordinação, cumprimento do dever, moralidade
- na forma de docilidade, de dedicação, de amor – idealização, divinização de quem comanda, compensação e transfiguração indireta de si próprio;
- na forma de fatalismo, de resignação, de objetividade;
- na forma de tirania exercida sobre si mesmo – ascetismo
- na forma de crítica, de pessimismo, de indignação;
- na forma de boa alma, de virtude.”[8]

Em todas estas situações está expressa a necessidade de exercer algum poder, ou pelo menos de ostentá-lo momentaneamente, a aparência de poder, e não o verdadeiro sentimento de poder.

É benéfico ao sentimento de poder essa comparação com tudo o que é inaptidão para o poder. A comparação com o “inferior” gera uma certa satisfação, um prazer de inferiorizar, o que enaltece ainda mais a própria força. A vontade de poder encontra satisfação na unicidade, no desejo de ser o mais forte dentre todos, único.

Comparar é agir. E agir é interpretar, necessariamente. Ao fazer uma interpretação, o homem impõe ao outro a sua vontade de poder. Mesmo o ato de falar já é uma imposição, quaisquer que sejam as palavras, pois a ação já constitui numa interpretação, numa perspectiva subjetiva. A perspectiva é uma conseqüência natural da vontade de poder.

No entanto, não existe uma vontade de poder de um único homem que prevaleça sobre todas as outras, e sobre isso, o homem é obrigado a viver em conformidade com a sua. Com a sua vontade exprimir sua vivacidade através da força, desenvolvendo e alimentando seu desejo de poder.

Portanto, a doutrina da vontade de poder é um constante vir- a ser.

Querer é, de imediato, querer um fim. E fim contém juízo de valor. Mas, de onde provém os juízos de valor? Será que têm por fundamento uma norma fixa: de agradável ou doloroso? Contudo, em inúmeros casos, somos nós quem tornamos uma coisa dolorosa ao introduzir nela um juízo de valor… É ampla a ação dos juízos morais de valor: eles participam de quase todas as impressões dos sentidos, que o mundo cobre de tinta. Fomos nós que introduzimos os fins e os valores, isso nos dá uma enorme força latente. Porém, se procedermos à comparação de valores, notamos que uma apreciação oposta à nossa é coisa corrente; então, porque sempre existiram numerosas tábuas de valores, nada tem valor em si”.[9]

            A doutrina do homem que escolhe as paixões afirmativas e se guia pelo desejo de poder está em constante reforma, e na percepção da própria natureza e necessidade de exprimir força, num constante vir-a-ser, numa constante vontade de poder. Em Nietzsche a autodeterminação individual é radicalizada, mas não mais conduzida pela idéia de aperfeiçoamento moral. Há uma autonomia inevitável em que cada sujeito luta pela sua afirmação. Como ninguém deu ao homem sua essência, cabe a ele fazer seu destino e ser responsável pelo seu vir-a-ser.

Fonte:
CONSCIÊNCIA.ORG
http://www.consciencia.org/sobre-a-vontade-de-poder-em-nietzsche
Sejam felizes todos os seres.
Vivam em paz todos os seres. 
Sejam abençoados todos os seres.

NIILISMO COMO CAMINHO PARA O SUPER-HOMEM EM FRIEDRICH NIETZSCHE


ADRIANO FELIX DA SILVA

NIILISMO COMO CAMINHO PARA O SUPER-HOMEM EM FRIEDRICH NIETZSCHE

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Filosofia e Teologia Imaculada Conceição como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Filosofia.
Orientador: Prof. Ms. Gabriel de Medeiros Lima

AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Severina (em memória) e Nivaldo Nazário, que me ofereceram uma família, suporte necessário para a progressão da vida. A minha mãe Ana Maria, que por sua carne gerou minha carne e me deu a possibilidade de sentir a vida.
Ao monsenhor Jaelson Alves, amigo sempre presente, que me orienta na formação humana e contribui freqüentemente para o meu crescimento intelectual.
A Priscilla Duarte, a quem devoto grande carinho e amizade, por sua significativa presença em minha vida e a seus pais, Edson e Valdira, que me recebem em sua casa.
A Dulcinete (Dulce) que me acolhe constantemente com carinho maternal e a todos de sua casa.
Ao Seminário São João Maria Vianney e ao Seminário Arquidiocesano da Paraíba Imaculada Conceição, nos quais fiz os estudos de filosofia até então.
Aos professores, que contribuíram para minha formação acadêmica. Ao professor Ms. Ricardo Leon, que me apresentou a filosofia de maneira apaixonante.
Aos paroquianos de Nossa Senhora Aparecida – Treze de maio e Bairro dos Estados – que, sempre disponíveis, me ajudaram nesse período formativo.
Ao cônego Geraldo Magela, pelo zelo pastoral a mim dispensado.

RESUMO

Tudo não tem sentido. Este é o aspecto fundamental para a compreensão do niilismo. Do latim nihil (nada), enquanto termo, o niilismo surge na literatura russa do século XIX para designar uma espécie particular de homem: o negador de valores, o que nada respeita. Porém, com Nietzsche, a questão alarga-se, ganhando as mais variadas formas revelando sua expressão e força, sendo considerado um problema e uma marca do mundo contemporâneo. Nesse escopo, o niilismo configura-se como o responsável pela fragilidade dos princípios racionais que definem o mundo, sob a pretensão de explicitar que as bases dos valores socioculturais mostraram-se ser nada. Em Nietzsche o niilismo ganha a mais alta expressão filosófica sob seus estados psicológicos reconhecidos pelo filósofo como condição existencial. Portanto, na visão de Nietzsche o homem é existencialmente niilista. Sua posição frente ao niilismo se apresenta ainda sob o aspecto da multiplicidade de força da Vontade de Poder em vias passiva e ativa, sendo esta última privilegiada por Nietzsche por assumir-se enquanto força destrutiva dos valores. 

É o momento histórico em que o homem reconhece explicitamente a ausência de fundamento quer moral quer existencial. Nessa ótica, Heidegger coloca a questão do nada como a redução do ser a valor; isto permite encontrar o elo com a sentença da “morte de Deus” profetizada por Nietzsche. Portanto, a sentença nietzschiana remete à compreensão do que se configura o cerne do movimento niilístico-histórico apregoado na ruína dos valores supremos (Deus). Tal expressão denota a derrocada de mais de dois mil anos de mentira a que se subjugara o ocidente. Ora, com a desvaloração dos valores supremos (Deus) os homens vêem-se carecidos de finalidade para sua existência; e, por conseguinte a vida torna-se sem sentido. Contudo, no “Zaratustra”, Nietzsche esboça sua “ateologia” de modo alegórico ensinando o surgimento do super-homem. Para tanto, Zaratustra proclama não apenas a “morte de Deus”, mas o advento da aurora dos filósofos, ou seja, o domínio do super-homem como o sentido da terra. Nietzsche procura estabelecer o super-homem como o futuro do homem, pois, passaria, volitivamente, a ser tido como tal por estar na posição determinante da Vontade de Poder. 

Zaratustra ama àqueles que não procuram além das estrelas uma razão para sucumbir e serem sacrificados; mas que sucumbem à terra para que ela seja um dia do super-homem. Agora, todos os deuses morreram; que viva o super-homem!
PALAVRAS-CHAVE: niilismo. morte de Deus. super-homem.

SUMÁRIO

Introdução……………………………………………………………………………..

1.
a abordagem nietzschiana sobre o niilismo…………………….

1.1.
O surgimento do niilismo como pressuposto filosófico…………………

1.2.
Os estados psicológicos do niilismo nietzschiano…………………………

1.3.
A multiplicidade de forças da Vontade de Poder……………………………

2.
DO NIILISMO À MORTE DE DEUS………………………………………………….

2.1.
Niilismo entre Nietzsche e Heidegger…………………………………………….

2.2.
A sentença nietzschiana: Deus está morto…………………………………….

3.
NIETZSCHE, PROFETA NIILISTA: DA CONSTRUÇÃO DO ZARATUSTRA AO SURGIMENTO DO SUPER-HOMEM……………………

3.1.
Zaratustra: profeta do ateísmo………………………………………………………

3.2.
Nietzsche e o surgimento do super-homem…………………………………..


CONCLUSÕES………………………………………………………………………………


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………………………………

 

INTRODUÇÃO

A presente temática deste trabalho busca o esclarecimento da reflexão instaurada pelo movimento niilista e a sua pretensão em proporcionar o surgimento de um novo homem segundo seu anúncio filosófico. Assim sendo, neste trabalho, o leitor irá encontrar uma exposição da temática do niilismo em direção ao surgimento do super-homem – construção teórica de Nietzsche[1] (1844-1900).

Segundo as teses aqui expostas, tentaremos ao menos apontar caminhos que possibilitem a compreensão do pensamento nietzschiano acerca dos valores, sob o crivo do niilismo. Para tanto, dada a atualidade das reflexões advindas do pensamento filosófico contemporâneo, desenvolvemos esta pesquisa buscando compreender o niilismo como caminho para o super-homem nietzschiano, e a sua contribuição para a avaliação de todos os valores. 

Procuramos, dessa forma, introduzir o leitor numa reflexão sobre a derrocada dos valores tradicionais, tão comumente exposta pela filosofia, seja ela contemporânea ou não, tal como expressa na visão de Nietzsche. Este foi se constituindo como um árduo crítico da cultura de todos os tempos. Suas obras se caracterizam pela crítica ao cristianismo; como também a todo idealismo filosófico-sociológico. Assim, todo pensamento até então impedia, segundo ele, a formação do super-homem como aquele que está para além do bem e do mal. Nesse escopo, o niilismo configura-se como responsável pela fragilidade dos princípios racionais que definiam o mundo até então.

Muitos filósofos abordaram a temática do niilismo, tendo cada qual sua maneira própria de compreender tal fenômeno. Veremos que esse niilismo filosófico mostra-se intrínseco, sobretudo, ao pensamento contemporâneo.
O tema será exposto em três blocos temáticos complementares, de sorte que cada um apresenta os aspectos do niilismo como caminho para o surgimento do super-homem, sem perder a noção de conjunto. Para tanto, lançaremos mão, principalmente, das obras de Nietzsche, a saber: Vontade de Potência e Assim falou Zaratustra; como também o aforismo 125 de A gaia ciência, textos basilares para a compreensão de nossa temática. Assim sendo, tomaremos, além de outros comentadores, a leitura de Heidegger (1889-1976) sobre os textos nietzschianos para nos auxiliar no desenvolvimento deste nosso trabalho.

No primeiro capítulo, intitulado A Abordagem Nietzschiana Sobre o Niilismo, veremos como a compreensão deste tema surgirá enquanto pressuposto filosófico. Embora, num primeiro momento, o niilismo fora compreendido como movimento crítico da sociedade, que via o homem como alguém que nada respeita, segundo foi demonstrado pela primeira vez no âmbito da literatura russa[2]. Por conseguinte, mesmo não sendo Nietzsche o criador do termo niilismo, com ele, o referido termo, ganha a mais alta expressão filosófica. Assim, seguindo o tema do capítulo supra citado, veremos que, num segundo momento, o filósofo apontará três formas de niilismo como estado psicológico. Com isso, não quer Nietzsche fugir da reflexão humana como condição existencial e constitui como alvo de sua crítica o próprio ser humano. Decerto, podemos considerar que na visão de Nietzsche o ser humano é existencialmente niilista. 

Assim sendo, as três formas de niilismo podem ser resumidas deste modo:
a) Niilismo como a desilusão de uma pretensa finalidade do vir-a-ser;
b) Niilismo como a representação global de uma suprema forma de dominação; c) Niilismo como a descrença em um mundo metafísico.

Dando continuidade à nossa reflexão inicial, observaremos, num terceiro momento, a idiossincrasia de Nietzsche no que diz respeito ao niilismo sob o aspecto da multiplicidade de forças da Vontade de Poder presente neste conceito. Sendo, pois, o ser humano existencialmente niilista, o filósofo encontra duas vias para a apreensão desse fenômeno, a saber: niilismo passivo e niilismo ativo. Com a vontade de poder podemos aferir que no momento histórico em que o homem reconhece explicitamente a ausência de fundamento, quer moral quer existencial, o niilismo comportará uma fecundidade na radicalidade de sua negação que “libera forças ainda desconhecidas” (LEFRANC, 2005, p. 2005).

No segundo capítulo, Do Niilismo à Morte de Deus, dois aspectos serão abordados: num primeiro momento, faremos a relação do sentido do niilismo entre Heidegger e Nietzsche. Para aquele, é o Ser que se reduz a valor; para este, se dá na morte de Deus. Apesar de tudo, poderemos ver a relação entre esses dois filósofos contemporâneos que ponderaram sobre o niilismo e conferir o que une tais reflexões. Com este propósito, exporemos neste trabalho a tese defendida por Gianni Vattimo que estabelece uma zona livre do valor de troca e que possibilitará o elo entre os filósofos. “Se seguirmos o fio condutor do nexo niilismo-valores, diremos que, na acepção, nietzschiana-heideggerriana, o niilismo é a consumação do valor de uso no valor de troca” (VATTIMO, 2002, p. 6). 

Após este ponto, seguiremos o itinerário propriamente nietzschiano. Não obstante, não devemos esquecer que Nietzsche elaborou uma teoria para o niilismo na sentença “Deus está morto”, na qual faremos um estudo sobre o que poderá ser colocado – um dia – como o cerne do niilismo. Deste modo, tal expressão nos remeterá à possibilidade de compreensão do movimento niilístico-histórico apregoado por Nietzsche, sob o aspecto da ruína dos valores supremos (Deus). Ou seja, o niilismo provocará a inversão de todos os valores de nossa sociedade.

Num terceiro capítulo, denominado Nietzsche, Profeta Niilista: da Construção do Zaratustra ao Surgimento do Super-Homem, o leitor deparar-se-á com a maneira própria que Nietzsche encontrou para anunciar a sua mensagem sob a figura emblemática de Zaratustra, profeta do ateísmo nietzschiano. Por conseguinte, traremos a compreensão dada pelo filósofo sobre o surgimento de seu super-homem, reconhecendo nele o anseio de instauração de um homem (novo) cuja Vontade de Poder seja manifesta em favor da vida efetiva.
Portanto, queremos dizer que o presente trabalho não tem a pretensão de ser a palavra última no assunto, mas, tão somente, dar sua contribuição à reflexão acerca dos valores contemporâneos, no que se refere ao crivo da filosofia nietzschiana.

1. a abordagem nietzschiana sobre o niilismo

1. 1. O surgimento do niilismo como pressuposto filosófico

Ao iniciarmos uma reflexão acerca da compreensão do niilismo no contexto filosófico, não nos propomos apenas a esquadrinhar aqui um conceito abstrato, mas um fenômeno que se oriunda da própria realização da história ocidental. Assim, pretendemos especificar um dos elementos de maior enfoque, e que instaura o panorama da filosofia contemporânea da desvaloração dos valores.
“O niilismo existe em ato, não se pode fazer um balanço dele, mas pode-se e deve-se procurar compreender em que ponto se encontra, em que nos concerne, a que opções e atitudes nos convoca” (VATTIMO, 2002, p. 3). Desse modo, ao estudá-lo, veremos que se trata de um fenômeno que se constrói em torno da existência humana. Assim, o niilismo obteve repercussões de enormes proporções na história do pensamento, quer literário quer filosófico do século XIX, sob a característica da negação dos costumes ocidentais.

Quase não resta dúvida que se debruçar sobre a temática do niilismo é como se encontrar diante do “abismo do nada”. Portanto, de uma maneira simples, mas não menos esforçada, tentaremos aqui ao menos apontar caminhos que nos levem à mínima compreensão do niilismo. Como ponto inicial da nossa pesquisa, observemos o que diz o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira sobre o verbete niilismo:

Niilismo. [Do fr. niilisme.] S.m. 1. Redução a nada; aniquilamento. 2. Descrença absoluta. 3. Filos. Doutrina segundo a qual nada existe de absoluto. 4. Ét. Doutrina segundo a qual não há verdade moral nem hierarquia de valores. 5. Polít. Doutrina segundo a qual só será possível o progresso da sociedade após a destruição do que socialmente existe (FERREIRA, 1986, p. 1193).

De acordo com essa análise, o niilismo estaria de certa forma, associado à negação ou à desconfiança do existir ontológico e de sistemas éticos e políticos. Podemos dizer que niilismo está implicado à uma crítica aos valores e fundamentos de uma determinada tradição. O niilismo do latim nihil (nada) é uma corrente filosófica que, em princípio, concebe a existência humana desprovida de sentido. Este é o aspecto indispensável para a compreensão de niilismo! 

Sendo o conceito bastante conhecido no âmbito filosófico, enquanto termo o niilismo surge no romance russo, mais especificamente na obra Pais e Filhos de Ivan Turguéniev (1862), porém, já sendo utilizado em jornais a partir do ano de 1829. No início, ele nasce como um fenômeno patológico numa situação cultural e política marcada pela recusa revolucionária da tradição social russa e da tradição cristã em particular. Dissociando-se e opondo-se à cultura dos “pais”, e dessa forma não se vendo mais como “filho” de alguém. Porém, é em Dostoiévski (1821-1881) que o termo niilismo ganha expressão e força, sendo considerado como um problema e uma marca do mundo moderno.
Na filosofia também temos alguns pensadores que apresentaram em seus pensamentos as características niilistas, tais como: Max Stirner (1806-1856) e Arthur Schopenhauer (1788-1860). 

O niilismo de Stirner pode ser caracterizado pelo seu individualismo radical. Em sua obra: O único é a sua propriedade (1844), ele coloca as causas do ateísmo até às últimas conseqüências, ou seja, negar a Deus e a humanidade em favor do único valor real, isto é, o indivíduo. Stirner, filósofo do individualismo, nos apresenta o seu pensamento ao dizer que o homem vale por sua singularidade e por isso não depende de ninguém: “Eu depositei a minha causa no nada” (STIRNER citado por REALE & ANTISERI, 1990, p. 167). 

O outro filósofo que apresentou em seu pensamento as características do “abismo do nada” foi Schopenhauer. Neste, encontramos como característica niilista o pessimismo do mundo e a renúncia da vida, e é neste modo de ver o mundo que a filosofia schopenhaueriana é chamada de niilista, sendo este niilismo resultado do pessimismo, segundo sua visão de mundo. Para ele, o homem estaria por viver abandonado a si mesmo e lutar pela existência numa certeza de que no final será derrotado.

Sem dúvida Schopenhauer teve a coragem de romper com a crença, comum às filosofias e às religiões ocidentais, de que o homem foi feito para ser feliz. Portanto ele é precisamente o primeiro filósofo no Ocidente que colocou de fato a questão do sentido da vida humana (LEFRANC, 2005, p. 112).
 
No entanto, alguns autores relacionam o niilismo com Nietzsche e, sem dúvida, essa relação procede de fato. O próprio filósofo em sua obra póstuma Vontade de Potência, projeto anunciado em 1887, mas editado pela primeira vez em 1901, ano seguinte à sua morte, destaca o aspecto relevante do niilismo frente à condição psicológica do ser humano.

Nietzsche é um dos raros filósofos cujo nome evoca não apenas conjecturas filosóficas, mas um estilo de vida que permeou o existencialismo, surgido depois de 1945. O pensamento nietzschiano não se limita a discussões acadêmicas. Jamais existiu uma escola nietzschiana propriamente dita Porém, seus escritos, coalhados de polêmica, há mais de um século têm sido uma referência entre poetas, literatos, artistas, políticos e filósofos. Seu pensamento é, na maioria das vezes, determinado pelo próprio estilo das obras, e pela anedota biográfica das doenças e loucura. Portanto, confira como o próprio Nietzsche fala sobre o estilo de seus escritos:
São aforismos. São aforismos? – Só cabe aos que me reprovam refletir um pouco e depois pedir desculpas a si mesmos – Não preciso de nenhuma palavra para a minha defesa (NIETZSCHE citado por LEFRANC, 2005, p. 12).

No século XX, após o legado de Nietzsche, muitos filósofos, a exemplo de Martin Heidegger, procuraram respostas à pergunta sobre o ser humano como existência, e buscaram meios para enfrentar o desafio de encontrar um lugar para essa reflexão no mundo contemporâneo. Crítico da modernidade, Heidegger se opôs ao pensamento proveniente desse período marcado pelo saber técnico no qual não abria espaço para a reflexão sobre o ser. Em uma de suas conferências intitulada de A questão da técnica ele questiona o posicionamento concernente ao ser humano frente ao cientificismo[3], que vê o homem como coisa desprovida de sentido.

O homem está tão decididamente empenhado na busca do que a com-posição pro-voca e ex-plora que já não a toma, como um apelo, e nem se sente atingido pela ex-ploração. 

Com isto, não escuta nada que faça sua essência ex-sistir no espaço de um apelo e por isso nunca pode encontrar-se, apenas, consigo mesmo (HEIDEGGER, 2002, p. 30).

Segundo Heidegger, o saber técnico como modo de abordar as coisas acaba por tomar também o homem como coisa, ou seja, imanência desprovida de sentido. A técnica torna o homem disponível para um sentido posto por outros, não por ele próprio. A crítica de Heidegger aponta para a manipulação do homem em vista de interesses que nada têm a ver com a liberdade humana, e que tornam sua existência vazia de sentido, um nada.

No entanto, o niilismo por Nietzsche fora tido como um acontecimento a marcar toda sua época. Assim, mesmo não sendo Nietzsche o criador do termo niilismo, é nele que esta expressão ganha um significado mais influente na filosofia e no mundo contemporâneo. Em Nietzsche, o niilismo é como um cristal de várias facetas que designam tanto acontecimentos de nossa civilização quanto um certo modo de experimentar a existência humana. O niilismo é um episódio de nossa civilização por designar o momento histórico em que se desvalorizam os valores supremos, dando ênfase à vida em seu sentido fisiológico, como é a característica nietzschiana. Com Nietzsche, o niilismo torna-se um acontecimento histórico-filosófico, sobretudo a partir do abandono da tradição que visava atingir a validade universal de Deus: categoria que representa os valores supremos.

O niilismo é histórico, ou seja, um fenômeno que se pode explicar. Um de seus aspectos é a morte de Deus. O lugar de Deus foi ocupado pelo nada. De outro lado, o advento do niilismo é necessário porque todos os valores serão desvalorizados (ZILLES, 2004, p. 174). 

A trajetória histórica do niilismo, como fenômeno e como conceito, é marcada por uma ambigüidade estrutural: ele se apresentou cronologicamente, e se apresenta contemporaneamente, como crise e como solução; como revolução e como nova ordem.

1. 2. Os estados psicológicos do niilismo nietzschiano

Niilismo não é aqui apenas uma vivência de fatos que se realizam na história, mas uma articulação com o modo de existência humana. “O niilismo está à porta: de onde vem esse mais sinistro de todos os hóspedes?” (NIETZSCHE, 1983, p. 380). Esse sinistro hóspede traz consigo também um modo de ver o social e a história como manifestações de sua morada no interior do homem.
Para se chegar ao âmago da questão do niilismo nietzschiano faz-se necessário compreendermos por que Nietzsche utiliza-se da psicologia para apresentar a manifestação do niilismo. Ele diz que o conceito em questão se dá em estados psicológicos. Em sua obra póstuma Vontade de Potência, Nietzsche faz uma alusão ao niilismo enquanto tal estado psicológico para designar a psique (alma) numa dimensão da vida como um todo, segundo o sentido do termo grego.

O niilismo como estado psicológico terá de ocorrer, primeiramente, quando tivermos procurado em todo acontecer por um “sentido” que não está nele: de modo que afinal aquele que procura perde o ânimo. Niilismo é então o tomar consciência do longo desperdício de força, o tormento do “em vão”, a insegurança, a falta de ocasião para se recrear de algum modo, de ainda repousar sobre, algo – a vergonha de si mesmo como quem se tivesse enganado por demasiado tempo… (NIETZSCHE, 1983, p. 380) 

Ora, com a ausência de sentido no devir das coisas, o homem se depara com a desvaloração do que ele tomava por credível e assim, fica “des-animado”. O niilismo acontece aqui devido à tomada de consciência de que tudo foi “em vão”. Desse modo, fica confesso ao niilista a vergonha de ter sido enganado pelo que lhe parecia ordenado, ou seja, o que se lhe aparecia enquanto estabelecido. Deste modo, isto estaria em uma completa harmonia falseada. Nessa falsa ordenação das coisas que são apresentadas na imanência, o niilista busca primeiramente na fase psicológica um alvo, que é ainda um sentido para a sua vida. A chance que o niilista possui é senão almejar o nada.
 
“E agora se concebe que com o vir-a-ser nada é alvejado,
nada é alcançado…”
(NIETZSCHE, 1983, p. 380). 

Essa desilusão faz com que o indivíduo não seja mais o centro do vir-a-ser das coisas. Para Nietzsche isso significa que niilismo é a situação em que o homem reconhece explicitamente a ausência de fundamento.

O niilismo como estado psicológico ocorre, em segundo lugar, quando se tiver colocado uma totalidade, uma sistematização, ou mesmo uma organização, em todo acontecer e debaixo de todo acontecer: de modo que na representação global de uma suprema forma de dominação e governo a alma sedenta de admiração e veneração se regala [...] (NIETZSCHE, 1983, p. 380).
Esse segundo estado psicológico de niilismo compreende o momento em que o homem percebe que no acontecer das coisas não vige nenhuma grande unidade, ou seja, algo singular que possa assumir um valor acima de qualquer outro valor. Para Nietzsche, essa tentativa de uma criação de um valor para a grande unidade reside no conceito de humanidade, visto que este estaria como elo de organização e dando um sentido para toda a vida. Porém, segundo Nietzsche, não existe essa tal unidade porque para ele o que existe de fato são os homens, ou seja, a pluralidade de cada indivíduo resulta na impossibilidade de se contrair uma idéia totalizante, que represente globalmente o desejo de uma forma representativa de todo acontecer. 

Portanto, essa humanidade é falsa e nela não vige nenhuma unidade que conduza os homens na busca de um sentido.
A partir daí o niilista é confrontado com uma experiência de mundo que se apresenta absolutamente desprovido de qualquer sentido posterior seja no acontecer, seja numa totalidade ou unidade em todo acontecer Essa perda de sentido, no que é real, se dá devido ao abandono do homem frente a um valor universal, mas não há um valor universal. “[...] ele concebeu um tal todo, para poder acreditar em seu valor” (NIETZSCHE, 1983, p. 381). 

Ao conceber um valor infimamente superior a ele,
o niilista,
nesse segundo estado psicológico 
perde a crença em seu próprio valor, 
ou seja, 
ele mesmo não reconhece a partir de si o seu valor 
e fica dependente de um valor superior
por ele mesmo criado para que, 
dessa forma, acredite em seu valor. 

(  sua própria DESVALORIZAÇÃO)
{eu,radeir}

Essa experiência que o niilista enfrenta do “em vão” por ter sido enganado pelo que lhe parecia ordenado e por perceber que não há uma totalidade universal em todo acontecer, fica ainda mais desprovido de sentido com o aparecimento da terceira e derradeira fase do niilismo. 

Vide:
O niilismo como estado psicológico tem ainda uma terceira e última forma. Dadas essas duas compreensões, de que com o vir-a-ser nada deve ser alvejado e de que todo o vir-a-ser não reina nenhuma grande unidade em que o indivíduo pode submergir totalmente como em um elemento de supremo valor: 

resta como escapatória 
condenar esse inteiro mundo do vir-a-ser como ilusão
e inventar um mundo 
que esteja para além dele, como verdadeiro mundo. 

Tão logo, porém, o homem descobre como somente por necessidades psicológicas esse mundo foi montado e como não tem absolutamente nenhum direito a ele, surge a última forma do niilismo, que encerra em si a descrença em um mundo metafísico, que se proíbe a crença em um mundo verdadeiro. Desse ponto de vista admiti-se, a realidade do vir-a-ser como única realidade, proíbe-se a si toda espécie de via dissimulada que leve a ultramundos e falsas divindades - mas não se suporta esse mundo, que já não se pode negar… (NIETZSCHE, 1983, p. 381).

A última linha de fuga frente ao devir é a elaboração de um mundo metafísico, pois o vir-a-ser não possui nenhuma meta derradeira para a qual tenda naturalmente, e nem repousa tampouco sobre uma unidade substancial. Apesar de não possuir tal meta ou unidade, como vimos nos estados anteriores, a realidade do devir não é assumida como realidade única. Todavia, sem um sentido para o real a saída é criar um mundo ontologicamente distinto do mundo do devir, isto é, resta como escapatória a condenação de todo este mundo e inventar um lugar em que se possa refugiar. Inventa-se um mundo que se encontra para além deste.

Nietzsche refere-se, a partir dessa terceira condição psicológica, à afirmação de um “mundo verdadeiro” do qual este em que vivemos é, senão, aparente, inverídico e ilusório. A tal concepção de mundo o homem, nesta etapa do niilismo, coloca-o num além, pois está em busca de uma “verdade” que não pode encontrar aqui no acontecer das coisas e a invenção deste mundo falso seria, então, escape. Esse viés termina na condenação de todo o mundo do devir para super valorar o mundo metafísico. Porém, este mundo não lhe pertence e por isso, não tem direito a ele. 

O que resta, (de fato) portanto, ao niilista é voltar-se para a única realidade que ele conhece (ainda), ou seja,( o falso) o devir.

Com essa negação ele se vê, portanto, obrigado a voltar-se para a sua realidade contingente do vir-a-ser. No entanto, através da busca de algum sentido, o homem que havia negado qualquer finalidade e unidade no vir-a-ser, e nem tampouco encontrando verdade, percebe que tudo foi “em vão”, isto é, tudo não tem sentido. Consoante essa percepção de mundo o que acontece é o sentimento da ausência de valor. Dessa forma, não se encontra fundamento algum que possa interpretar a existência humana, ou seja, não há nada que possa reger o curso da vida, apenas o nada.

“Em suma: as categorias ‘fim’, ‘unidade’, ‘ser’, com as quais tínhamos imposto ao mundo um valor, foram outra vez retiradas por nós – e agora o mundo parece sem valor…” (NIETZSCHE, 1983, p. 381).

Não obstante, o aspecto da perda de sentido causa no homem um sentimento trágico de melancolia perante essa ausência de sentido. Então, como compreender a existência humana se nada mais faz sentido? Para tanto Nietzsche estabelece em seu pensamento que o niilismo se apresenta, após a tomada de consciência dos estados psicológicos sob uma multiplicidade de forças presente no ser humano pela Vontade de Poder.

1. 3. A multiplicidade de forças da Vontade de Poder

Um conceito bastante significativo ao pensamento de Nietzsche para a construção de nossa compreensão sobre o niilismo é a Vontade de Poder. Tal conceito afirma-se como uma vontade de natureza fisiológica presente não só no homem, mas em todo ser vivo. Essa vontade de poder concerne ao efetivar-se das forças passivas e ativas, ou seja, a quantidade de força de vontade que o homem coloca em relação à vida. Nietzsche chega a afirmar que “o mundo visto por dentro, definido e designado pelo seu ‘caráter inteligível’ seria, precisamente, ‘vontade de poder’ e nada mais” (NIETZSCHE, 2005, p. 56), pois tanto ao homem quanto às coisas presentes no mundo, se aplica por esse conceito, a visão niilista de mundo compreendida por Nietzsche. “Concebida como vontade de potência, a vida constitui o único critério de avaliação que se impõe por si mesmo” (MARTON, 2006, p. 54).

Cabe, portanto, à idiossincrasia nietzschiana a elaboração de uma multiplicidade de forças frente ao niilismo; porquanto ele encontra duas vias para a compreensão desse fenômeno. Assim, devido à multiplicidade de forças da Vontade de Poder, o niilismo se apresentaria como uma força quer ativa, quer passiva. Portanto, para Nietzsche as venerações religiosas são as venerações são a expressão do niilismo passivo; já os homens ativos exercem sua vontade no mundo. Assim, no sentido do niilismo passivo, segue-se também uma depreciação da vida neste mundo, enquanto se volta para uma ficção de um outro mundo. À idéia de um outro mundo, de um mundo supra-sensível, em que se imaginam suas mais perfeitas formas (Deus, o bem, o verdadeiro), opõem-se os valores superiores à vida efetiva, tendo por princípio uma vontade de negar, de depreciar. 

A vida inteira assume um valor de nada à medida que os valores superiores se relacionam com a vontade de negar, de aniquilar a vida. Nietzsche vê nesse efeito de negar a vida um perigo para a humanidade, relacionando todo valor depreciativo do mundo a uma doença ao dizer:
Precisamente nisso enxerguei o grande perigo para a humanidade, sua mais sublime sedução e tentação – a que? Ao nada? – ; precisamente nisso enxerguei o começo do fim, o ponto morto, o cansaço que olha para trás, a vontade que se volta contra a vida, a última doença anunciando-se terna e melancólica [...] (NIETZSCHE, 2005, p. 12).

A causa de toda esfera melancólica que rodeia o homem passivo em sua vontade é aquela realidade que vem depois e que está tão longe de poder chegar, ou seja, são os valores superiores que dão à vida esse valor de nada, causando essa melancolia. É a vontade de nada que se exprime nesses valores superiores e tornam sem sentido toda aspiração supra-sensível como também a vida, que é negada por esta última, pois “a crença nas categorias da razão [de um mundo ideal] é a causa do niilismo, - medimos o valor do mundo por categorias, que se referem a um mundo puramente fictício” (NIETZSCHE, 1983, p. 380).

O espírito de negação da vida, que é o niilismo passivo, desenvolve-se aquém a uma depreciação do homem. Por isso, este mesmo homem está marcado sob o diagnóstico de uma doença que aflige todo homem através de um sentimento que atua de modo a provocar o desinteresse pela própria vida.
A esta vontade de nada, provocada por uma idéia fictícia, estabelece-se o processo de identificação do homem com a vida sensível, isto é, torna-o também como parte da vida, pois este homem não pertence ao mundo que ele mesmo cria e, desse modo, o próprio homem, torna-se passível de ser negado junto ao mundo sensível que não tem sentido. A visão do homem dá-se por depreciada pelo mundo supra-sensível, no qual se nega toda a força da vontade de poder, deixando-a fraca, lasciva. Nietzsche lança mão da cultura européia para explicar essa vontade de negar a vida, já que esta é fortemente ligada ao niilismo passivo devido ao caráter religioso (cristão) que comumente nega a vida neste plano natural.

E precisamente nisso está o destino final da Europa – junto com o temor do homem, perdemos também o amor a ele, a reverência por ele, a esperança em torno dele, e mesmo vontade de que exista ele. A visão o homem agora cansa – o que é hoje o niilismo, se não isto?… Estamos cansados do homem… (NIETZSCHE, 2005, p. 35).

Nietzsche parte do chão da história do homem europeu, que está mergulhado nessa doença depreciativa da vida humana, para estabelecer a relação que este homem, tem com o melancólico sentimento causado pelo desejo de um mundo fictício e sem sentido. Ao tomar a Europa para a sua interpretação da “praga” que a aspiração ao nada causa, Nietzsche questiona-se junto à mesma se esta não estaria trilhando “o seu caminho sinuoso em direção a um novo budismo? a um budismo europeu? a um – niilismo?…” (NIETZSCHE, 2005, pp. 11-12), pois esse mesmo povo habitualmente põe sua vontade de nada como valor supremo e, tudo aquilo que não encerre suas mais perfeitas formas deve ser negado, inclusive o homem; sim, ele mesmo, que almeja o nada para a partir disto tornar sua vida sem sentido na esperança de um mundo melhor que este. No entanto, não há outro mundo se não este, onde há apenas vontade de potência e nada além disto.

Logo, o homem terá que viver num mundo onde ele próprio não encontra sentido, pois “[...] a negatividade do niilismo não introduz nenhuma progressão dialética, mas um empobrecimento, uma falta, um grau mínimo de poder, um declínio das formas de vontade de poder” (LEFRANC, 2005, p. 192).
A idiossincrasia de Nietzsche ao niilismo apresenta, como vimos, uma outra categoria, ou seja, a de niilismo ativo. Apesar disso, não quer Nietzsche, ao entender o niilismo através dessas duas categorias, estabelecer graus de hierarquia entre as duas vontades, mas apenas falar de uma multiplicidade de forças enquanto Vontade de Poder, isto é, o que Nietzsche quer dizer é que toda “vontade” é, no fundo, vontade de poder e que não determina uma entre outras vontades, mas a única vontade que é intrínseca ao querer do indivíduo. “Um quantum de força equivale a um mesmo quantum de impulso, de vontade [...]” (NIETZSCHE, 2005, p. 36). 

O niilismo se caracterizará 
de acordo com a força de vontade
como passivo ou ativo.

Essa expressão “niilismo ativo” está fortemente unida à posição que Nietzsche assume perante a vida. É no niilismo ativo que Nietzsche se encontra como primeiro niilista a tomar uma atitude que valore a vida efetiva e negue a vida falsa que o homem criou em mais de dois mil anos de história ocidental. Propondo assim, que o homem redirecione sua força para a destruição da moral do ocidente. Pois para Nietzsche a moral (cristã) ocidental faz com que o homem minta a si próprio, falsifique-se, enquanto vive a vida fixado numa mentira, que é o mundo supra-sensível.

A destruição de toda realidade supra-sensível, isto é, da vontade de nada que está fixada numa ilusão criada pelo homem passivo, provoca um desespero diante do vazio que é esse nada, ou seja, esse mundo que está à além-mundo não tem sentido. O niilista ao destruir os valores metafísicos quer negar a função que este mundo falso exerce sobre o homem. O desejo de retirar esse modelador da vontade humana a partir de si, isto é, das suas “realidades prefeitas” é expresso por Nietzsche em sua obra Assim falava Zaratustra (1885) ao dizer: “Levai-nos tal deus! Vale mais não ter nenhum, vale cada qual criar os seus destinos ao seu capricho, vale mais ser doido, vale mais ser deus uma pessoa mesma!” (NIETZSCHE, 2002, p. 198).

Esse caminho que o niilista segue, ou seja, o de negar a Deus, retira aquele que representa todos os valores supremos e assim, seu lugar fica vazio. Dessa forma, o homem ativo frente essa ausência de Deus, coloca-se em seu lugar para afirmar sua vontade ativa (ou nada de vontade) em negação à vontade de nada, que possui o niilismo passivo, isto é, o fraco. Deleuze, no que diz respeito a retirada do modelador de valores que negam o homem, diz que é “melhor não haver absolutamente valores do que haver valores superiores, melhor não haver nenhuma vontade, melhor um nada de vontade do que uma vontade de nada” (DELEUZE, 1976, p. 126). 

Essa afirmação de Deleuze estabelece o “jogo” de forças da Vontade de Poder, ou seja, da quantidade de força que o homem exerce frente à sua vontade. É a maneira de afirmar ou depreciar a vida, na única Vontade de Potência do niilismo, ao qual todos os homens pertencem. O lugar que o homem ocupa é o de Deus, porém, não o lugar da ficção celeste, mas o lugar que lhe é próprio, isto é, o mundo sensível. Agora, o homem ativo, é deus mesmo. O triunfo do homem sobre Deus está na vida que se põe no lugar dele;
[...] essa vida que se põe no lugar de Deus, que se volta contra o princípio de seu próprio triunfo e não reconhece mais valores a não ser os seus próprios; enfim, essa vida extenuada que preferirá não querer, extinguir-se passivamente, a ser animada por uma vontade que a ultrapasse. É ainda sempre a mesma vida: vida depreciada [...] (DELEUZE, 1976, p. 126).

A vida passiva que ora triunfava nos templos de Deus, que se beneficiava com a depreciação da vida efetiva ganha um quantum de força com o niilismo ativo.
Para Nietzsche, isso significa que niilismo é a situação em que o homem reconhece explicitamente a ausência de fundamento como constitutiva da sua condição (aquilo que, em outras palavras Nietzsche chama de morte de Deus) (VATTIMO, 2002, p. 115).

No entanto, após essa destruição, isto é, desse reconhecimento da ausência de Deus, tudo cai no vazio: a vida é desprovida de qualquer sentido, reina o absurdo e o niilista não pode ver outra alternativa senão esperar pela morte ou provocá-la. Porém, esse final não é o fim último do niilismo: no momento em que o homem nega os valores de Deus, possibilita que este aprenda a se ver como criador de valores e no momento em que entende que não há nada de eterno após a vida.

O desespero diante do absurdo do mundo e da vida poderia levar ao suicídio, mas o niilismo também comporta uma confiança na fecundidade de uma negação que, por radical que seja libera forças ainda desconhecidas (LEFRANC, 2005, p. 188).

2. DO NIILISMO À MORTE DE DEUS

2. 1. Niilismo entre Nietzsche e Heidegger

Dissertar sobre a compreensão do niilismo entre Nietzsche e Heidegger, constitui uma abordagem filosófica deveras sugestiva, visto que ambos desenvolveram apologias acerca deste conceito em suas filosofias. Portanto, o binômio Nietzsche-Heidegger evoca não só uma altercação filosófica, mas, suporta, sobretudo, um dinamismo na acentuação niilista da filosofia contemporânea.

Para compreender o processo do niilismo exposto por estes filósofos, traçaremos aqui uma adequada reflexão acerca do que ponderam – cada qual a seu modo – estes pensadores sobre o conceito em foco.
Inicialmente vale atentar sobre a compreensão de Heidegger no que diz respeito ao nada. Considerando sua perspectiva, veremos que a definição de niilismo heideggeriana é intrínseca à questão principal de sua filosofia, a saber: a reflexão sobre o sentido do ser. Assim, é através da publicação de Ser e Tempo (1927), que ele define e apresenta o seu próprio pensamento; e, também, onde Heidegger utiliza como ponto de partida essa problemática fundamental.
No entanto, Heidegger tratará daquilo que é a garantia do ser do ente, ou seja, o seu sentido. O ser visto enquanto nada, desvela a “nadidade” posta como sentido do ser.

O que se fizera com o nada – dentro da história da metafísica tradicional – fora colocá-lo em segundo plano, pois, toda reflexão estava voltada para o ente – e nada mais. Desse modo, por que, então, haveríamos de nos ater com esse nada? Frente a essa indagação o que responderia o filósofo de Ser e Tempo? Eis o que ele pondera: “O perguntar pelo nada – pela sua ausência e seu modo de ser – converte o seu interrogado em seu contrário. A questão priva-se, ela mesma, do seu objeto específico” (HEIDEGGER, 2000, p. 53).

Portanto, Heidegger não responde essa questão porque sua formulação é em si mesma contraditória, assim, ao se perguntar pelo nada ele já sabe que a resposta é impossível – é irrespondível. “Pois, o nada é a negação da totalidade do ente, o absolutamente não-ente” (HEIDEGGER, 2000, p. 54). Isso significa que o nada heideggeriano não é um “não” que se contrapõe a um “sim”; uma contraposição a algo positivo. O nada é a angústia do homem diante da finitude – não porque é mortal, mas porque é consciente de sua finitude.

Assim sendo, o tomar consciência “caracterizou-se a de-cisão como o projetar-se silencioso e preste a angustiar-se para o ser [...] (HEIDEGGER, 1990b, p. 97); tornando autêntica a existência humana. Podemos concluir certamente que, para Heidegger, o que conduz o homem para essa existência autentica é o sentimento mesmo de angústia. Este sentimento leva o homem ao cerne da própria angústia, uma vez que, “a angústia manifesta o Nada” (HEIDEGGER, 2000, p. 57).
Portanto, devido essa angústia, e consciente de sua finitude, o homem passa a ser “construtor”; e se apresenta como projeto nos limites da finitude humana – sempre nos limites de seu mundo. Assim lemos num trecho do próprio Heidegger:

Tão finitos somos nós, que precisamente não somos capazes de nos colocarmos originalmente diante do nada por decisão e vontade próprias. Tão insondavelmente a finitização escava as raízes do ser- aí que a mais genuína e profunda finitude escapa à nossa liberdade (HEIDEGGER, 2000, p. 60).
Em Heidegger, o niilismo está posto como a tomada de consciência da finitude humana onde o homem se reconhece como um “ser para a morte”, marcado pela angústia de estar predestinado ao vazio, ao nada. Logo, sua ontologia não se propõe a definir o que é esse objeto com o qual tanto se ocupou a tradição filosófica, ao contrário, pensa o ser que se desvela no nada.

Para Heidegger, o angustiado não somente ignora a razão de seu estado de consciência como também tem certeza de que coisa alguma no mundo está implicada nesse estado. Isso se comprovaria pelo fato de que, na angústia, todas as coisas do mundo aparecem bruscamente como desprovida de qualquer importância, tornam-se desprezíveis e dissolvem-se em nulidade absoluta (CHAUÍ, 2000, p. 8).

Por isso, Heidegger mostra-nos que a angústia está como via de acesso ao ser; uma mola propulsora para o nada. Contudo, uma vez impulsionados à presença do próprio nada, nós, “estamos suspensos” dentro dele, nas palavras do filósofo[4]; e dessa maneira se nos apresenta a possibilidade da transmutação do ser no nada. Portanto, o que acontece ao ser uma vez posto na presença e “suspenso” no nada? Para respondermos a essa questão – e para alcançarmos o propósito da compreensão da temática do niilismo entre Heidegger e Nietzsche – podemos nos ater a esse estado de “suspensão” do ser numa perspectiva hermenêutica desse fenômeno. Porquanto, mediante o processo em que no fim, “do ser como tal nada mais há” (HEIDEGGER citado por VATTIMO, 2002, p. 115).

Seguindo, pois, essa linha de pensamento, o ser – propriamente heideggeriano – “suspenso” no nada, manifesta-se como redução do ser a valor; e, nessa ótica, Gianni Vattimo, para corroborar essa análise, diz que: “para Heidegger, o ser se aniquila na medida em que se transforma completamente em valor" (VATTIMO, 2002. p. 4). Logo, cabe-nos – frente à conotação niilista – atentar ao termo ora empregado, a saber: valor; posto que o uso deste conceito divulga que o ser, porquanto a uma transformação completa deste a valor, se evidencia na angústia heideggeriana, e se manifesta como um retroceder que recebe seu impulso inicial do nada[5]. É, portanto, característica do niilismo heideggeriano a redução do ser a valor.

Contudo,para compreender de maneira adequada a definição heideggeriana do niilismo e ver sua afinidade com a de Nietzsche, devemos atribuir ao termo valor, que reduz a si o ser, a acepção rigorosa de valor de troca. O niilismo é, assim, a redução do ser a valor de troca (VATTIMO, 2002, p. 5).

Para que o niilismo alcance a fase de consumação-transmutação do ser em valor, se faz necessário instituir o que Vattimo chama de “zona livre do valor de troca”. Essa zona livre propicia uma base necessária para a nossa compreensão do ser que se reduz a valor de troca – como em Wittgenstein (1889-1951) que também distinguia uma zona de “silêncio”[6] –; para que o niilismo se extremize consumando o ser em valor. “É esse o acontecimento que torna finalmente possível, e necessário, para o pensamento, dar-se conta de que o niilismo é a nossa (única) chance” (VATTIMO, 2002, pp. 8-9).
Pois, estando “suspenso” nessa zona, o ser-aí entra em relação de troca com o ente. Isso decorre do fato de que “o nada não é um conceito oposto ao ente, mas pertencente à essência mesma (do ser). No ser do ente acontece o nadificar do nada” (HEIDEGGER, 2000, p. 59).

Essa zona livre não opera nenhuma destruição de todo o ente em si mesmo, todavia, para o atingirmos, o nada realiza-se por uma negação do ente em sua totalidade. Portanto, mesmo com a fórmula expressa da negatividade, que tem por escopo o nada, vemos que “já antes disso, o nada nos visita” (HEIDEGGER, 2000, p. 58); justamente devido à fuga propiciada pelo sentimento de angústia e finitude, uma vez que, “na angústia se manifesta um retroceder…” impulsionado inicialmente pelo nada.

Não obstante, a essência do nada em Heidegger é a nadificação. Porém, ela não comporta uma destruição, nem tampouco se origina da negação propiciada pela angústia. É, pois, o nada que nadifica.
O nadificador do nada não é um episodio casual, mas, como remissão (que rejeita) ao ente em sua totalidade em fuga, ele revela este ente em sua plena, até então oculta, estranheza como o absolutamente outro – em face do nada (HEIDEGGER, 2000, p. 58).

Somente suspenso no nada é que o ente, enquanto tal, se desvela. Esse valor de troca originado na zona livre consiste em conduzir o ser-aí diante do ente enquanto tal. Portanto, o Daisen[7] de Heidegger, significa tão somente, estar suspenso dentro do nada. È, conseqüentemente, o caminho último e necessário ao niilista: tomar consciência de que no fim, “do ser como tal nada mais há”.
Assim, após tomarmos de maneira simples as conclusões de Heidegger, acerca do tema niilismo, veremos como a acepção de Nietzsche se revela frente a esse conceito. Para tanto, convém abordarmos uma temática bastante cara ao pensamento de Nietzsche, a saber: a morte de Deus. Para ele, “[...] todo o processo do niilismo pode ser resumido na morte de Deus, ou também na ‘desvaloração dos valores supremos’” (VATTIMO, 2002, p. 4). Essa compreensão da ausência de Deus nietzschiana leva o homem a um itinerário novo, Isto é, o niilista caminha – após a morte de Deus – para um niilismo consumado.

Por conseguinte, com a morte de Deus podemos entender que o pensamento de Nietzsche está alicerçado num cenário de superação dos valores supremos. Assim, ao enveredarmos no “abismo” do pensamento nietzschiano, vemos que uma maneira própria de entender os valores supremos (Deus) está expresso em um de seus escritos intitulado Crepúsculo dos ídolos (1888). Nesta obra, o filósofo “martela” os valores últimos por considerá-los supérfluos.
Na obra acima citada, Nietzsche disserta sobre a história de um erro em que o homem “sábio e devoto” – “pecador que faz penitência” – forma para si o “mundo verdadeiro” para poder arrimar sua fraqueza. No entanto, com a desvaloração dos valores últimos, Deus se torna inútil. Assim, num excerto dessa mesma obra lemos:

O “verdadeiro” mundo – uma Idéia que não é útil para mais nada, que não é mais nem sequer obrigatória – uma Idéia que se tornou inútil, supérflua, conseqüentemente uma Idéia refutada: expulsemo- la! (NIETZSCHE, 1983, p. 332).

Em Nietzsche o homem não precisa mais crer-se uma alma imortal, visto que, a conscientização frente a abnegação da vontade de nada, isto é, o descrédito dos valores supremos (Deus), figura o pano de fundo para a superfluidade destes. É, portanto, com essa acentuação – de que Deus se tornou inútil – se denota a raiz do niilismo consumado na visão de Nietzsche. No entanto, para o niilista consumado , a liquidação dos valores supremos não suporta o estabelecimento ou o restabelecimento de uma situação de “valor” que se reapropria, pois o que se tornou supérfluo é notadamente inútil. Cabe tão somente ao niilista consumado nietzschiano abandonar essa Idéia – refutá-la.
Nietzsche vê o niilismo como o nosso destino desencadeado pela “morte de Deus”. Assim, depois de suprimir-se a Deus como representante dos valores últimos, o mundo do niilista encontra-se à deriva; nossas convicções se revelaram mentiras. Agora, o homem está condenado a vagar através do nada – num itinerário vazio.

Com efeito a morte de Deus preconizada por Nietzsche, torna o mundo verdadeiro em que este habitava vazio; e não cabe ao homem assumir o lugar da quimera. Destarte, como vemos numa página do próprio Nietzsche podemos, aferir o caráter de fábula do mundo superior[8]. Deste modo, é por procurar uma finalidade para sua existência de modo utópico e doutrinário que o homem se torna também um animal quimérico, como se lê num aforismo do próprio Nietzsche:

O homem tornou-se gradualmente um animal fantástico, que mais que qualquer outro tem de preencher uma condição existencial: ele tem de acreditar saber, de quando em quando, por que existe, sua espécie não pode florescer sem uma periódica confiança na vida! Sem fé na razão da vida! (NIETZSCHE, 2001, pp. 53-54).

Este mundo que se tornou “fábula” é, de fato, um lugar invalidado da experiência; nele não há “verdade”. O homem só pode “encontrá-la” num mundo que não se contradiga, não iluda; desse modo, parte numa busca por um caminho, a saber, vazio. O niilista consumado é aquele que compreendeu que o niilismo é a sua única chance, visto que, este caminho filosófico proposto por Nietzsche é tudo o que devemos esperar: nisto consiste o processo de identificação de um niilismo ativo. Eis, pois, o caminho que é a nossa única chance… ser niilista consumado!

Então, como a definição de Heidegger coincide com a compreensão apresentada por Nietzsche? Para este o niilismo pode ser resumido na “morte de Deus” e a desvaloração dos valores supremos; para aquele, “a redução do ser a valor” através da angústia. Por certo, devemos considerar que o elo entre essas duas acepções filosóficas do niilismo concerne ao termo valor.
Portanto, do ponto de vista nietzschiano-heideggeriano o que se pode averiguar é o fato de que, para ambos, desaparecem os valores supremos apenas; quer o ser se extremize no valor, quer no abandono dos valores supremos por sua superfluidade resumidos em Deus.

A visão nietzschiana, porém, não tira o sentido da noção de valor heideggeriana, pois, com a zona livre do valor de troca, liberta-se a potencialidade vertiginosa, posto que, uma vez “suspenso” no nada, os valores podem se manifestar em sua natureza mesma, que consiste numa convertibilidade-transformabilidade-processualidade indefinida.

Essa indefinição remete-nos, por conseguinte, às probabilidades de ser do niilista que “constrói” – de um ponto de vista mais heideggeriano – sua existência autêntica; impulsionada pelo nada de modo a confluir a este. Agora, se seguirmos o binômio filosófico niilismo-valor podemos aferir que o niilismo “é o ser se dissolver completamente no dis-correr do valor, nas transformações indefinidas da equivalência universal” (VATTIMO, 2002, p. 6). É, portanto, a consumação do ente na zona livre do valor de troca – no nada. Sendo assim, o ser apenas poderá atingir seu processo de transmutação sem o embargo do valor supremo. Logo, “ser-aí quer dizer: estar suspenso dentro do nada” (HEIDEGGER, 2000, p. 58), para assim, dessacralizar o nada com a sentença nietzschiana da “morte de Deus”.

2. 2. A sentença nietzschiana: Deus está morto

Como vimos, o niilismo entre Heidegger e Nietzsche passa por uma transmutação em que o valor supremo se esvazia de significado onde o “ser” heideggeriano se assemelha à “morte de Deus” nietzschiana. Por isso, o elo entre ambos caracteriza-se pelo processo em que o niilista compreende que no fim do processo do ser como tal tudo se mostra vazio, pois, o que fora dito anteriormente sobre o valor supremo (Deus) configura-se, a partir do niilismo, numa superfluidade consoante à morte de Deus preconizada por Nietzsche.
Para tanto, mediante o itinerário proposto, tomaremos a compreensão de Nietzsche sobre o niilismo ora analisada onde este se apresenta sob o fenômeno da dessacralização dos valores supremos (Deus).

“O seguinte esclarecimento [da sentença nietzschiana ‘Deus está morto’] procura indicar o ponto a partir do qual, talvez, possa vir a ser colocado um dia a pergunta sobre a essência do niilismo” (HEIDEGGER, 2003, p. 471).
É, pois, com essa afirmação que a leitura heideggeriana de Nietzsche se nos apresenta nas primeiras linhas de seu escrito – que ora nos inspirou a presente temática –, a saber, a sentença nietzschiana: Deus está morto. Todavia, a interpretação de Heidegger sobre Nietzsche comporta uma reflexão acerca dos textos nietzschianos, interpelando seus leitores com uma análise da aparentemente simples sentença “Deus está morto” como o cerne do niilismo.

O aspecto da morte de Deus abrirá à nossa reflexão a possibilidade de compreensão deste movimento histórico que se tornou um dos símbolos da filosofia de Nietzsche. Assim, como pronunciamento da morte de Deus os valores últimos não se estabilizam mais; e sob o sinal da ausência de Deus, o niilismo surge como nomenclatura para tal fenômeno, que se inicia no século XIX, transpassando todo o período seguinte até nossos dias. Contudo, isso decorre do fato de que a sentença nietzschiana “Deus está morto” denomina o destino final de dois mil anos de história dos valores ocidentais.
Nietzsche expressou a sentença da morte de Deus pela primeira vez em sua obra A gaia ciência (1882). Com este escrito começa o caminho do niilismo propriamente pensado por Nietzsche, ou seja, a morte de Deus na desvaloração dos valores supremos. No entanto, numa anotação para a elaboração de seu primeiro escrito, O nascimento da tragédia, pode-se constatar que o pensamento da morte de Deus já se apresentava em seu gérmen; posto que essa idéia já estava na intenção do jovem Nietzsche. 

Assim, lemos: “Eu acredito na sentença originalmente germânica: todos os deuses precisam morrer” (NIETZSCHE citado por HEIDEGGER, 2003, p 476).
Não obstante, é em A gaia ciência que a idiossincrasia nietzschiana frente à temática “Deus está morto” revela-se propriamente na intenção da morte do Deus ocidental – o Deus cristão. Porém, essa investida contra o Crucificado, não encerra uma crítica às práticas da religiosidade cristã tão somente, mas a toda representação dos ideais supra-sensíveis na história de dois mil anos, e na qual os homens foram submetidos; e seus valores moldados a partir desse valor supremo: Deus.

Na obra supra citada, mais precisamente no aforismo 125, podemos conferir um texto que é freqüentemente utilizado para a reflexão do temo em uso; e no qual podemos constatar que o homem desvairado diz a notícia da “morte de Deus”. Vale, portanto, observarmos o texto completo desse aforismo intitulado “o homem louco”. Vide:

O homem louco.Não ouviram falar daquele homem louco que em plena manhã acendeu uma lanterna e correu ao mercado, e pôs-se a gritar intensamente: “Procuro Deus! Procuro Deus!”? – E como lá se encontrassem muitos daqueles que não criam em Deus, ele despertou com isso uma grande gargalhada. Então ele está perdido? perguntou um deles. Ele se perdeu como uma criança? disse um outro. Está se escondendo? Ele tem medo de nós? Embarcou num navio? Emigrou? – gritavam e riam uns para os outros.
 
O homem louco se lançou para o meio deles e trespassou-os com seu olhar: “Para onde foi Deus?”, gritou ele, “já lhes direi! Nós o matamos – vocês e eu! Somos todos seus assassinos!

Mas como fizemos isso? 
Como conseguimos beber inteiramente o mar? 
Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte? 
Que fizemos nós, ao desatar a terra do seu sol? 
Para onde se move ele agora?
Para onde nos movemos nós? 
Para longe de todos os sóis? 
Não caímos continuamente? 
Para trás, para os lados, para a frente, em todas as direções? 
Existem ainda ‘em cima’ e ‘em baixo’?
Não vagamos como que através de um nada infinito? 
Não sentimos na pele o sopro do vácuo? 
Não se tornou ele mais frio? 
Não anoitece eternamente?
Não temos que acender lanternas de manha? 
Não ouvimos o barulho dos coveiros a enterrar Deus?
Não sentimos o cheiro da putrefação divina? – também os deuses apodrecem!

Deus está morto!
Deus continua morto! 
E nós o matamos!

Como nos consolar, a nós, assassinos entre os assassinos? 

O mais forte e o mais sagrado que o mundo até então possuíra sangrou inteiro sob os nossos punhais – quem nos limpará este sangue? Com que água poderíamos nos lavar? 
Que ritos expiatórios, que jogos sagrados teremos que inventar?
A grandeza desse ato não é demasiado grande para nós? 

Não deveríamos nós mesmos nos tornar deuses,
para ao menos parecer dignos dele? 

Nunca ouve um ato maior – e quem vier depois de nós pertencerá, por causa desse ato, a uma história mais elevada que toda história até então!” Nesse momento silenciou o homem louco, e novamente olhou para seus ouvintes: também eles ficaram em silêncio, olhando espantados para ele. “Eu venho cedo demais”, disse então, “não é ainda meu tempo. Esse acontecimento enorme está a caminho, ainda anda: não chegou ainda aos ouvidos dos homens. 

O corisco e o trovão precisam de tempo, 
a luz das estrelas precisam de tempo, 
os atos, mesmo depois de feitos, precisam de tempo
para serem vistos e ouvidos. 

Esse ato ainda lhes é distante que a mais longínqua constelação – e no entanto eles o cometeram!” – Conta-se também que no mesmo dia o homem louco irrompeu em várias igrejas, e em cada uma entoou o seu Réquiem aeternam deo. Levado para fora e interrogado, limitava-se a responder:
 
“O que são ainda essas igrejas, 
se não os mausoléus e túmulos de Deus?” 
(NIETZSCHE, 2001, pp. 147-148).

Ora, com a desvaloração dos valores supremos em Deus sentenciada por Nietzsche, os homens vêem-se carecidos de finalidade para a sua existência; e, por conseguinte, a vida torna-se sem sentido. “A sentença ‘Deus está morto’ significa: o mundo supra-sensível está sem força de atuação. Ele não fomenta mais vida alguma” (HEIDEGGER, 2003, p. 478). Destarte, podemos conferir essa idéia de um mundo; de um mundo que não vige mais força alguma, presente no Crepúsculo dos ídolos, como vimos.

Nietzsche ao gritar a morte de Deus, nos lábios daquele louco declara ser ele mesmo 

incompreendido – acaso não estaria o próprio Nietzsche a nos interpelar? Portanto, a imagem do homem que possuía uma lâmpada e “procura Deus” em pleno dia, evoca, decerto, a figura do filósofo cínico Diógenes (413-323 a.C.) que procurava “um homem” nas mesmas situações do desvairado de Nietzsche.
Com isso, podemos perceber que o vaticínio da sentença nietzschiana encerra a necessária adesão por parte de todos a si mesmos; pois cada qual é o assassino de Deus. Deste modo, o Deus que morre não é apenas o Deus dos sacerdotes, mas também o deus dos filósofos que, mesmo não acreditando no Deus dos ritos e superstições, percebem-se também sem o princípio ordenador do cosmo e que assegura um sentido ao universo. 

Com isso, o homem desvairado que grita “Deus está morto”, é incompreendido; mesmo entre os ateus por destruir todo e qualquer sentido ao mundo supra-sensível quanto ao sensível. Por isso, ele mesmo, o “louco”, acredita que o seu tempo ainda não chegou, isto é, o anúncio da “morte de Deus” não se estabeleceu no seio de seus contemporâneos.

Certamente é por isso que o louco é mal compreendido, mesmo por aqueles que não crêem em Deus; e de forma alguma tiram disto as conseqüências que o ateísmo traz e, preferem assim, continuar a viver como se a notícia da “morte de Deus” não se lhes tivessem chegado aos ouvidos, a nós. “Eu venho cedo demais”, disse então, “não é ainda meu tempo. Esse acontecimento enorme está a caminho, ainda anda: não chegou ainda aos ouvidos dos homens” (NIETZSCHE, 2001, p. 148) A esta sentença devastadora, o mundo supra-sensível fica sem força de atuação. Se “Deus está morto”, então não resta mais nada em que o homem possa se apoiar e a que ele possa se direcionar. Com a consciência de que Deus está morto o niilista inicia seu ponto basilar para uma transvaloração radical dos valores supremos que se vivenciou até aqui.

Se Deus está morto enquanto o fundamento supra-sensível e enquanto a meta de todo real, se o mundo supra-sensível das idéias perdeu sua força imperativa e antes de tudo sua força evocadora e construtora, então não resta mais nada, junto a quem o homem possa se manter e em direção a que ele possa se direcionar (HEIDEGGER, 2003, p. 479).

Portanto, com essa leitura de Heidegger, vemos que o “Deus está morto” de Nietzsche é intrínseco ao modo de compreensão do niilismo dada pelo próprio filósofo. À busca infrutífera daquele que gritava: “Procuro Deus! Procuro Deus!”, seguida da incompreensão dos homens, oferecem-nos a interpretação na qual o acontecimento histórico em que a derrocada de Deus e o aparecimento do niilismo é um fato que se chagara prematuramente. 

Conseqüentemente, 
a morte de Deus é um fato 
que ainda está acontecendo a nós.

Há, contudo, duas maneiras de ateísmo – provavelmente encontradas pelo louco do aforismo 125: uma delas é o não crer em Deus, a outra, crer que ele não existe. Essas duas maneiras de ateísmo podem ser confirmadas no pensamento de André Comte-Sponville (1952) em seu Dicionário Filosófico[9]. Segundo este, no primeiro caso, temos uma ausência de crença (ausência de Deus) que ele define como “ateísmo negativo”; já no segundo caso, temos uma crença numa ausência (negação de Deus), posição que o filósofo classifica de “ateísmo positivo”, ou mesmo “militante”. Nietzsche, porém, proclama que ele morreu: nós o matamos – vocês e eu. A “morte de Deus” é expressão máxima do ateísmo niilista por Nietzsche, visto que sem o qual, não poderá haver “a transmutação de todos os valores” – um niilismo.

Nietzsche previu grandes marasmos em seu século e até hoje, um grande declínio, após o desatar a terra de seu sol metafísico, até então considerado o pólo a ser atingido; como também a derrocada dos valores platônicos e cristãos no apagar o horizonte. Com isso, coloca-se o homem perto do nada, vitimado pelo niilismo. Os valores ora cultuados durante séculos desabaram, haja vista a notícia da morte de Deus. O mundo soava oco e a absurdo. Assim, Nietzsche antevê a terríveis conseqüências, os grandes cataclismos e desabamentos, que se seguiram à “morte de Deus”:

O maior acontecimento recente – o fato de que “Deus está morto”, de que a crença no Deus cristão perdeu o crédito – já começa a lançar suas primeiras sombras sobre a Europa. [...] Essa longa e abundante seqüência de ruptura, declínio, destruição, cataclismo, que agora é iminente: quem poderia hoje adivinhar o bastante acerca dela para ter de servir de professor e prenunciador de uma tremenda lógica de horrores, de profeta de um eclipse e ensombrecimento solar, tal como provavelmente jamais houve na Terra?… (NIETZSCHE, 2001, pp. 233-234).

É, pois, este, o ponto culminante no processo de dessacralização dos ideais ascéticos, da descristianização do ocidente, isto é, o maior acontecimento recente – o fato de que “Deus está morto”. Portanto, ao pregar este necessário assassinato,a saber, “a morte de Deus” Nietzsche defende que, só a partir disto, é que os homens se libertarão dos ideais quiméricos. É, portanto, esse acontecimento que vem trazer para nós, a maturidade e o deslocamento do eixo interpretativo de toda vontade de verdade para a vontade de potência e nada mais. É o fim do fundamento ontológico das coisas, condicionando um ateísmo plenificado, pois Deus está morto – eis o grande acontecimento!
Conquanto Nietzsche compreende em seu próprio pensamento que a doutrina da vontade de poder principia, portanto, “uma nova instauração de valores”, no sentido de um niilismo plenificado – consumado. A vontade de poder transforma-se em origem e medida de uma nova valoração. Portanto, o tomar consciência de que “Deus está morto” é passo impreterível para a radical transvaloração dos valores supremos até aqui.

O derradeiro passo após a instauração de uma consciência de transvaloração é, senão, uma nova história mais elevada em que o princípio de toda avaliação é levada a termo na vontade de poder, pois, “o niilismo ‘da desvaloração dos valores supremos’ [do ateísmo até aqui vigente] foi superado” (HEIDEGGER, 2003, p. 511). Com isso, a humanidade quer o seu próprio ser-humano visto a partir da vontade de poder. Um homem que se configure enquanto pertencente à sua vontade mesma – que se projete para além do homem até aqui visto. Decerto, ele virá, o homem redentor – do grande amor e do grande desprezo – e nos impulsionará a transcender toda a nossa insignificância.

Esse homem do futuro, que nos salvará não só do ideal vigente, como daquilo que dele forçosamente nasceria, do grande nojo, da vontade de nada, do niilismo, esse toque de sino do meio-dia e da grande decisão, que torna novamente livre a vontade, que devolve à terra sua finalidade e ao homem sua esperança, esse anticristão e antiniilista, esse vencedor de Deus e do nada – ele tem que vir um dia…
– Mas que estou eu a dizer? Basta! Basta! Nesse ponto não devo senão calar: caso contrário estaria me arrogando o que somente a um mais jovem se consente, a um “mais futuro“, um mais forte do que eu – o que tão-só a Zaratustra se consente, a Zaratustra, o ateu… (NIETZSCHE, 2005, pp. 84-85).

3. NIETZSCHE, PROFETA NIILISTA: DA CONSTRUÇÃO DO ZARATUSTRA AO SURGIMENTO DO SUPER-HOMEM

3. 1. Zaratustra: profeta do ateísmo

“Dentro de meus escritos, meu Zaratustra está sozinho. Com ele fiz à humanidade o maior presente que agora lhe foi feito” (NIETZSCHE, 1983, p. 366).
Com estas palavras Nietzsche fala de sua criação literária no prólogo de sua autobiografia intitulada Ecce homo (1888). É em sua obra Assim falou Zaratustra que encontramos o referido personagem. Seu Zaratustra é ressaltado pelo filósofo como um presente; por isso, é mister nos determos na figura desse excêntrico personagem nietzschiano a fim de prosseguirmos com nossa pesquisa.

Embora sendo Nietzsche um ateu, o fato deste ter lançado mão do líder religioso do zoroastrismo[10], a saber, Zaratustra, e ter se inspirado nesta personalidade histórica para veicular sua mensagem, provavelmente deve-se ao episódio de sua vida em que fora instruído na doutrina cristã. 

Por ter sido filho de pastor luterano, 
ele carrega marcas psicológicas de um crente. 

Afinal, o estilo de seus escritos 
– repleto de simbolismo, parábolas, imagens e locais sagrados 
– evoca sua idiossincrasia frente ao cristianismo que ele conheceu.

Sendo Nietzsche, durante a sua infância, de tradição cristã por intermédio do pai, torna-se, desde cedo, conhecedor do livro sagrado dos cristãos, a saber, a Bíblia; circunstância esta que deu ao filósofo as possibilidades de erigir sua “ateologia” – notadamente com a sentença da “morte de Deus” tal como apresentamos no capítulo precedente. No entanto, frente à doutrina vigente na Alemanha de sua época, Nietzsche escolhe o religioso do passado e procura, de certa maneira, desfazer o que aquele fizera, isto é, instituir a idéia de Bem e de Mal; pois seu Zaratustra ficcional está para além dessas categorias; utilizadas inclusive pelo cristianismo. 

Diante dessas considerações, temos em Zaratustra um anticristo, visto que não veio para os pobres e humildes – conforme a religião cristã prega sobre seu profeta –, mas para os que querem viver aqui e agora, sem esperar o Reino dos Céus; pois têm a Terra como seu único reino. De fato, ele desceu da montanha à planície para anular o cristianismo. O profeta de Nietzsche procura os vaticinadores do “relâmpago próximo”; um relâmpago que se chama super-homem[11]. Frente a uma perspectiva do advento próximo de um além-do-homem, Nietzsche declara, em seu Zaratustra, que tal fenômeno ocorrerá através do reconhecimento do que está como grandeza no homem, ou seja, ser ele mesmo um meio para a vinda do super-homem. 

Assim lemos:
O homem é uma corda, 
atada entre o animal e o além-do-homem 
– uma corda sobre um abismo. [...] 

 O que é grande no homem é que ele é uma ponte e não um fim
o que pode ser amado no homem 
é que ele pode ser um passar e um sucumbir
(NIETZSCHE, 1983, p. 227).

Esses são os amados por Zaratustra. Os que são capazes de superar a si mesmos e, apenas sucumbir à vida, pois são os que atravessam a perigosa travessia entre o animal e o super-homem.

Amo os do grande desprezo, porque são os do grande respeito, e dardos da aspiração pela outra margem. Amo Aqueles que não procuram atrás das estrelas uma razão para sucumbir e serem sacrificados: mas que sacrificam à terra para que um dia ela se torne do além-do-homem (NIETZSCHE, 1983, p. 227).

Assim, Zaratustra está para aqueles que afirmam a vida pelo simples fato de existir. Por conseqüência seus inimigos são, senão, os que a desprezam como seus “acusadores”; os que condenam as paixões humanas e consideram-nas desprezíveis; então, exclamam: “Zaratustra é sem-Deus”[12] (NIETZSCHE, 1983, p. 247).

Portanto, Zaratustra é apresentado por Nietzsche como a personagem título de sua obra; e como interprete por excelência de seu ateísmo. Sendo assim, frente a essa figura emblemática, surge-nos a seguinte questão: quem é o Zaratustra de Nietzsche? De fato, essa questão levou Heidegger a escrever um ensaio sobre este, cujo título leva o mesmo nome[13].

Desse modo, podemos encontrar uma compreensão para a referida indagação seguindo a ponderação proposta por este último. Ou seja, se lançarmos um olhar sobre o título principal da obra nietzschiana, podemos perceber qual a função que o autor propõe para seu personagem, a saber: Assim falou[14] Zaratustra. Portanto, ele “fala”. O Zaratustra de Nietzsche é o “porta-voz” da sentença originalmente nietzschiana da superação do homem. Ele está como mestre e precursor do super-homem. Por conseguinte, uma coisa devemos observar imediatamente: este pensamento, que se põe a pensar a figura de um mestre que ensina o super-homem, diz respeito a nós, à Europa, a toda Terra, não somente hoje, mas sobretudo no amanhã (HEIDEGGER, 2002, p. 92).

Decerto, à medida que vamos perscrutando o pensamento de Nietzsche – o que nos faz tanto conhecê-lo quanto ignorá-lo –, vemos que a figura de sua criação literal chama-nos a atenção pelo fato de que, como todo profeta carrega uma mensagem, podemos perceber que em Zaratustra o próprio Nietzsche fala sua doutrina. Portanto, o autor descreve Zaratustra descendo das montanhas para ensinar aos homens o sentido de sua existência. Desse modo, é Zaratustra-Nietzsche que diz: “Quero ensinar aos homens o sentido da sua existência, que é o super-homem” (NIETZSCHE, 2002, p. 31). Portanto, a interpretação do Zaratustra como aquele que ensina se mostra deveras plausível, visto que seu discurso comporta a possibilidade de por o homem até aqui visto na condição de superar a si mesmo, ou seja, ir em destino ao além-do-homem.

Sendo Zaratustra, o ateu e profeta desse mesmo ateísmo, sua notícia denota a volta do homem a si; para seu próprio ego. Desse modo, a imagem do Zaratustra traz, certamente, o aceno nietzschiano para o fim dos valores supremos; e não só, mas principalmente o anúncio de um novo homem, cuja realidade é a da vida imanente, atual e urgente. 

No entanto, para que este “homem do futuro” apareça, faz-se necessário que um tão-só nos ensine “o redentor de mais de dois mil anos de mentira”. Cabe a Zaratustra o ofício de mestre do super-homem. Sem embargo, ele mesmo arroga a si esse encargo como vemos no preâmbulo da obra nietzschiana: “Eu vos ensino o Super-homem” (NIETZSCHE, 2002, p. 25), assim falou Zaratustra.
Destarte, para nascer esse novo homem, o velho deverá desaparecer. Assim, embora a derrocada dos valores supremos se mostre necessária, como muitas vezes parece ter a história do pensamento proposto ao homem, o niilismo dessa desvaloração desencadeia um acontecimento nunca visto até então.

Ele é uma passagem obrigatória para o surgimento do super-homem pelo sacrifício à Terra na valoração da vida; e desse modo, o homem sente-se iluminado a superar a si mesmo, como diz Nietzsche (2001, p. 234): “De fato, nós, filósofos e ‘espíritos livres’, ante a notícia de que o ‘velho Deus morreu’ nos sentimos como iluminados por uma nova aurora”. Deste modo, ele afirma não haver mais um abismo da relação homem/natureza pela dicotomização imanência/transcendência, pois o agora se mostra desvinculado de qualquer referência, seja de um antes, seja de um depois.

Zaratustra proclama não apenas a “morte de Deus”, mas o advento da aurora dos filósofos, isto é, o domínio do super-homem. Porém, o homem da decadência, do ideal cristão compromete a vinda daquele que supera o homem. Não obstante, ainda que o ideal cristão permaneça, mesmo depois do anúncio da morte de Deus, o lugar que este habitava fica vazio; e, assim, os homens continuam a erigir valores muito superiores a si mesmos e, dessa forma, comprometem – para si mesmo – o surgimento do super-homem. Por isso, o Zaratustra diz: “Haja quem os salve de seu Salvador!” (NIETZSCHE, 2002, p. 79).

Por conseguinte, no que concerne ao problema de se erigir valores do mundo supra-sensível, vemos que Heidegger, num dos seus escritos sobre Nietzsche, escreve acerca de tal pensamento. Confira:
Se em verdade Deus, no sentido do Deus cristão, desapareceu de seu lugar no mundo supra-sensível, então sempre resta ainda o lugar mesmo, mesmo que enquanto o lugar esvaziado. O âmbito locativo esvaziado do supra-sensível pode ser retirado (HEIDEGGER, 2003, p. 486).

Diante disto, pode-se concluir que é o próprio Zaratustra que ensina aos homens a reter o anseio de preencher o lugar esvaziado; a negação da vontade de nada, pois, só quando, nós os filósofos, “negamos Deus” é que redimimos o mundo. Logo, cabe a nós aprendermos a profecia da “afirmação da vida”, pois nisso repousa o ensinamento de Zaratustra. No discurso intitulado “o canvalescente” vemos que o profeta retorna à sua caverna numa atitude que evoca o eterno retorno a si mesmo.

“O convalescente” é aquele que se integra e que junta suas forças para o retorno “à casa”, “ao lar”, isto é, para a volta à sua determinação. O convalescente está a caminho de si mesmo de modo tal que ele pode dizer de si quem ele é (HEIDEGGER, 2002, p. 89).

Assim, sobre esse aspecto concernente ao Zaratustra de Nietzsche, podemos inferir que, no discurso já mencionado acima, a autor propõe um retorno ao homem como vontade de poder. Zaratustra fala em favor da vida efetiva como se vê nessa alocução: “Eu Zaratustra, o afirmador da vida, o afirmador da dor, o afirmador do círculo [...]” (NIETZSCHE, 2002, p. 168). Portanto, no tocante a estas três afirmações proferidas na obra nietzschiana – a saber: vida, dor, círculo –, correspondem, decerto, à maneira própria da filosofia de Nietzsche. Assim, acerca da afirmativa “vida”, compreende-se a idéia já vista pelo parágrafo 36 de Além do Bem e do Mal. É, pois, a vontade de poder que diz respeito a tudo o que existe e não só ao homem[15].

O sentido de “dor” já nos é transmitido na intitulação do discurso em foco – o convalescente; com isso, este evoca a “nostalgia” do retorno à casa, e a dor pela “ausência do lar” motivada pela distância de si mesmo. Assim, no sentido nietzschiano, “dor” quer, portanto, significar padecer, tendo em vista a vida do mundo na vontade de poder. Deste modo, podemos conferir que, consoante uma de suas anotações, Nietzsche diz: “Tudo que padece quer viver…” (NIETZSCHE citado por HEIDEGGER, 2002, p. 89).

Conseqüentemente, com a afirmação do “círculo”, o Zaratustra evoca a doutrina da conquista de si mesmo; do eterno retorno do igual. De tal modo, em Ecce homo, Nietzsche faz referência ao ensinamento do eterno retorno entre os Antigos; assim, tal teoria estaria relacionada aprioristicamente a Heráclito (544 – 480 a. C.) e no estoicismo.[16] Vide excerto abaixo:
A lição do “eterno retorno”, quer dizer do ciclo incondicional e infinitamente repetido de todas as coisas – a lição de Zaratustra poderia, em última instância, já ter sido ensinada por Heráclito. Pelo menos a Stoa, que herdou quase todas as idéias fundamentais de Heráclito, mostra rastros dela… (NIETZSCHE, 2006, p. 86).

Diante dessas considerações, é possível inferir sobre as idéias centrais do ensinamento de Zaratustra, a saber: a doutrina do eterno retorno e o super-homem. “Assim brilha o anel, que se chama anulus aeternitatis: anel-sinete e ano da eternidade” (HEIDEGGER, 2002, p. 90). De fato, a palavra de Zaratustra assumirá nele o que lhe é característico para expor o pensamento de Nietzsche. Desse modo, um trecho do escrito nietzschiano exerce um papel fundamental no discurso do Zaratustra. Vide:
Eu mesmo formo parte das causas do eterno regresso das coisas [...] Tornarei eternamente para esta mesma vida, igual em ponto grande e também em pequeno, para ensinar outra vez o eterno regresso das coisas, para repetir mais uma vez as palavras do grande meio-dia, da terra e dos homens a fim de instruir novamente os homens sobre o Super-homem (NIETZSCHE, 2002, p. 172).

Logo, ao conhecermos a figura do Zaratustra de Nietzsche, damos os primeiros passos para o “ultra-passamento” do homem. É Zaratustra que antevê o super-homem e o faz visível através de sua mensagem. Por isso, “Zaratustra é tão-só aquele que ensina e não já o próprio super-homem” (HEIDEGGER, 2002, p. 93).

3. 2. Nietzsche e o surgimento do super-homem

“Tomando, antes, a palavra em sentido literal, o super-homem (Über-mensch) é o que vai para além do homem até hoje vigente [...]” (HEIDEGGER, 2002, p. 91).

Esta citação indica-nos o âmbito no qual deverá mover-se nossa reflexão sobre o surgimento do super-homem. Neste ponto, após termos a compreensão de que Nietzsche traz a concepção de homem que “salta” para além-do-homem, podemos considerar que, já no referido preâmbulo de Assim falou Zaratustra, o próprio filósofo lança mão desse conceito e profere o que afigura sua idiossincrasia concernete ao termo super-homem. Ele diz: “O super-homem é o sentido da terra. Diga a vossa vontade: seja o super-homem, o sentido da terra” (NIETZSCHE, 2002, p. 25).

Por conseguinte, o que significa que o super-homem seja “o sentido da terra”, está posto no sentido de que Nietzsche reconhece o instante niilístico-histórico onde o homem se prepara para o advento da total dominação da Terra. Diante disso, será preciso conduzir o homem até aqui visto, de modo que ele “sucumba” à terra. Com este pensamento de uma filosofia inserida na história, podemos observar o “ultra-passamento” da condição de homem enquanto “animal racional” para “animal volitivo”; o que configuraria a dominação deste último; e, portanto, caracterizando o super-homem como o que está post hominem – além do homem, em sua concepção tradicional. Dessa forma, o super-homem seria aquele que, vindo depois da noção de animal racional, poderia, volitivamente, dizer que é o sentido da terra, ou seja, o super-homem, advoga Nietzsche, passaria a ser tido como tal por estar na posição determinante da vontade.

Portanto, “o nome para a configuração essencial da humanidade que se lança para além dos homens até aqui é o super-homem” (HEIDEGGER, 2003, p. 511). Por isso, consoante o ensinamento de Zaratustra podemos concluir que é aprendendo o super-homem que se aprende o que é o homem. Todavia, o super-homem não pode ser confundido com os homens superiores – os “modernos”, os “bons” – ou qualquer tipo de idealista; assim como está posto em Ecce homo:

A palavra “super-homem” para caracterizar um tipo do mais alto feitio, em oposição aos homens “modernos”, aos homens “bons”, aos cristãos e outros niilistas – uma palavra que na boca de um Zaratustra, o aniquilador da moral, se torna uma palavra assaz reflexiva, quase em todos os lugares foi entendida, com uma inocência completa, no sentido daqueles valores cuja antítese foi trazida à luz na figura de Zaratustra, quero dizer, como tipo “idealista” de uma espécie mais elevada de homem, meio “santo”, meio “gênio”… (NIETZSCHE, 2006, pp. 71-72).

Nietzsche procura estabelecer o super-homem enquanto o futuro do homem, ou seja, de como a gente se torna o que a gente é – conforme o subtítulo da obra supra citada. Porém, a noção dada à palavra “super-homem” permanecerá cheia de contra-sensos visto que, o reconhecimento da mesma, se mostra como tal segundo excerto acima. Para tanto, na obra capital Assim falou Zaratustra, o filósofo destaca, sob a intitulação do discurso “Das três metamorfoses” a “ultra-passagem” do homem, o simbolismo da chama e da imagem do eterno retorno do igual. Vide: “Três transmutações vos cito do espírito: como o espírito se torna em camelo, e em leão o camelo, e em criança, por fim, o leão” (NIETZSCHE, 1983, p. 229).

Mediante esta passagem Nietzsche faz uso de três seres para tornar evidentes as fases da transformação do homem; este, que num primeiro momento não passa de um camelo, é o espírito do homem em sua época religiosa – fadado a seu destino de animal de carga – submetido ao imperativo “tu deves”, sob o signo do “grande dragão” como se vê em Assim falou Zaratustra; pois é o animal que se ajoelha quando lhe dão uma carga no deserto. O camelo é a imagem do homem da decadência, do ideal cristão que na sua humilde corcova está sobrecarregado pelas regras morais e pelas imposições que lhe fazem, que lhe dizem: “tu deves”.

Porém, no deserto, isolado, dá-se uma transmutação; o espírito que se transmuta, está acompanhado de termo, decerto, emblemático, a saber: o deserto. Embora o espírito nesta condição esteja subjugado ao peso do “grande dragão”, ele caminha pelo seu deserto onde encontra, senão, o nihil­ – o nada.

Mas no mais solitário deserto ocorre a segunda transmutação: em leão se torna aqui o espírito, liberdade quer ele conquistar, e ser senhor de seu próprio deserto. Seu último senhor ele procura aqui: quer tornar-se inimigo dele e de seu deus, pela vitória quer lutar com o grande dragão. [...] Mas o espírito do leão diz “eu quero” (NIETZSCHE, 1983, p. 229).

O espírito que se transmuta em leão – no nada – emerge da rebeldia. 

Os valores milenares que ora “resplandecem nas escamas do grande dragão”, querem, por sua vez, inibir o “eu quero”. Entretanto, a insubordinação contra os valores tradicionais e contra as imposições morais de leão não basta. “Criar novos valores – disso nem mesmo o leão ainda é capaz: mas criar liberdade para nova criação – disso é capaz a potência do leão” (NIETZSCHE, 1983, p. 230). De fato, ainda que o homem em sua segunda transmutação não consiga criar novos valores, ao menos, por sua força e vigor, lança para fora o peso que o afligia. Assim, dá-se a terceira transformação: o leão vira criança.
Inocência é a criança, e esquecimento, um começar-de-novo, um jogo, uma roda rodando por si mesma, um primeiro movimento, um sagrado dizer-sim. [...] sua vontade quer agora o espírito, seu mundo ganha para si o perdido do mundo (NIETZSCHE, 1983, p. 230).

Assim, podemos inferir que a criança é a imagem significativa do esquecimento dos valores; um novo começo. Ela está como um embrião do super-homem que ao crescer, “ganha para si o perdido do mundo”. Assim, livre do passado de opressão, um mundo novo descortina-se em tudo por fazer-se. 

A imagem heraclitiana da criança evoca à do super-homem que se opõe aos homens superiores (o leão) e aos escravos da moral (o camelo), representados na modernidade pelos “últimos homens”.

Portanto, o Zaratustra de Nietzsche dirá, senão, que o super-homem é o sentido da terra, visto que esta sentença carrega a recusa dos valores supra-sensíveis na afirmação da vida. Assim, com esse pensamento, Nietzsche lança o homem para o além-do-homem.

O super-homem é aquele 
que determina toda sua realidade 
a partir da Vontade de Poder. 

Logo, o pensamento do super-homem como aquele que se configura no processo niilístico-histórico insere-se no triunfo do “eu quero”. Em vista disso, sob uma leitura propriamente heideggeriana de Nietzsche podemos ver que, “[...] se o homem conquista sua essência em meio ao querer e enquanto o “eu quero” no sentido da vontade de poder ele ultrapassará sua essência até aqui: animal racional” (HEIDEGGER, 2000, p. 198).

Destarte, a transmutação do homem de animal “racional-subjugado” à figura volitiva da criança – símbolo do eterno retorno do igual –, traz consigo o germe do novo homem; posto além do próprio homem. O super-homem como sentido da terra é, portanto, a luta pelo domínio desta, enquanto ela se mostra sob o modo da vontade de poder. Entretanto, este domínio não se caracteriza como predomínio dos valores já cristalizados; pois, como vimos anteriormente, o lugar de Deus permanece vazio e não cabe ao homem (novo) ocupar seu lugar.
Esse super-homem nietzschiano não é um ser que “deseje dominar” [todos os valores]. Se se interpreta vontade de potência, diz Nietzsche, como desejo de dominar, faz-se dela algo dependente dos valores estabelecidos. Com isso, desconhece-se a natureza da vontade de potência como princípio plástico de todas as avaliações e como força criadora de novos valores. Vontade de potência, diz Nietzsche, significa “criar”, “dar” e “avaliar” (CHAUÍ, 1983, p. XIV).

Portanto, o super-homem não poderá ser colocado no lugar de Deus; insere-se, todavia, em seu querer que se constitui noutro âmbito – o volitivo. Ele é o homem mesmo que “passa” para além do homem até aqui; visto que, a frase nietzschiana de que “o super-homem é o sentido da terra”, está sob o signo do niilismo como nome para um movimento histórico reconhecido por Nietzsche a transmutar nosso século, quer dizer, o homem até aqui. Deste modo, para o super-homem, nenhuma verdade imperativa da moral o aflige; nenhum motivo corrói a sua vontade – o “eu quero”.

O propósito do super-homem nietzschiano se estabelece exatamente aonde quer estar, ou seja, estar dentro do “círculo” em constante criação valorativa a partir de si – da Vontade de Poder.

Diante dessas considerações, e lançando-se em direção ao novo querer do homem determinado pelo niilismo, o surgimento do super-homem dar-se-á através do lançar para longe o jugo dos valores morais até então; pois segundo a concepção nietzschiana, os deuses não exercem mais força alguma sobre o (novo) homem – o mundo supra-sensível perdeu sua força sobre nós: os filósofos.

O anseio de uma filosofia niilístico-histórica onde o “querer” conduza toda avaliação dos valores, transmite a idéia posta numa anotação de Nietzsche: “O tempo está por chegar, no qual a luta em torno do domínio da terra será conduzida – ela será conduzida em nome de doutrinas filosóficas fundamentais” (NIETZSCHE citado por HEIDEGGER, 2003, p. 516). Ele, a saber, o super-homem, acontecerá em meio ao levante do homem em direção ao querer-se no desenrolar de sua situação histórica. O tempo que há de chegar com o surgimento do super-homem é o “grande meio-dia”[17], da claridade mais clara; o homem que se tornou consciente de si em contraposição ao saber incondicionado que consiste em substituir a Vontade de Poder pela simplória vontade de cognição. O conceito comum à filosofia do Zaratustra de Nietzsche, ainda que não exaustivo de super-homem, alude antes de tudo à consciência niilístico-histórica da humanidade que quer pensar a si mesma de modo novo, isto é, tal conceito-fenômeno quer dizer, senão, que a humanidade se quer a si mesma.

Assim podemos compreender que, para Nietzsche, a figura do super-homem é aquela única capaz de saber-se no gozo do simples existir, e, desse modo, jogar luz sobre o instante deste processo à determinação da vontade. Para tanto, preza-se uma postura conforme “Aqueles que não procuram atrás das estrelas uma razão para sucumbir e serem sacrificados: mas que se sacrificam à terra, para que um dia ela se torne do além-do-homem” (NIETZSCHE, 1983, p. 227).

Logo, podemos compreender de modo simples o pensamento de Nietzsche por ser o super-homem aquele capaz de “superar” o homem até aqui; capaz de desejar como Nietzsche, ao terminar a primeira parte de Assim falou Zaratustra, a seguinte proposição: “Todos os deuses morreram; agora viva o Super-homem!” (NIETZSCHE, 2002, p. 72). Fazei, portanto, a vossa vontade dizer: “seja o Super-homem o sentido da terra” (NIETZSCHE, 2002, p. 25).
Portanto, após estudarmos um itinerário filosófico segundo Nietzsche sobre a construção do super-homem, como aquele que surge do niilismo da desvaloração, pode-se parecer que estamos erigindo um novo ideal – um novo valor…

Assim, evocamos, para tanto, a reflexão do próprio filósofo:
– Concluo com três interrogações, como bem se vê. “O que ocorre exatamente, você está erguendo ou demolindo um ideal?”, talvez me perguntem… Mas nunca se perguntaram realmente a si mesmos quanto custou nesse mundo a construção de cada ideal? Quanta realidade teve de ser denegrida e negada, quanta mentira teve de ser santificada, quanta consciência transtornada, quanto “Deus” sacrificado? Para se erigir um santuário, é preciso antes destruir um santuário: esta é a lei – mostrem-me um caso em que ela não foi cumprida!… (NIETZSCHE, 2005, p. 83).

CONCLUSÕES

Neste trabalho analítico sobre o niilismo como caminho para o super-homem, procurou-se, mediante as considerações tomadas durante o desenvolvimento deste estudo monográfico, abordar, de maneira simples, a compreensão dada por Nietzsche frente ao movimento histórico da derrocada dos valores.
A presente pesquisa buscou mostrar como o fenômeno niilístico-histórico foi percebido por Nietzsche de maneira que sua abordagem propiciou o surgimento de um novo homem o sentido da Vontade de Poder. Em Nietzsche o niilismo está inserido no processo histórico de sua época – e até nossos dias.
A partir do desenvolvimento desta pesquisa, percebemos que o levantamento da temática em foco caracteriza-se pela busca de expressar a superação de todos os valores quer sociais, quer ideológicos.

A perspectiva filosófica instaurada por Nietzsche 
contribuiu para uma nova forma de avaliação 
de nossa realidade.

Portanto, retomaremos, pois, o que já fora exposto, buscando deixar apontados os temas centrais que, segundo o ponto de vista deste trabalho, propiciou o surgimento do super-homem numa conotação niilística da história ocidental.

Para tanto, devemos, inicialmente, tomar o tema frente à idiossincrasia nietzschiana sobre o ser humano, ou seja, ele é existencialmente niilista; embora, cada qual caracterize-se mediante um quantum da vontade de poder. Assim, sob o crivo desta, podemos perceber que os valores vigentes em nossa cultura criaram e cristalizaram ideais que negam a vida efetiva do homem, isto é, seus instintos, seus prazeres foram considerados “inferiores”. No entanto, segundo Nietzsche, todos os valores devem ser avaliados a partir da vontade de poder presente em cada ser vivo.

Diante dessas considerações, percebemos que seu pensamento abriu as possibilidades de uma crítica da dominação dos valores estabelecidos até então. Nesse sentido, podemos aferir que tal abordagem nos mostra como filosofar com o martelo – segundo subtítulo de Crepúsculo dos ídolos –, pois, a crítica aos valores supremos denota a emergência do homem contemporâneo que passa a construir seu “egoísmo filosófico” tomando a transvaloração dos valores até então para reconhecer o super-homem que está para além do bem e do mal.

Sabemos que o pensamento de Nietzsche não foi, durante muito tempo, bem aceito devido ao seu tom de denúncia contra tudo que se levantava como absoluto, porém, atualmente seu conteúdo foi disseminado como uma nova proposta filosófica se fazendo presente nos mais diversos cenários do saber atual.

Nossa pretensão com este trabalho configura-se, tão somente, como uma contribuição para uma adequada reflexão sobre a fragilidade das imposições socioculturais de nossa época. Nesse sentido, podemos encontrar aspectos referentes a uma “mudança de valores”. Por isso, procuramos, trazer à tona a temática do niilismo que consiste na desvaloração de todos os valores, sob o crivo dessa filosofia niilista. Portanto, o desenvolvimento desta pesquisa procurou, também, responder a questão do valor desses valores. Com o niilismo

[...] uma perspectiva imensa se abre para ele, uma nova possibilidade dele se apodera como uma vertigem, toda espécie de desconfiança, suspeita e temor salta adiante, cambaleia a crença na moral, em toda moral – por fim, uma nova exigência se faz ouvir. Enunciemo-la, esta nova exigência: necessitamos de uma crítica dos valores morais, o próprio valor desses valores deverá ser colocado em questão [...] (NIETZSCHE, 2005, p. 12).

Frente essa emergência, vemos que, hodiernamente, a questão dos valores tornou-se evidente em nossa realidade; no entanto, parece-nos que a abordagem ora feita, exprime apenas uma forma de “inversão de valores”. Assim, segundo essa perspectiva, tão comumente exposta em nosso cotidiano, podemos, a partir de Nietzsche, avaliar a dissidência dos diversos setores de nossa sociedade; visto que, cada qual a seu modo, busca estabelecer “novos” valores.

Por conseguinte, o surgimento do niilismo como pressuposto filosófico em Nietzsche favorece-nos a derrocada dos valores supremos para a construção de um novo homem, a saber, o super-homem. Contudo, ao colocarmos o valor desses valores “suspenso” no projeto niilístico-histórico, a possibilidade de uma transvaloração se mostra deveras plausível, visto que se faz preciso pôr o valor desses valores em questão.

Portanto, apesar de sua característica “aniquiladora” o niilismo proposto por Nietzsche preconizará, como vimos, o surgimento do super-homem. este novo homem, capaz de avaliar tudo a partir da Vontade de Poder, é o símbolo nietzschiano da superação do niilismo da desvaloração. É o instrumento de avaliação-afirmação enquanto vontade de poder; parâmetro na legitimação da vida. Não obstante, o esvaziamento provocado pelo niilismo encontra-se o modo no qual podemos saber o puro gozo do existir na realização de nossa Vontade de Poder.

Logo, após estudarmos um itinerário filosófico segundo Nietzsche sobre a construção do super-homem, como aquele que surge do niilismo da desvaloração, esta pesquisa não possui a pretensão de finalizar o assunto abordado, mas, esboçar o pensamento de Nietzsche para uma atual reflexão filosófica, e abrir perspectivas para uma verdadeira transvaloração dos valores.




 Fonte:
CONSCIÊNCIA.ORG
 
http://www.consciencia.org/niilismo-como-caminho-para-o-super-homem-em-friedrich-nietzsche
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Vivam em paz todos os seres
Sejam abençoados todos os seres