sábado, 13 de agosto de 2011

A RETOMADA DA EVOLUÇÃO - Teilhard de Chardin



No capítulo sobre a formação da Noosfera, do Grupo Zoológico Humano, Teilhard procura nos convencer de que o Homem entrou agora no período da "Retomada da Evolução e Neo-cerebralização" e que a Humanidade está evoluindo «Em direção a mais cérebro» (GZH,  pp.148-150):

    "Desse modo, no interior da Noosfera em vias de compressão, uma nova corrente se desenharia, especialmente central e direta : a cerebralização (efeito superior e parâmetro da curvatura cósmica), fechando-se sobre si mesma em um processo de auto-acabamento ; uma auto-cerebralização da Humanidade, tornando-se a expressão mais concentrada da retomada reflexiva da Evolução.*
        *Aquí reaparece e se acentua, até tornar-se dominante, a distinção entre soma e phrên, colocada acima,  (GZH,  p. 57) - Com o aparecimento sobre a Terra da 'Socialização de compressão' (onde o fator mais importante não é mais simplesmente a multiplicação dos indivíduos, mas sim sua capacidade ultra-cerebralizante) estabelece-se de fato um novo regime de evolução biológica, no qual os indivíduos, funcionando ainda como elos por seu germen (prolongamento do 'phylético' no Humano, sob forma de fibras hereditárias sempre reconhecíveis, apesar de estarem cada vez mais entrelaçadas), afirmam-se principalmente pelo seu phrên, como elementos constitutivos do 'cérebro noosférico' (órgão da reflexão coletiva humana)."

A Evolução, Teilhard nos afirma, não chegou a seu fim ; ela retoma seu curso, no mesmo processo de curvatura sobre si mesma, mas desta vez como uma Evolução consciente de si mesma, originando uma nova etapa da Noogênese, que não cessou depois da criação da Noosfera. Muito pelo contrário, através da super-população da Terra, a Noogênese está progredindo, debaixo de nossos olhos cegos, de salto em salto, em direção ao futuro.

Então, como reconhecer esse progresso, esta nova etapa da Noogênese ? Haverá esperança de uma verdadeira consciência planetária no terceiro milênio ? Ousaremos esperar uma era onde a matéria será posta a serviço do Espírito, ao inverso do que acontece hoje ? Se a resposta é sim, como se efetuará essa mudança ?

Segundo Teilhard, 
essa retomada da Evolução acontece 
através de mutações sutís, de geração em geração, 
como um continuum, seguindo o phylum genético, 
que tem sua origem nas sombras 
do enorme Passado do Homem.
 
Ela é visível a nossos olhos alertas em pequenas nuances que podem ser observadas de modo notável no espaço de algumas gerações. Vejamos o fenômeno da Prolepse, ou seja, a diferença de altura entre uma dada geração e sua descendência. Nesse caso, a geração F2 é mais alta do que a geração F1.
 
É um fenômeno já estudado pela Ciência há algumas décadas, anteriormente mais disperso, mas atualmente mais frequente. Observado antigamente somente nos povos do Norte da Europa, mas hoje em dia é evidente nos povos do mundo inteiro, sem distinção de raça ou de consangüinidade.

Paralelamente a essa mutação, há uma outra diferença no QI das gerações mais jovens, onde se pode obervar facilmente uma sensível diferença a favor das gerações F2. Isso vem provar, lembrando-nos da "Lei de Complexidade-Consciência" que rege a Evolução, tendo em mente o desenvolvimento das estruturas do cérebro, que se trata de um movimento de Cerebralização.
 
É uma complexificação cerebral, tanto física como psíquica : física, levando-se em conta a especialização dos neurônios com o aumento de comprimento das fibras nervosas, necessário para ocupar maior espaço em um corpo físico de altura maior e com um cérebro mais complexo ; e psíquica, em relação ao comportamento do Homem, que, seguindo a lei principal, torna-se mais consciente de si mesmo e agora procura maior Individuação, em uma convegência interior que está em harmonia com a direção evolutiva.

Esse movimento de Cerebralização através de mutações psíquicas, como também físicas, prepara a próxima etapa evolutiva, porque, como Teilhard nos explica, "A Evolução é uma transformação primordialmente psíquica" (PH p. 163). Diante dos "limites orgânicos do cérebro," o movimento, no futuro, seria no Espírito da Humanidade  (A Sobrevida, PH IV p. 280) .

    ["... Elevando-se em direção aos maiores complexos, o mesmo elemento 'psíquico,' desde seu primeiro aparecimento nos seres humanos, manifesta, em relação à sua matriz de 'complexidade,' uma tendência ao domínio e à autonomia. Nas origens da vida, poderia parecer ser a sede de organização (F1) que, em cada elemento individual, engendra e dirige seu centro relativo à consciência (F2). Entretanto, subindo mais alto, o equilíbrio se inverte. Sem engano, desde o primeiro "passo individual da reflexão" --- se não antes --- é F2 que começa a se encarregar ('por invenção' ?) do progresso de F1. Depois, subindo mais alto ainda, ... chegando-se no limiar (conjecturado) da reflexão coletiva, encontramos F2 destacando-se aparentemente de sua limitação temporo-espacial para se unir à sede suprema e universal Omega. Depois da emergência, vem a emersão. Nas perspectivas da involução cósmica, não apenas a consciência torna-se co-extensiva ao universo, mas o universo continua em equilíbrio e em consistência, sob a forma de pensamento, em um pólo supremo da interiorização." (Postscriptum, PM  p. 309) ]

Uma questão surge nesse ponto, mas impossível de se provar, tão escondida ela está na duração do Tempo, no próprio começo da hominização, que é a seguinte : Trata-se de um só phylum genético, ou por outro lado, de diversos phyla ? Se fossem diversos phyla, isso explicaria a diferença das raças humanas e o povoamento dispersivo inicial, aparentemente sem lógica, ao acaso, mas logo agrupando-se e estabelecendo-se em zonas demarcadas do planeta.

Esta questão deve talvez ter sido levantada e estudada pelos cientistas modernos, que com os avanços da Ciência Moderna, dispõem agora de infinitos recursos para levantar o véu de alguns dos antigos "mistérios".

Na opinião de Teilhard, "todos os ramos humanos unem-se geneticamente em baixo da escala, no próprio ponto da reflexão." ((PM p. 188) Em uma nota no rodapé da mesma página, ele acrescenta sua convicção de que a Ciência do Homem poderia pronunciar-se a favor do monophyletismo ( apenas um phylum genético).

É esta, em essência, a explicação de um só phylum genético no início. Não é provável que a Ciência possa provar empiricamente a verdade da teoria dos diversos phyla. É pena, pois isso nos deixa no campo perigoso das perguntas sem resposta, que se referem à nova dimensão do Homem e de seu psiquismo.

Assim, quando se vai exminar o comportamento do Homem Moderno, é preciso dar-lhe um sentido ; perscrutar sua motivação final ; e não nos perdermos em considerações tão detalhadas de sua estrutura física, tão aperfeiçoada, que vem coroar a Evolução. Mas, para que esse fenômeno humano tenha um sentido, é preciso supor uma outra estrutura dinâmica no Homem, que seria seu Espírito, sua alma, esta não possuindo um "locus" palpável em todas essas ramificações especializadas cerebrais ; mas a qual vai orientar seu comportamento psíquico daquí por diante, em direção a maior desenvolvimento espiritual para a Era da consciência coletiva no futuro.

Teilhard tinha a convicção de que "a caminhada da Humanidade, prolongando a de todos os seres vivos, desenvolve-se incontestavelmente no sentido de uma conquista da matéria, posta a serviço do Espírito,...
 
o Pensamento aperfeiçoando 
artificiosamente o próprio órgão 
de seu pensamento, a vida retomada para adiante 
sob o efeito coletivo de sua Reflexão." 
( A Sobrevida, PH IV p.250 )*

  Infelizmente, neste fim de milênio, pode-se perguntar se "a caminhada da Humanidade" não se enganou de estrada, pois ela parece caminhar, de preferência, em direção a uma Era onde o Espírito seria colocado a serviço da Matéria.

No desespero de encontrar "paz sobre a Terra," sem mesmo pensar na paz dentro de si ; para fugir aos conflitos da Terra ; para se afastar das forças negativas de desintegrção, de repulsão, de materialização, de mecanização, de totalitarismo e de falsas ideologias que destroem a reflexão, o homem pensante de hoje interioriza-se, curvando-se sobre si mesmo em busca de maior Individuação. Ele tende a se isolar e procura "tornar-se mais solitário para Ser mais profundamente." (A Sobrevida, PH IV pp. 237-238) Pelo excesso de sua individualização e de sua luta pela vida, ele se engana, sucumbindo facilmente à sobrevivência do mais apto e ao racismo, ou então ele sonha em fugir dos outros e da Terra, procurando outros planetas ou outras dimensões de existência...

 
*-  Para citações mais detalhadas do último livro do Fenômeno Humano, cf. (A Sobrevida, PH IV) :

“A energia máxima será sempre o amor”

Ana Luisa Janeira explica o conceito de energética teilhardiana e como Teilhard de Chardin formulou a tese que se tornou a base de seu pensamento

Por: Graziela Wolfart e Márcia Junges

Ana Luisa Janeira considera Teilhard de Chardin um pensador que desenvolve suas ideias a partir de um conceito de evolução muito próximo ao seu pensamento (de Teilhard de Chardin) e que tem uma visão marcadamente espiritualista da evolução, além de teológica e sintética. A filósofa portuguesa esteve na Unisinos no último mês de setembro, participando do IX Simpósio internacional IHU: Ecos de Darwin, onde proferiu a conferência intitulada

“A energética teilhardiana: 
missão evolutiva em terras cristãs”. 

A entrevista que segue foi concedida pessoalmente. Janeira explica que, segundo Teilhard de Chardin, tudo se desenvolve “numa lei da complexidade consciente. Quanto mais a matéria é complexa, maior consciência haverá. E, nesse caso, a pessoa humana aparece como aquela que sabe o que sabe, isto é, saber ao quadrado. Ela não é o término da evolução, ela é um marco, e, a partir dela, a evolução é constituída, não em termos de cosmogênese, nem de biogênese, mas em termos de noogênese, criando a noosfera. E essa noosfera é que é fundamentalmente a dimensão sociológica da evolução”.

Ana Luisa Janeira é professora na Universidade de Lisboa, Portugal, doutora em Filosofia Contemporânea pela Université de Paris I, e autora de A Energética no Pensamento de Teilhard de Chardin (Livraria Cruz-Faculdade de Filosofia, 1978).

Confira a entrevista.

IHU On-Line - O que é a energética teilhardiana?
Ana Luisa Janeira – A partir da segunda metade do século XIX, quando foram assumidas a primeira e a segunda lei da termodinâmica, houve uma movimentação do pensamento dominante para as questões da energia. E o conceito de energia tornou-se muito influente,  quase como o conceito de evolução. A partir de certa altura, começou-se a falar de evolução de várias coisas, que é um conceito gerado no interior da geologia e da biologia, e que depois se expande para outras áreas.

O mesmo acontece com o conceito de energia. E então, Teilhard de Chardin,  que nasce em 1881, apercebe-se, durante sua formação, da importância desse conceito, e desenvolve uma visão do mundo, uma ideologia baseada na questão da energia. E é isso que ele chamou de energética, que se caracteriza pela existência de duas energias: a energia tangencial e a energia radial. A energia tangencial atua ao nível da matéria, e a energia radial atua ao nível do espírito. 

E Teilhard definiu uma relação entre as duas, dizendo que para uma energia máxima tangencial há um mínimo de energia radial. E que para uma energia máxima radial, há um mínimo de energia tangencial. E isso constituiu, de fato, a partir de um momento importante da vida dele, a base do seu pensamento. E ele equacionou todo o pensamento a tal ponto que, por inerência deste conceito, a energia máxima será sempre o amor.

IHU On-Line - Muitas pessoas chamam Chardin de “Darwin católico”. Que aproximações a senhora faria entre ambos os cientistas?
Ana Luisa Janeira – Ah, eu não faço aproximação nenhuma. Considero que Teilhard é um pensador que desenvolve suas ideias a partir de um conceito de evolução muito próximo ao seu pensamento e que tem uma visão marcadamente espiritualista da evolução, além de teológica e sintética. Espiritualista porque, em última análise, a evolução tende para um aumento do espírito; sintética porque ele não tem uma visão da descrição da energia à maneira, por exemplo, de Bergson,  e, simultaneamente, tem um conceito finalista de evolução. Não sou muito partidária de grandes comparações, porque era preciso que eu conhecesse tanto Darwin quanto Teilhard para poder compará-los. Conheço mais Teilhard, por isso é preferível não fazer comparações.  

IHU On-Line - O que caracteriza a ideia de evolução no pensamento de Teilhard de Chardin?
Ana Luisa Janeira – No caso de Teilhard, tudo se desenvolve, segundo ele diz, numa lei da complexidade consciente. Quanto mais a matéria é complexa, maior consciência haverá. E, nesse caso, o homem aparece como aquele que sabe o que sabe, isto é, saber ao quadrado. Ele não é o término da evolução, ele é um marco, e, a partir dele, a evolução passa, é constituída, não em termos de cosmogênese, nem de biogênese, mas em termos de noogênese, criando a noosfera. E essa noosfera é que é fundamentalmente a dimensão sociológica da evolução.  

IHU On-Line - Em sua opinião, Chardin conseguiu harmonizar teoria da evolução e cristianismo? 
Ana Luisa Janeira – Essas harmonias nem sempre são muito conseguidas. Muitas vezes, elas acabam por destruir, anular, ou reduzir certas diferenças. Mas como projeto foi algo muito consistente e muito bem conseguido. Evidentemente que muitos católicos continuaram a achar que as ideias dele não têm consistência do ponto de vista da teologia cristã ortodoxa, e também muitos cientistas continuaram a achar que as propostas que ele tem não contribuem em absolutamente nada com as ideias mais avançadas da evolução do ponto de vista científico.

IHU On-Line - Os críticos de Chardin acusam-no de ter uma visão demasiado otimista da natureza, que flerta com o panteísmo. Em que medida o jesuíta se inspira em Darwin para compor a sua cosmovisão?
Ana Luisa Janeira – Acho que não. Ele tinha uma forte personalidade e uma maneira única de ser, de intimidade constante com a natureza. É provável que algo tenha acontecido com ele desde criança, porque ele nasce e vive numa zona onde domina uma imensa montanha e onde a natureza é muito exuberante, principalmente o espetáculo geológico de uma elevação imensa com características muito fortes. Parece que seu pai era fascinado pelas questões da geologia, das rochas, e é natural que ele tenha vivido essa sintonia, esse casamento com a natureza de uma forma muito intensa. E isso foi se desenvolvendo depois, pois ele se tornou paleontólogo, acabou vivendo no mundo dos biólogos e geólogos e isso cria naturalmente uma aproximação. Agora, não sei se é panteísta, ou se não é. O que interessa é a sua capacidade de escrever quando se encontra no deserto e não tem outra opção. La messe sur le monde  é de uma paz incontornável para a cultura no século XX.  

IHU On-Line - Qual é o significado de se comemorar o bicentenário do nascimento de Darwin?
Ana Luisa Janeira – A Unisinos, no fundo dessas comemorações, posiciona-se com uma vanguarda avançada de pensamento e se mostra capaz de reconhecer em Darwin uma figura que inovou diante de suas possibilidades e de seus limites, num pensamento arrojado, original, criativo, revolucionário até. É algo muito importante nesse momento em que vivemos no mundo, muitas vezes, marcado por um conformismo, uma formatação que é própria da televisão, e há uma tendência muito forte para a normalização entre as pessoas. Darwin continua sendo um exemplo de alguém que arrojou com uma estratégia especial.
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>> Ana Luisa Janeira já concedeu outras entrevistas à IHU On-Line:
Publicada na IHU On-Line número 311, de 19-10-2009;
Publicada na IHU On-Line número 313, de 03-11-2009;
Publicada na IHU On-Line número 313, de 03-11-2009;
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.

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