domingo, 24 de março de 2013

O SANTUÁRIO NEOGÓTICO: NOSSA SENHORA MÃE DOS HOMENS - AS QUATRO ESTAÇÕES DE VIVALDI


 
Antônio Vivaldi
As Quatro Estações 
42min.

 O Santuário neogótico de
Nossa Senhora Mãe dos Homens
 

Devido ao pequeno número de pessoas que a Ermida do Irmão Lourenço comportava, o contínuo aumento do número de alunos do Colégio e a presença no Caraça do Seminário Maior de Mariana (1854-1882), onde se estudava Filosofia e Teologia, o Padre Clavelin, então superior (1867-1885), resolveu derrubar a primitiva Ermida e construir um grande templo neogótico, seguindo o estilo francês, com material local. Em 1876, iniciaram a demolição da pequena Ermida e a construção do atual Santuário, que levou sete anos, sendo consagrado no dia 27 de maio de 1883.

Mesmo tendo sido feita em estilo arquitetônico francês, a Igreja do Caraça foi construída sem mão-de-obra escrava e toda com material regional: pedra sabão (retirada de perto da Cascatona), mármore (das proximidades de Mariana e Itabirito) e quartzito (da região do Caraça e vizinhanças), unidas com um produto a base de cal, pó de pedra e óleo. 

Construiu-se, assim, a primeira igreja neogótica do Brasil: toda ela desenhada, projetada e edificada por um Padre da Missão, na Serra do Caraça.

 O estilo neogótico em confronto com o barroco

 


















Ao contrário do barroco, o apelo religioso do neogótico não é mais ao emocional, mas ao racional, à capacidade intelectiva do ser humano, que pode caminhar ao encontro de Deus. Se, no barroco, os altares das Igrejas davam a impressão de que Deus vinha poderosamente sobre o fiel, na igreja neogótica toda a construção é feita para que o fiel possa alcançar a Deus, buscá-lo a partir de sua inteligência e reflexão.

 O encontro com Deus se dá agora num mundo aberto, não mais apenas tutelado pela Igreja, mas empurrado pelas ciências e pelos novos conceitos existenciais. Igrejas altas, com ogivas e colunas, demarcam o espaço em que o fiel busca um encontro com o Transcendente, que vive em outro mundo, mas que pode ser encontrado. A claridade e a abertura das Igrejas, com suas janelas, vitrais e rosáceas, demarcam que as Luzes chegaram também para a experiência religiosa e que os novos tempos e os novos ventos devem arejar o conhecimento de Deus e o encontro com o Absoluto.

Aspectos externos da Igreja

 



















 
No frontispício, aparece o símbolo de São Francisco de Assis, padroeiro secundário da Igreja, a cuja Ordem Terceira pertencia o Irmão Lourenço: são as duas mãos chagadas entrecruzadas, uma simbolizando a mão de Jesus Cristo e outra, a de São Francisco. Aparecem também duas datas: 1775 e 1880. 1775 é o marco inicial da construção da Ermida do Irmão Lourenço. 1880 marca o cinqüentenário da manifestação de Nossa Senhora das Graças à Irmã Santa Catarina Labouré (1830), por cujo motivo foi colocada sua imagem no frontispício da Igreja.

Em frente à rosácea frontal, está a imagem de Nossa Senhora das Graças, em ferro fundido e bronzeado, com a inscrição da Medalha Milagrosa: “Ó Maria concebida sem pecado, orai por nós que recorremos a vós!”. Aparecem o reverso da Medalha e um dossel em forma de coroa com as doze estrelas em mármore branco.

Na torre (48m), junto ao relógio se lê o seguinte letreiro:

 “Omni temporis hora 
– aeternitatis Deum adora” 

(“Em todas as horas que marco e bato,
 adora ao Deus eterno”).

 

















A imagem de Nossa Senhora Mãe dos Homens


A bela imagem barroca de Nossa Senhora Mãe dos Homens, vinda de Portugal, chegou ao Caraça em 1784, sendo abençoada no dia 17 de maio. A imagem é peça única, talhada na madeira, tendo suas roupas ricamente pintadas de ouro e a nuvem de sustentação pintada de prata. A imagem traz uma coroa na cabeça e brincos em suas orelhas. Seus membros são grossos, como os das mulheres trabalhadoras, e seu braço direito aparece erguido dando a bênção. Da mesma forma, o menino Jesus, todo nu, no braço esquerdo de Nossa Senhora, ergue também o braço direito para dar sua bênção, enquanto segura na mão esquerda o globo terrestre.

Quando de sua restauração, em 1998, o restaurador descobriu numa fenda que havia no dorso da imagem uma relíquia do final do século XVIII ou início do século XIX – uma oração assinada por Alexandre:


 “Ó Maria Santíssima,
 Mãe de Misericórdia e dos pecadores, 
aqui está a vossos pés o menor de todos eles e o mais indigno filho – Alexandre – escravo vosso. Lançai, minha Mãe e Senhora, 
sobre a alma deste enorme pecador, 
a vossa Santíssima bênção e ponde-me 
os vossos piíssimos olhos e intercedei por nós a vosso Santíssimo Filho,
 meu Deus de Amor e Misericórdia”



A devoção à Santíssima Virgem Maria, invocada como Nossa Senhora Mãe dos Homens, surgiu em Portugal, no século XVIII. Foi iniciada por Frei João de Nossa Senhora, do Convento de São Francisco das Chagas, em Xabregas, um bairro de Lisboa.

Frei João era um exímio pregador, um verdadeiro literato, chegando a ser conhecido como “o poeta de Xabregas”. Com esta facilidade de oratória, pregava sempre e em todo canto, empunhando sempre um crucifixo em suas mãos, convocando o povo à conversão e à volta para Deus por meio de Maria, a Senhora Mãe dos Homens.

A imagem, desejada pelo iniciador da devoção e esculpida por José de Almeida, apresentava a Virgem Maria, medindo seis palmos de altura, com a mão direita erguida abençoando, e, no braço esquerdo, o Menino Jesus.

Carregando a imagem por onde ia, sempre preocupado com a conversão das pessoas, a todos Frei João ensinava a seguinte jaculatória: “Virgem Mãe de Deus e Mãe dos Homens, lançai-nos a vossa bênção”.
Em 1758, em seu próprio Convento, na cidade de Lisboa, Frei João de Nossa Senhora faleceu santamente, deixando atrás de si uma multidão de devotos de Nossa Senhora Mãe dos Homens e um legado que, dali, se expandiria por vários lugares do mundo.

Esta devoção chegou, segundo alguns relatos, ao Brasil trazida pelo Irmão Lourenço de Nossa Senhora, que fundou a Ermida e o Hospício de Nossa Senhora Mãe dos Homens, no ano 1774.

Com o desenvolvimento de seu Santuário e a crescente devoção à Senhora Mãe dos Homens, o Irmão Lourenço fundou também a Irmandade de Nossa Senhora Mãe dos Homens, aprovada por um Breve do Papa Pio VI no dia 12 de agosto de 1791. Foi com a ajuda dos devotos que o Caraça foi sendo construído, a partir de doações, esmolas e trabalho em mutirão. Tal Irmandade, que existiu até 1885, teve em suas fileiras 23.226 fiéis inscritos. O livro da Irmandade, de beleza sem igual em suas anotações e regras, e o livro com os nomes nela inscritos encontram-se, hoje, no Arquivo do Caraça.



No entanto, no Rio de Janeiro-RJ, já em 1750 havia um oratório dedicado à Mãe dos Homens, nas proximidades do canto da Quitanda dos Pretos, da Quitanda do Marisco, do Capitão Alexandre de Castro, e mais tarde de Pero Domingues. Estes oratórios eram construídos e mantidos por particulares e muito respeitados e reverenciados pelo povo. Não eram igrejas, mas, como o próprio nome diz, um oratório. Havia também oratórios cravados em muros, feitos de pedras e nas praças da cidade. A Igreja de Nossa Senhora Mãe dos Homens, do Rio de Janeiro, por sua vez, só começou a ser erguida depois de 1779, quando foi feita a medição do terreno e a previsão de gastos para a cantaria da fachada e o interior do templo. Nesta data, a primitiva Ermida do Caraça, toda barroca, já estava pronta e com licença para ser abençoada.

No Brasil, há pouquíssimas igrejas dedicadas a Nossa Senhora Mãe dos Homens: pelo menos, 17 igrejas, dentre as quais a antiga Igreja localizada na Rua da Alfândega no Rio de Janeiro-RJ. As demais Igrejas de que se tem notícia estão no Caraça, em Porto Feliz-SP, Urubici-SC, Ouro Branco-MG, Belo Horizonte-MG, Campos dos Goytacazes-RJ, Cuiabá-MT, Estrela do Sul-MG, Coqueiro Seco-AL, Palmas de Monte Alto-BA, João Câmara-RN, Iúna-ES, Santo Afonso-MT, Araranguá-SC, Materlânidia-MG e Água Santa de Minas - Tombos/Minas Gerais. 


 Os Vitrais Franceses




Merecem destaque, no interior da Igreja, os vitrais franceses do presbitério, sendo que o central foi doado por Dom Pedro II, quando de sua visita ao Caraça nos dias 11, 12 e 13 de abril de 1881. Nele se percebe, abaixo do Menino Jesus, o brasão do Império, como assinatura de seu ilustre doador.

Da esquerda para a direita, os vitrais retratam o nascimento de Jesus, a apresentação do Menino Jesus no Templo por seus pais, o Menino Jesus com 12 anos no Templo discutindo com os doutores da Lei, o Menino Jesus e seus pais trabalhando em Nazaré e as Bodas de Caná.


 A Ceia de Ataíde

 A Ceia de Ataíde

Pintada em 1828, pelo Tenente Manuel da Costa Ataíde (1762-1830), é das mais belas e importantes obras artísticas do Caraça. No centro, o Cristo está aureolado de luz, rodeado pelos doze apóstolos, divididos em grupos de três. Sobre a mesa, revestida com uma toalha rendada, que ainda conserva as dobraduras de quando estava guardada, além do pão e do vinho, servido num cálice de vidro, há um prato com carne de carneiro, o cordeiro pascal. No chão, a bacia e a toalha usadas no Lava-Pés apontam para a excelência do amor e do serviço.


Judas, o traidor, sentado bem à frente, como que pronto para sair da reunião, segura a sacola de dinheiro e ainda contempla todos os visitantes, independente do lugar em que se encontram na Igreja.


Nos cantos do quadro, à esquerda, três personagens: uma jovem servente, carregando pães e sendo acariciada por um homem que vem logo atrás de si, e uma outra mulher, mulata, como sempre Mestre Ataíde faz questão de retratar. Do outro lado, mais duas personagens completam a cena, entrando no recinto festiva e alegremente.


O quadro custou 350$000, segundo os livros contábeis da Casa, e foi pintada a pedido do superior Padre Jerônimo de Macedo.
A identificação de autoria que se pode ver na tela foi feita pelo pintor alemão George Grimm, quando esteve no Caraça; imprimiu na tela a assinatura que o próprio autor não tinha costume de colocar em suas obras.


 No início dos anos 70, a “Ceia” de Ataíde foi emprestada ao Governo de Minas para a inauguração do Palácio das Artes em Belo Horizonte-MG. Do Palácio das Artes, a valiosa tela foi para o Palácio da Liberdade, sede do Governo Estadual. Em 1975-1976, com a construção da estrada asfaltada para o Caraça, começou-se a ventilar a hipótese de o Governo de Minas não mais devolver ao Santuário do Caraça a tela do Mestre Ataíde, acertando, assim, com os Padres do Caraça os gastos com o asfalto.

O poeta de Itabira-MG, Carlos Drummond de Andrade, admirador e conhecedor do Caraça, num importante jornal do Rio de Janeiro, publicou uma poesia noticiando o fato.


 Drummond, o Caraça e o Mestre Ataíde


 

No início dos anos 70, a “Ceia” de Ataíde foi emprestada ao Governo de Minas para a inauguração do Palácio das Artes em Belo Horizonte-MG. Do Palácio das Artes, a valiosa tela foi para o Palácio da Liberdade, sede do Governo Estadual. Em 1975-1976, com a construção da estrada asfaltada para o Caraça, começou-se a ventilar a hipótese de o Governo de Minas não mais devolver ao Santuário do Caraça a tela do Mestre Ataíde, acertando, assim, com os Padres do Caraça os gastos com o asfalto.
O poeta de Itabira-MG, Carlos Drummond de Andrade, admirador e conhecedor do Caraça, num importante jornal do Rio de Janeiro, publicou uma poesia noticiando o fato.

Carlos Drummond de Andrade
(26/02/1976)




– Quanto quer pelo Ataíde?
fala ao padre lazarista
o emissário paulista
de olhar guloso na “Ceia”
que na aguda serrania
ilumina qual candeia
as ruínas do Caraça.

Dou duzentos, dou quinhentos,
oitocentos mil cruzeiros
por esse quadro... – Não, não!


– Já que estou com a mão na massa,
reforço meus argumentos,
ofereço-lhe um milhão.


Pintura aqui nesses altos,
na friúra desolada
destas rocas, destes longes,
não tem sentido nem vez.


Só peregrinos e monges
podem curti-la. Melhor
é levá-la quanto antes
para o conforto envolvente
do Palácio Bandeirantes.


– Já disse: não. – Ah, desculpe,
prefere que se desfaça
a obra de Mestre Manuel
no desgaste que lhe inflige
o dente roaz do Tempo
em sua faina cruel?


Quer ver Cristo desbotado,
carcomido, atomizado,
mancha pálida no pano?


Seus bem-amados discípulos,
sua mesa, seu pão ázimo,
sua colação simbólica,
sua postura litúrgica,
e sua mensagem mística,
sumindo, pasto de traça,
de cupim e de pobreza,
neste sem-fim do Caraça?


– Deus é grande... – Deus ajuda
a quem, esperto, madruga.


E daí, meu padre, atente
que milagre brasileiro
anda bastante vasqueiro.


Pegue logo esse dinheiro
e com ele faça obras,
obras, obras e mais obras
que a casa do Irmão Lourenço
está pedindo, e que, feitas,
serão atrativo imenso
à multidão de turistas.


Bote piscina, playground,
cassino ­– um “Monte Cassino”,
bote som sofisticado
com Rachel Welch e quejandas
bailando pelas varandas!
  
– Jamais... – Jamais? Que pecado,
recusar a minha oferta!


Eis que outro sacerdote,
de mansinho e de oiça alerta,
já sonhando com um caixote
só de notas de quinhentos
abarrotando a arca murcha
da magra comunidade,
puxa o outro pela manga,
sussurra-lhe: – É bom negócio.


Deus decerto não se zanga,
se vige a necessidade.


Os dois discutem: – Não, não.
– Ora essa, meu irmão.
Vai-se a pintura, mas fica
a nossa vida segura.


Já se criam dois partidos
entre os padres pressionados
e já novos compradores
em enxames voadores
de propostas tentadoras
ferem o doce silêncio
em que, à tarde, ressoa
a melodia dos poemas (melodiosos poemas)
de Henriqueta Lisboa
sobre a vívida montanha.


Vende, não vende. Vendemos?
Que vale ter Ataíde
e não ter teto e parede?


Ser um sacrário de arte,
a mais pura arte mineira,
orgulho do nosso Estado
e da alma brasileira,
sem ter como restaurar
a velha casa de ensino
onde ensinamos a amar
as criações do passado? (as criações do divino?)


Debatem os lazaristas
o grave dilema, enquanto
Manuel da Costa Ataíde
e sua tela, suprema
esperança de resgate
da indigência caracense,
viram tema de comércio.


Corre, corre, Aureliano,
vai, Conselho de Cultura,
depressa, Assembleia, vai,
salva os padres agonaidos (salva agonia dos padres)
da prontidão que os achaca,
e salvando-os, preservando-os (vai,salva-os preservando)
da mercantil ameaça,
salva a arte, salva a glória,
salva o máximo tesouro,
a riqueza que não passa:
Cristo-Ceia do Caraça!


Carlos Drummond de Andrade
(26/02/1976)

*( O  crime de bolir no poema - em azul, é meu.Ade.)


À Gruta de Lourdes se vai pela trilha que leva até a Capelinha e se inicia no estacionamento dos visitantes, seguindo em frente, próximo ao lago dos patos.

 Estando na Capelinha, toma-se o caminho à sua esquerda, atravessa-se um pequeno riacho até um afloramento rochoso. Nesta rocha, há uma seta pintada, indicando que se deve descer. Logo, outra seta indica que se deve virar à direita. Descendo um pouco mais, a trilha segue à esquerda até a Gruta.

A Gruta de Lourdes recebeu este nome quando, em 1904, no cinqüentenário da proclamação do dogma da Imaculada Conceição pelo Papa Pio IX (1854), ali foi entronizada a imagem de Nossa Senhora de Lourdes.

A trilha, de 3 Km, é bem íngreme e com dificuldades, exigindo certo preparo físico e disposição dos visitantes.


A Gruta de Lourdes na voz e no coração do Padre Sarneel


“A gruta mais acessível e piedosa é a de Lourdes. Não está longe da Capelinha. Chamava-se antes Gruta do Irmão José. Foi esse bom Irmão francês cujo nome de família é Cornilleau que colocou, no princípio deste século, a imagem de Nossa Senhora, de túnica branca e faixa azul, na pequena gruta. Hoje é a mais visitada pelos peregrinos que vêm ao Caraça para rezar.

Abre-se a gruta em rocha de natureza calcária. Tem um único salão com cerca de cinqüenta metros de extensão, vinte de largura e outros tantos de altura. O chão é atapetado de uma areia alvíssima que os romeiros apanham com devoção e levam para as suas casas, como presente e lembrança da divina Distribuidora de todas as graças, Maria Santíssima.

Amigo, não podes deixar de visitar a milagrosa gruta. Quem visita a França vai a Lourdes. Quem vai ao Caraça visita a Gruta do Irmão José e nela, como Bernadete, a feliz visionada, reza, senão com a vela acesa de cera entre os dedos, ao menos com a chama do amor no coração”. 


Padre Pedro Sarneel, C.M. Guia Sentimental do Caraça, 1953

Gruta Nossa Senhora de Loudes - frança - 10min.
Fontes:
 http://www.santuariodocaraca.com.br/peregrinacao/santuario.php
 Santuário do Caraça - MG - (31) 3837-2698
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