segunda-feira, 1 de junho de 2015

O QUE É O HOMEM?





Jaime Vaz 
- O que Darwin diria ao homem contemporâneo?
55 min.

O que é o homem?

O problema mais importante da Antropologia filosófica surge ao perguntarmos: o que é o homem? O que constitui sua essência? O que o diferencia dos outros seres? Esta problemática surge basicamente a partir de três fatores: o homem é capaz de observar os fenômenos que o envolvem; sente-se ameaçado de extinção por alguns destes fenômenos; questiona-se sobre o aparente absurdo do própria existência.

Então, o que é o homem? Uma primeira resposta está implícita no próprio ato de perguntar. O homem é o único ser capaz de fazer perguntas. Todos os demais seres não se colocam este problema. Estão submetidos às leis e fenômenos e não tem a capacidade de se perguntar por sua essência ou pelas razões de sua existência.

O homem pergunta pelo seu próprio ser. Quer compreender e ter consciência de si. Mas identifica também sua incapacidade de se compreender de modo total. Seu conhecimento sobre si é limitado e parcial. No entanto está inquieto, deve expor para si mesmo as razões de seu existir.

O que é o homem? Esta pergunta reclama uma resposta nunca totalmente esgotada. É uma interrogação que não cessa enquanto existe a capacidade de pensar. Na história identificamos inúmeras respostas dadas a ela, com variados enfoques e métodos. Destas investigações acerca do ser do homem surgiu a Antropologia Filosófica.

A Antropologia filosófica de certo modo engloba as demais ciências na compreensão do ser humano. Isto no sentido de que se serve dos conteúdos por elas oferecidos, relacionando-os com seus próprios dados. Identifica alguns problemas já de saída: como afirmar a essência do homem? Os dados científicos (empírico-objetivos) são capazes de dar conta da essência do homem?

Segundo Coreth uma antropologia científica não é capaz de colher a totalidade do homem. As diversas ciências (medicina, psicologia, biologia, sociologia etc) são capazes de fornecer dados, mas nunca de esgotar os interrogativos apresentados pela Antropologia Filosófica. Isto se dá também com a própria história da evolução “suas investigações podem ser sumamente ilustrativas, porém, filosoficamente seria ingênuo tomá-las como base de uma antropologia” (CORETH, 1985, p. 35). Ainda que compartilhe geneticamente com o homem sua composição biológica, um símio, por mais que seja evoluído, não é ser humano.

A Antropologia se pergunta pelo que é o homem com um objetivo: para que o mesmo possa chegar a desenvolver-se plenamente na concepção e na construção de sua existência. Do contrário, fica-se sujeito a situações que menosprezam sua dignidade. É o que acontece, por exemplo, na tendência de algumas pessoas de se pautar pela conduta animal para tentar se explicar. Ou ainda de compreender o que são os outros animais a partir de características humanas (inteligência, conhecimento, vontade). Ou seja, tanto é problema entender-se somente a partir da animalidade, quanto o é projetar-se nos animais as características que lhe são próprias.

A pergunta sobre a essência e a existência do homem tem algo de próprio: conhecer sua origem. Ele se percebe como uma unidade individual em relação com uma totalidade. Então, como demonstrar a totalidade do ser humano a partir desta relação? Este é um dos interrogativos que orientam o percurso da Antropologia Filosófica.

O homem identifica em si uma pluralidade de dimensões que se harmonizam em uma unidade. É um ser constituído das dimensões física, psíquica e transcendente (espiritual). Esta última constitui-se no suporte para as outras. Tal compreensão do ser humano foi sendo construída ao longo da história do pensamento ocidental. Através da dimensão transcendental o homem reflete sobre seu ser ontológico. Experimenta-se como um ser no mundo (fenomênico), mas que está voltado para algo que o transcende. Não pode se compreender unicamente a partir do mundo experimentado por ele. O mundo não constitui o horizonte último do homem, mas aponta para algo além dele. O homem só se entende quando em relação com o Ser Absoluto. Esta relação orienta seus valores, suas decisões, a sua dignidade e a compreensão da dignidade de cada ser humano. “Uma Antropologia Filosófica é, por conseguinte, antropologia metafísica” (1985, p. 42).

O pensamento filosófico pretende encontrar respostas ao problema do ser do homem. Em seus momentos mais significativos a história da filosofia o comprova. Tanto o período clássico grego, como a filosofia medieval, quanto a moderna e contemporânea estão imbuídas deste problema filosófico: o que é o homem?

Desde a busca pelo arché de todas as coisas, passando pela sofística, indo adiante com a escolástica, o iluminismo e os demais sistemas filosóficos enfrentam esta questão. A filosofia clássica se apóia numa metafísica que pretende ser objetiva para explicar a origem do mundo. Os pré-socráticos, também conhecidos como filósofos da phisis ao colocar a questão da origem de todas as coisas não fazem outra coisa que responder ao anseio humano por conhecer e situar-se neste mundo.

Os sofistas, ainda que pautados pelo ceticismo em relação à verdade, tem por referência o homem, “medida de todas as coisas”. Sócrates, Platão e Aristóteles, os mais importantes filósofos do período clássico, cada um à sua medida, desenvolvem o problema não só da origem, mas da constituição do ser humano. Especialmente a noção e a relação dos princípios alma e corpo. Quanto a essa questão, Platão propõe um dualismo quanto à origem de cada um destes princípios (fato que influenciará toda a primeira metade da Idade Média a partir do pensamento de Santo Agostinho). Aristóteles diverge de seu mestre sobre a constituição do ser humano, propondo uma unidade entre corpo e alma, ou seja, estes dois princípios (material e formal) são intrínsecos ao ser do homem, não podendo ser separados. Este pensamento será depois retomado por Santo Tomás de Aquino, influenciando toda a última parte da Idade Média, com a Escolástica.

A modernidade, retoma coloca o homem no centro da atenção, mas como sujeito e não de modo objetivo, como a escolástica medieval. O homem não é mais uma unidade em relação à totalidade objetiva que o envolve. O precursor desta nova mentalidade é Descartes. Seu pensamento retoma e desenvolve o dualismo platônico a um nível muito mais elevado. Propõe um racionalismo que divide de modo irreconciliável espírito e matéria. A base desse pensamento é um racionalismo subordinado ao espiritual. Reduz o ser humano unicamente a um ser pensante. Isso dará suporte para que se desenvolva, no início do pensamento contemporâneo o idealismo hegeliano.

Por outro lado, também na modernidade desponta outra vertente de pensamento que influencia a discussão sobre o ser humano: é o empirismo inglês, cujos principais representantes são John Locke e David Hume. Para esta visão, tudo o que existe é a matéria e o homem não poderia ser analisado por outra perspectiva. Aqui existe uma sobrevalorização das ciências empíricas. Criam-se as bases para o evolucionismo. O homem passa a ser objeto de análise considerado não em sua totalidade, mas apenas em sua dimensão material.

Resumindo, “a ruptura da unidade do homem em Descartes inicia também uma ruptura na Idade Média entre um pensamento espiritual e idealista e outro material e mecanicista” (1985, p. 58).

Immanuel Kant tenta superar esta oposição entre racionalismo e empirismo, propondo o conceito de transcendental. Apenas a razão pura se constitui condição de possibilidade para se chegar ao conhecimento do ser do homem em sua plenitude. Um grande avanço para a Antropologia Filosófica é a forma como propõe as perguntas: que posso saber? Que devo fazer? Que posso esperar? Que é o homem? À primeira responde a metafísica; à segunda, a moral; à terceira, a religião e à última, a antropologia.

A questão antropológica de fundo permanece movendo a busca pelo conhecimento da essência do homem. Sendo este talvez, o problema filosófico por excelência, muito há que se percorrer nesta busca. De todo modo, qualquer sistema filosófico incorre em erro quando deixa de considerar qualquer uma das dimensões essenciais do ser humano: física, psíquica e espiritual.

Referência:

CORETH, Emerich.



Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.

 Sejam abençoados todos os seres.

Nenhum comentário: