terça-feira, 28 de julho de 2015

A BURGUESIA E SUAS VIRTUDES - FRAGMENTOS INCONCLUSIVOS




Slavoj  Zizek - De Hegel a Marx e de volta a Hegel
Audio em Portugês - 98 min.


KARL MARX E FRIEDRICH ENGELS 
SOBRE O DIREITO E O ESTADO, OS JURISTAS E A JUSTIÇA

A Pena de Morte 
– O Panfleto do Sr. Cobden 
– Resoluções do Banco da Inglaterra


O mundo desde Caim não melhorou e nem foi intimidado por meio de punições: o criminoso é um mero objeto, i.e. apenas o escravo da Justiça.

A Pena nada é senão um meio de Defesa da Sociedade contra a violação de suas condições de vida, porém, que tipo de sociedade é essa que não conhece nenhum instrumento melhor de defesa do que o Carrasco Judiciário,o qual, por um lado, elimina criminosos, apenas para novamente criar, por outro lado, espaço para novos criminosos?

Não são tanto as instituições políticas, mas sim muito mais as condições fundamentais da Sociedade Burguesa Moderna que produzem um número médio de crimes, em um dado setor nacional da sociedade.



“Em minha opinião, existem certos métodos gerais que são aplicáveis a todas as esferas da vida e da atividade criativa. As pessoas falam, por exemplo, sobre lógica jurídica. Na realidade, trata-se aí de lógica humana, aplicada às questões jurídicas. ...

Para ser um bom soldado artilheiro – e, particularmente, para ser um soldado artilheiro competente – é necessário que se tenha freqüentado uma academia de artilharia, porém, para desempenhar um papel dirigente na formação de um exército,não é  necessário  que se tenha tido nenhuma educação especial como artilheiro ou de qualquer outro gênero: há de se possuir apenas certas qualidades políticas e administrativas.”
                                                                                                          León Trotsky




O CRIME DE RASKÓLNIKOV - FRAGMENTOS INCONCLUSIVOS
Cesar Augusto de Oliveira Casella


LIBERDADE, IGUALDADE, FRATERNIDADE. Para Eric Hobsbawm se a economia do século XIX foi constituída principalmente sob a influência da revolução industrial britânica, sua política e ideologia foram constituídas fundamentalmente pela Revolução Francesa. É a revolução que dá o escopo para a ascensão da burguesia, é um marco inicial do nosso mundo burguês. É a revolução, também, que funda um imaginário próprio e nos legou códigos legais e morais, uma política liberal e nacionalista, uma certa organização técnica e científica, que vai se espalhar pelo mundo todo, geografica e temporalmente. Dentre as muitas classificações possíveis para a Revolução Francesa, com certeza uma é a de movimento que fundou a modernidade.

SOB OS OLHOS DE BAUDELAIRE. "A Modernidade é o transitório, o efêmero, o contingente, é a metade da arte, sendo a outra metade o eterno e o imutável".

LITERATURA ROMÂNTICA. Para Ginsburg o romantismo tenta divisar o indivíduo dentro de seu habitat sócio-histórico, o que, de certa forma, levaria até a sociologia moderna a ter as suas raízes imersas no movimento romântico. Esta individualização romântica, esta particularização do homem dentro do quadro da sociedade, esta busca pelo fenômeno singular que caracteriza o romantismo (singularização que pode se estender até o conceito de grotesco, vide Vitor Hugo), são processos que estão intimamente ligados e inseridos a um conceito de História como curso de tempo onde nada se repete, onde cada fato é novo, matizado, diferenciado, característico. Um conceito da importância do dia a dia do homem, do seu cotidiano, e talvez o que se configure como a sua 'realidade'. Estes conceitos de História são fundamentais para se entender o século XIX.

O HERÓI DE NOSSO TEMPO. Hobsbawm o descreve como um homem que era inquestionavelmente muito brilhante, versátil, inteligente e imaginativo, embora o poder o tivesse tornado sórdido. Como um general para o qual não houve igual. Como um governante que foi um planejador, um chefe e executivo soberbamente eficiente e um intelectual suficientemente completo para entender e supervisionar o que seus subordinados faziam. Como um indivíduo que parece ter sempre irradiado um senso de grandeza. A Revolução Francesa nos legou também um mito, um mito heróico, um herói burguês que antecipa em muitos aspectos o capitalista ferrenho, o competidor feroz que sempre vence. A Revolução Francesa nos legou Napoleão Bonaparte.

LITERATURA SOCIALISTA. O Manifesto Comunista tem muitos pontos de contato com a literatura produzida no século XIX. A própria ascensão da burguesia após a Revolução Francesa, fato histórico que será a linha matriz que formará as idéias e os ideais literários, e na seqüência os sociais, do século XIX, parece ser a causa fundamental da necessidade de um Manifesto Comunista, da necessidade de se expressar diante do incômodo com um estado de coisas estabelecido. E ao mesmo tempo, este incômodo, este estado de coisas desfavorável, vai ser força motriz da grande literatura produzida no período.

NAPOLEÃO BONAPARTE. Napoleão é o homem que ascendeu a todo custo e às suas próprias custas. Foi o homem comum que deteve o poder de imperador, e um poder maior do que o dos seus antecessores aristocráticos. Hobsbawm descreve que o poder em parte foi atirado sobre os seus ombros e em parte foi agarrado por ele quando as invasões estrangeiras de 1799 revelaram a fraqueza do Diretório e sua própria indispensabilidade. Em poucos anos, a França tinha um Código Civil , uma concordata com a Igreja e até mesmo o mais significativo símbolo da estabilidade burguesa – um Banco Nacional. E o mundo tinha o seu primeiro mito secular. Napoleão foi o homem que não precisou discutir suas intenções. Foi o homem que não precisou declarar os seus crimes.

PARADOXALISTA POLIFÔNICO. Dostoiévski é apresentado por Freud em seu famoso texto sobre o parricídio como um homem multifacetado, distinguindo-se na rica personalidade do autor quatro facetas: o artista criador, o moralista, o pecador e o neurótico. Paulo Bezerra escreve em seu prefácio à Crime e Castigo que Dostoievski foi, acima de tudo, um riquíssimo e complexo produto de sua época, um homem que viveu intensamente a dúvida e a elevou à condição de categoria estética. Um homem dividido entre a sede de crer e a força de argumentos contrários que levam a descrença, sem, no entanto, negar nenhuma das duas vertentes.

TUDO O QUE É SOLIDO SE DESMANCHA NO AR. A burguesia desmanchou os vínculos entre os homens e seus superiores naturais, deixando restar apenas as ligações do interesse pessoal e do pagamento em dinheiro. A burguesia afogou o fervor religioso e o entusiasmo cavalheiresco nas águas geladas do calculismo egoísta. A burguesia converteu mérito pessoal em valor de troca. A burguesia substituiu a exploração velada das ilusões religiosas e políticas, pela exploração aberta, impudente, direta e brutal. A burguesia desmanchou a honra e a admiração reverente das ocupações nobres, e converteu o médico, o advogado, o padre, o poeta, o cientista, em seus operários assalariados. A burguesia desmanchou na família os laços sentimentais e reduziu as relações familiares a uma mera relação de dinheiro e sustento. Todas as relações firmes, sólidas, com sua série de preconceitos e opiniões antigas e veneráveis foram varridas, todas as novas tornaram-se antiquadas antes que pudessem ossificar. Tudo o que é sólido derrete-se no ar, tudo o que é sagrado é profanado e os homens são por fim compelidos a enfrentar de modo sensato suas condições reais de vida e suas relações com seus semelhantes.

UM DIÁLOGO. Voz sob o solo: "Sou um homem doente... Um homem mau. Um homem desagradável. Creio que sofro do fígado." Voz sobre o solo: "Não é que fosse medroso e apagado, antes bem o contrario; mas fazia algum tempo que vivia num estado irritadiço e tenso, parecido com hipocondria."

FORTUNA CRÍTICA. Dostoiévski é um autor que, de certa perspectiva crítica, deixa extravasar sua elaboração inconsciente, sua criatividade, no feitio consciente, deliberado, de sua obra. Mas, como descreve Augusto Meyer, vai tão longe em Dostoiévski o ímpeto da criação inconsciente, que o seu mundo psicológico apresenta uma originalidade indisfarçável, em confronto com o dos outros grandes romancistas do século XIX. Então, fica claro, não se trata de um grande autor romântico típico. A diferença assustadora em Dostoiévski está em deixar que as contradições, os desencontros, as perturbações, aflorem de modo límpido, reconhecíveis. Está em trazer para a tona o outro lado da consciência, em revelar a complexidade terrível de nosso mundo interior. A diferença assustadora em Dostoiévski é que, na sua literatura, tudo o que estava escondido se solidifica no ar.

PREFACIADOR DA MODERNIDADE. Boris Schnaiderman escreve em seu prefácio à Memórias do Subsolo que a subjetividade agressiva e torturada do narrador-personagem, do homem do subsolo, o seu discurso alucinado e sua veemência desordenada, o fluxo contínuo de sua voz, de sua fala sempre transbordante, pode ser ouvida por detrás da obra de muitos escritores da modernidade. Paulo Bezerra explica em seu prefácio à Crime e Castigo que o discurso dostoievskiano nem sempre prima pela fluência, pela elegância, que sua constituição depende do clima da narração, de seus vazios, reentrâncias e saliências, elementos facilmente identificáveis com os conceitos que regem a ideologia da modernidade.

SOB OS OLHOS DE BAUDELAIRE. "Tudo quanto é belo e nobre é o resultado da razão e do cálculo. O crime, cujo gosto o animal humano hauriu no ventre da mãe, é originalmente natural. A virtude, ao contrário, é artificial, sobrenatural , já que foram necessários, em todas as épocas e em todas as nações, deuses e profetas para ensiná-la à humanidade animalizada, e que o homem, por si só, teria sido incapaz de descobrir. O mal é praticado sem esforço, naturalmente, por fatalidade; o bem é sempre o produto de uma arte".

NOTA DO SUBSOLO. "E de onde concluíram todos esses sabichões que o homem precisa de não sei que vontade normal, virtuosa? Como foi que imaginaram que ele, obrigatoriamente, precisa de uma vontade sensata, vantajosa? O homem precisa unicamente de uma vontade independente, custe o que custar essa independência e leve aonde levar. Bem, o diabo sabe o que é essa vontade..."

UM HOMEM DESAGRADÁVEL. O homem do subsolo de Dostoiévski é o Adão da modernidade. É um homem angustiado, enjaulado em um mundo idiota e idiotizante, em um mundo fragmentado e desordenado e que não permite perspectivas. É um homem perturbado mentalmente e que tem de se haver com seu interior medíocre e insensato, reflexo talvez de um mundo exterior medíocre e insensato. É o homem moderno já em todas as suas instâncias, um homem psicológico, psicopático, psicótico, fraco, desiludido, desesperado, inútil. O homem que absurdamente range os dentes para os ferros vistosos da grade do tédio que cerca sua alma. O homem que quer e não pode mais ser belo e altivo, que quer e não pode mais sair de si.

LEMBRANÇA DE UM ARTIGO. Quando Porfiri e Raskólnikov têm o seu primeiro diálogo, vem a tona o artigo que este último escreveu sobre o crime. Já de início o investigador o tenta por na parede, lembrando-o que no referido artigo, Raskólnikov insistia que o ato de execução de um crime sempre é acompanhado de uma doença.

SOB OS OLHOS DE BAUDELAIRE. "Veremos que a natureza não ensina nada, ou quase nada, que ela obriga o homem a dormir, a beber, a comer e a defender-se, bem ou mal, contra as hostilidades da atmosfera. É ela, igualmente, que leva o homem a matar seu semelhante, a devorá-lo, a seqüestrá-lo e a torturá-lo."

SÃO PETERSBURGO. "Na rua fazia um calor terrível e, para completar, o abafamento, o aperto, cal por toda parte, madeira, tijolo, poeira, e aquele peculiar mau cheiro de verão tão conhecido de cada petersburguense sem condição de alugar uma casa de campo – tudo aquilo afetou de modo súbito e desagradável os já abalados nervos do jovem."

RANGER DE DENTES. Para o homem do subterrâneo, o homem do subsolo, vasculhar o seu interior não significa contemplação, meditação, estudo do individual, reconhecimento e desenvolvimento. Interiorizar-se, para ele é um movimento reflexo, provocado pelo tédio de tudo, principalmente pelo ódio. Ódio do mundo inteiro, que ele quer suprimir, desintegrar. Lutando contra o racionalismo, destilando amargura e escárnio contra as almas idealistas.

NOTA DO SUBSOLO. "Já foi dito: o homem se vinga porque acredita que é justo. Quer dizer que ele encontrou a causa primeira, o fundamento: a justiça. Isto é, como ele está tranqüilizado por todos os lados, vinga-se calmamente e com êxito, convicto de que pratica uma ação honesta e justa. Mas eu não vejo nisso justiça nem qualquer espécie de virtude; se começar a vingar-me, será unicamente por maldade."

OUTRO DIÁLOGO. Voz sob o solo: "Admitamos que eu seja um tagarela, um tagarela inofensivo, magoado, como todos nós. Mas que fazer, se a destinação única e direta de todo homem inteligente é apenas a tagarelice, uma intencional transferência do oco para o vazio?". Voz sobre o solo: "Pensando bem, eu ando falando pelos cotovelos. É por não fazer nada que falo pelos cotovelos. Ou pode ser assim também: eu falo pelos cotovelos porque não faço nada. Foi neste último mês que aprendi a matraquear, varando dias e noites deitado num canto pensando... na morte da bezerra."

INDIVÍDUOS ORDINÁRIOS E INDIVÍDUOS EXTRAORDINÁRIOS. Ainda discutindo o artigo de Raskólnikov, Porfiri manobra habilmente, dizendo que toda a questão do artigo consiste em que todos os indivíduos estariam divididos em ordinários e extraordinários. Simplificando visivelmente o raciocínio de Raskólnikov, Porfiri diz que ele teria escrito que os ordinários deveriam viver na obediência e não teriam o direito de infringir a lei, unicamente por eles serem ordinários. Já os extraordinários têm o direito de cometer toda a sorte de crimes e infringir a lei de todas as maneiras precisamente por serem extraordinários.

DÚVIDAS QUE AFLORARAM. "Será que tu pensas que eu fui para lá como um imbecil, de modo irrefletido? Eu fui como um homem inteligente, e foi isso mesmo que me pôs tudo a perder! Será que tu pensas que eu não sabia ao menos, por exemplo, que, se já havia começado a me perguntar e me interrogar – tenho ou não o direito de ter poder? – é que eu, então, não tinha o direito de ter poder? Ou se eu me fazia a pergunta: o homem é um piolho? – é que, portanto, o homem não era um piolho para mim mas era um piolho para aquele a quem isso não entra na cabeça e vai em frente sem fazer perguntas... E se eu passei tantos dias sofrendo por saber: Napoleão o faria ou não? – então eu já percebia claramente que não sou Napoleão..."

DOIS E DOIS. Voz sob o solo: "Dois e dois são quatro constitui, a meu ver, simplesmente uma impertinência."

O LIMIAR. Paulo Bezerra escreve na introdução à Crime e Castigo que um dos componentes centrais da composição em Dostoiévski é o limite, que Bakhtin chama de limiar. Esse limite é um muro de pedras, podendo ser entendido como as leis da natureza, ou as conclusões das ciências naturais, ou a matemática, ou o racionalismo. De certo é que há um limite ao homem, e cabe-lhe parar diante desse limite e igualar-se ao resto da manada ou ultrapassá-lo, ainda que á custa de terríveis sacrifícios.

COMO DE UM COPO DERRUBADO. "Então ele bateu duas vezes com toda a força, sempre com as costas do machado e nas têmporas. O sangue jorrou, como de um copo derrubado, e o corpo caiu de costas."



A burguesia e suas virtudes cardinais; o estado e seus pecados capitais

por Lew Rockwell, 

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Atualmente, quase ninguém mais fala sobre as tábuas das virtudes e dos vícios, dentre os quais estão os sete pecados capitais.  Porém, ao analisarmos ambos — virtudes e vícios —, encontramos um perfeito sumário dos fundamentos da ética burguesa e uma sólida crítica moral ao estado moderno.

É verdade que os libertários muito raramente falam sobre virtudes e vícios, principalmente porque nós concordamos com o filósofo Lysander Spooner: vícios não são crimes, e a lei deveria cuidar apenas destes últimos.  Ao mesmo tempo, é extremamente necessário observarmos como vícios e virtudes — bem como nossa concepção sobre o que constitui uma cultura e um comportamento adequados — possuem uma forte relação com a ascensão e o declínio da liberdade em nosso mundo atual.

Permitam-me um simples, porém intrigante exemplo.  Há alguns anos, um palestrante em uma conferência realizada pelo Mises Institute estava explicando como algumas questões como assistencialismo, caridade e amparo aos pobres poderiam ser realizadas por meios voluntários — isto é, pela filantropia.  Sua explicação foi brilhante, só que, ao final, alguém levantou a mão.

Um aluno da Índia tinha uma pergunta.  E se — perguntou ele — uma pessoa vive em uma sociedade em que a religião diz que a condição de um indivíduo é ditada por Deus, e que, sendo assim, seria um pecado tentar modificá-la?  Os pobres, segundo essa visão, supostamente devem continuar sendo pobres, e ajudá-los seria uma violação dos desígnios de Deus.  Com efeito, uma pessoa caridosa estaria cometendo um crime contra Deus.

O palestrante ficou ali parado, em estupefato silêncio.  Todos os outros presentes olharam boquiabertos para o autor da pergunta.  Todos nós ficamos perplexos ao sermos confrontados com uma realidade que é frequentemente por nós ignorada: a ética que fortalece a nossa cultura, algo que muitas vezes tomamos como um fato consumado, é essencial para o funcionamento daquilo que chamamos de "boa sociedade", baseada na dignidade do indivíduo, bem como para a possibilidade do progresso, da liberdade e da prosperidade.

E uma economia produtiva, baseada no livre mercado e sustentada por um forte senso de responsabilidade individual e por um compromisso moral para com o respeito aos direitos de propriedade, é justamente o arranjo que pode permitir progresso, liberdade e prosperidade.  No entanto, esse arranjo possui um grande inimigo: o estado intervencionista.  É ele quem tributa, regulamenta e inflaciona a quantidade de dinheiro na economia, distorcendo desta forma um sistema que caso contrário iria funcionar harmoniosamente, produtivamente e para o grande benefício de todos, gerando riqueza, segurança e paz, e criando as condições necessárias para o florescimento de tudo aquilo que chamamos de civilização.


O nome que Karl Marx deu a esse sistema foi 'capitalismo', 
pois ele acreditava que o livre mercado era o sistema que fortalecia
 e dava plenos poderes aos proprietários do capital — a burguesia 
— em detrimento dos trabalhadores e camponeses da classe proletária.
O nome 'capitalismo' é um tanto capcioso porque a livre iniciativa não é, de fato, um sistema econômico organizado para beneficiar unicamente as classes detentoras do capital.  Ainda assim, os defensores do livre mercado não se mostram desconfortáveis em utilizar o termo capitalismo precisamente porque a propriedade do capital e sua acumulação é de fato a força-motriz que impulsiona o funcionamento de um produtivo livre mercado.  Como explicou Mises, o capitalismo serve aos interesses materiais e ao proveito próprio de todas as pessoas, inclusive os não-capitalistas — os proletários.  Em uma sociedade capitalista, os meios de produção em mãos privadas servem exclusivamente ao mercado.  Quem se beneficia fisicamente das fábricas e indústrias são todas aquelas pessoas que compram seus produtos.  Em conjunto com os incentivos gerados pelo sistema de lucros e prejuízos, bem como toda a liberdade de concorrência que tal sistema implica, a existência da propriedade privada dos meios de produção garante uma sempre crescente oferta de bens e serviços para todos.

Portanto, embora esse sistema funcione não apenas para o benefício dos capitalistas, é certamente verdade que a propriedade privada dos meios de produção, bem como a criação dessa classe de cidadãos empreendedores, é algo crucial para que todos nós desfrutemos todas as glórias de uma economia produtiva.

Em conjunto com a criação desta classe vem também a formação daquilo que se convencionou chamar de 'ética burguesa' — um termo utilizado sarcasticamente para escarnecer o comportamento habitual da classe empreendedorial.  Marxistas empedernidos ainda utilizam essa frase como se ela descrevesse a classe exploradora.  Mais comumente, ela é utilizada por intelectuais para identificar um tipo de comportamento monótono e previsível que, na concepção deles, não mostra um devido respeito por coisas vanguardistas e progressistas.

Normalmente ela é utilizada para descrever aquelas pessoas que possuem afeições à sua comunidade (ou à pequena cidade em que nasceu), à religião e à família, e que se mostram um tanto avessas a modismos e comportamentos progressistas que ultrapassam as normas culturais comumente aceitas.  Porém, aqueles que utilizam esse termo pejorativamente não costumam ser gratos ao fato de que foi justamente a ética burguesa quem tornou possível o estilo de vida de todas as classes, inclusive da classe intelectual.

A burguesia, na acepção original do termo, sempre foi formada por uma classe de poupadores, de pessoas que honravam suas palavras e respeitavam seus contratos, de pessoas que tinham uma profunda ligação à família.  Essa classe de pessoas se importava mais com o bem-estar de seus filhos, com o trabalho e com a produtividade do que com o lazer e o deleite pessoal.

As virtudes da burguesia são as tradicionais virtudes da prudência, da justiça, da temperança e da fortaleza (ou força).  Cada uma delas possui um componente econômico — vários componentes econômicos, na verdade.

A prudência dá sustento à instituição da poupança, ao desejo de adquirir uma boa educação para se preparar para o futuro, e à esperança de poder legar uma herança aos nossos filhos.

Com a justiça vem o desejo de honrar os contratos, de dizer a verdade nos negócios e de fornecer uma compensação para aqueles que foram injuriados.

Com a temperança vem o desejo de se controlar e se restringir a si próprio, de trabalhar antes de folgar, o que mostra que a prosperidade e a liberdade são, em última instância, sustentadas por uma disciplina interna.

Com a fortaleza vem a coragem e o impulso empreendedorial de se deixar de lado o temor desmedido e de seguir adiante quando confrontado pelas incertezas da vida. 

Essas virtudes são os fundamentos tradicionais da burguesia, bem como a base das grandes civilizações.

Porém, a imagem invertida destas virtudes mostra como o modo virtuoso do comportamento humano encontra seu oposto nas políticas públicas empregadas pelo estado moderno.  O estado se posiciona diretamente contra a ética burguesa, sobrepujando-a e fazendo com que seu declínio permita ao estado se expandir em detrimento tanto da liberdade quanto da virtude.

Na tradição religiosa ocidental, os sete pecados capitais não são os únicos pecados que existem.  Eles são chamados de capitais porque, no ensinamento tradicional, eles resultam na morte espiritual.  Analisemos cada um deles.

Vaidade (ou soberba)
Também chamada de orgulho, ou, mais exatamente, de um excessivo e desproporcional orgulho por si próprio.  Sabemos o que significa uma pessoa ser excessivamente vaidosa ou orgulhosa.  Significa que ela coloca seus interesses antes dos de todos os outros, mesmo que, ao fazer isso, prejudique a todos.  Trata-se da superestimação de uma pessoa por si própria e da importância de que é obter seus interesses e "direitos" à custa de todos.

Na esfera pública, podemos pensar nos vários grupos organizados que acreditam piamente que suas demandas e interesses são mais importantes que os de todo o resto da população.  Com efeito, esse traço de soberba caracteriza perfeitamente essa pavorosa moda de se sair exigindo todos os tipos de novos "direitos".  Temos, por exemplo, lobistas que se julgam genuínos representantes de todas as várias categorias sexuais, raciais e de deficientes, e que se acham por isso no pleno direito de violar a propriedade e a liberdade de todos para o seu próprio benefício.  Eles estão plenamente convictos, por causa de sua própria vaidade, de que têm o direito de ter privilégios especiais em detrimento dos genuínos direitos de todo o resto.  O estado de direito e sua aplicação igualitária para todos se torna assim completamente distorcido pelas demandas de alguns poucos contra a ampla maioria.

Esse dificilmente é o caminho para uma paz social de longo prazo.  Considere a questão da discriminação (racial, sexual, religiosa, de gênero ou de inaptidão física) no emprego.  Por que uma pessoa iria querer trabalhar para um empregador que realmente não quer contratá-la?  Em um mercado competitivo, empregadores têm a liberdade de discriminar, mas os custos dessa prática serão arcados totalmente por eles, pois seu sucesso ou fracasso dependem totalmente do julgamento dos consumidores.

Como empregadores estão em constante concorrência entre si, todos podem encontrar um lugar para si próprio dentro dessa vasta rede que é a divisão do trabalho.  O orgulho que leva ao curto-circuito desse processo não é do interesse de longo prazo da sociedade.

O mesmo raciocínio é válido quando ampliado para o conceito de nações.  Não há nada de errado em se ter um orgulho natural e normal de seu país.  Porém, ser arrogante e sobrestimar os méritos de um determinado país pode gerar péssimos efeitos econômicos.  Dentre estes temos o protecionismo, o mercantilismo e o nacionalismo, o que gera beligerância nas relações internacionais.

Se, por exemplo, os cidadãos de um país estão plenamente convencidos de que os produtos fabricados dentro de suas fronteiras são bons (pois "foram feitos por nós!"), então qual o motivo de se querer punir qualquer estrangeiro que tente nos vender seus produtos?  Isso é arrogância, presunção, orgulho, soberba, vaidade.  Além disso, ao se adotar este protecionismo, estamos nos prejudicando a nós próprios, pois estamos nos obrigando a pagar preços mais altos por produtos de menor qualidade — algo especialmente cruel para os mais pobres.

Trata-se de um arranjo insustentável no longo prazo.  Qualquer indústria que seja protegida da concorrência se torna cada vez menos eficiente.  O país que adota esse tipo de mercantilismo pode chegar ao extremo de levar à total ineficiência todo o seu parque industrial, suprimindo novas linhas de produção que seriam eficientes caso operassem sob concorrência e tivessem acesso a maquinário importado a custo baixo.

Por fim, a vaidade na arena pública pode resultar em uma total abolição da inteligência crítica.  Ao se repetidamente afirmar que se vive em um país maravilhoso e grandioso, questões genuinamente importantes como tributação, protecionismo e políticas regulamentais, e seus consequentes efeitos sobre a liberdade das pessoas, passam a ser ignoradas por todos, pois absorveu-se a ideia de que criticar o governo e suas medidas é algo antipatriótico, e que quem o faz está sendo contra o próprio país e contra todos que ali vivem.

Ira
A civilização ocidental, ao longo de 2000 anos, considerou a ira como um vício grave, pois leva à destruição em vez da paz e da produtividade.  Daí surgiu a instituição dos tribunais no âmbito doméstico e da diplomacia no âmbito internacional.

Porém, dentro de nossos próprios países, o tabu contra a ira já desapareceu por completo nas questões públicas, e as medidas raivosas do estado são tratadas com absoluta normalidade pela grande maioria da população.  Pessoas que não pagam de impostos aquela quantidade que o próprio estado estipulou ser a correta são publicamente perseguidas, execradas, encarceradas e ameaçadas de morte, e suas propriedades são confiscadas e furiosamente redistribuídas a terceiros — ou ficam para os próprios membros da burocracia.

[Veja esse ultrajante vídeo em que a polícia federal furiosamente destrói um avião carregado de produtos "perigosos" (notebooks, equipamentos de vigilância eletrônica e uma bicicleta).  O crime?  Tais produtos não pagaram aquela 'taxa de importação' que o estado estipulou ser a correta.  Os empreendedores, que estavam simplesmente atendendo às demandas pacíficas de seus consumidores, são tratados como "bandidos", "uma quadrilha".  Observe também o comentário escrito pelo autor do vídeo e o regozijo da imprensa.]

Essa institucionalização da fúria estatal contra os súditos que não cumprem sua "obrigação" de sustentá-la — bem como a entusiasmada aceitação dessa postura estatal por boa parte da população — possui consequências culturais devastadoras.  Não apenas estimula a inveja (que será analisada abaixo), como também institucionaliza um método legal para canalizar toda a ira gerada pela inveja.

Quando o governo se enfurece contra uma determinada classe de indivíduos "insolentes" que não aceitam acatar todos os seus ditames, ele despeja toda a sua ira sobre eles, e sempre com o apoio das classes bem pensantes.  Qual a lição que o resto da população tira de tudo isso?  Tremo só de pensar.

Inveja
Trata-se de uma palavra que raramente se ouve hoje em dia.  Inveja não é a mesma coisa que ciúme.  O ciúme é meramente um desejo de usufruir a mesma propriedade e status de uma outra pessoa.  Já a inveja significa o desejo de se prejudicar alguém unicamente porque esse alguém possui alguma qualidade, virtude ou bem que você não tem.  É o desejo de destruir o sucesso ou a felicidade de outra pessoa.

No mundo atual, vemos reiteradas cantilenas raivosas contra os ricos, seguidas de irados apelos para que o governo aumente a tributação sobre eles, confiscando assim boa parte daquilo que conseguiram por mérito próprio e por meio de seu esforço pessoal.  Isso nada mais é do que a inveja dos incapazes sendo despejada sobre aquelas pessoas que eles, os invejosos, no íntimo sabem serem melhores do que eles próprios.  E as políticas assistencialistas e redistributivistas nada mais são do que a inveja em ação.

Algumas pessoas até mesmo dizem que o que realmente importa nas políticas de redistribuição de renda não é o estado ajudar os pobres mas sim prejudicar os ricos.  O mesmo raciocínio se aplica para o imposto sobre a herança, o qual arrecada relativamente muito pouco, mas faz um enorme estrago sobre pretensas dinastias familiares.

Quantos discursos feitos por políticos contra empresas, contra os ricos e contra a classe empreendedorial você já ouviu?  Quantos deles são guiados puramente por esse pecado capital?  Certamente quase todos.  Além do confisco direto da renda, políticas antitruste que visam a destruir um determinado empreendimento simplesmente porque ele se tornou grande e bem sucedido também são resultado da inveja.

Intelectuais mais honestos costumam dizer que não há nada de errado com a inveja, pois, como eles corretamente concluem, a inveja fornece as bases para boa parte das modernas políticas públicas...

Ainda assim, trata-se de um pecado capital.  E um com o potencial de destruir toda uma sociedade caso sua expansão não seja completamente contida.  E em nenhum outro lugar ele é mais implacavelmente difundido e generalizado do que dentro da cultura do próprio estado, que condena de todas as formas o sucesso empreendedorial e pessoal, e abomina o mérito e o esforço próprio.

Cem anos atrás, várias dinastias possuíam mais riqueza à sua disposição do que o governo federal.  Será que algum estado moderno toleraria tal disparate?  Muito duvidoso.  De acordo com a mentalidade que hoje nos domina, toda riqueza que não pertença ao estado está necessariamente à disposição de todos, podendo ser confiscada sob demanda.  Principalmente a riqueza das famílias ricas.

Avareza
O semelhante pecado de cobiçar aquilo que pertence a outra pessoa, querendo se apropriar daquilo através de qualquer meio possível, também é algo socialmente pernicioso.  Por meio da tributação e da redistribuição, o estado está efetivamente abençoando o pecado da avareza.

No entanto, convém deixar algo bem claro.  Cobiçar algo não é o mesmo que um inocente desejo de melhorar a própria condição de vida.  Este último representa um bom impulso, algo que motiva as pessoas a serem bem sucedidas na vida.  A avareza é diferente porque ela não dá a mínima para os meios que serão utilizados para se alcançar os objetivos estabelecidos.

Em vez de trocas produtivas, a avareza recorre ao roubo — seja o roubo feito individualmente, seja o roubo público que utiliza o governo.  Vemos a avareza, por exemplo, em todas as políticas governamentais que visam a socorrer pessoas cujos investimentos ou empreendimentos deram errado, e as quais clamam para que o governo intervenha para lhes socorrer.  Vemos também no caso de funcionários públicos que exigem, sempre por meios chantagistas, que o governo aumente seus proventos. 

Nesses casos, o desejo por dinheiro sobrepuja todas as considerações morais a respeito de como exatamente esse dinheiro deve ser adquirido.  E quanto mais o estado aquiesce, isto é, quando mais o estado cede e alimenta o pecado da avareza, mais as pessoas se tornam avarentas, e mais a ética burguesa cai em desuso.

O estado moderno não é capaz de nada sem a sua avareza.  Ele mantém seu olhar vigilante constantemente fixado em nossas liberdades, em nossa privacidade, em nossa riqueza e em nossa independência, desejando suprimir todas elas utilizando qualquer meio possível.  Sob o estado avarento, a liberdade está em constante declínio, a fatia da riqueza sujeita à tributação está sempre aumentando, e a capacidade de indivíduos e instituições prosperarem fora da alçada das bênçãos do governo é cada vez mais ínfima.

Gula
Costumamos pensar em gula como algo relacionado unicamente ao ato de comer.  Porém, gula também significa um desejo excessivo por conforto, luxo, magnificência e ócio, tudo em detrimento do trabalho e da produtividade.  Funcionários públicos, por exemplo, quando exigem que o governo espolie a população para lhes fornecer uma vida confortável, principalmente por meio de aposentadorias nababescas, estão incorrendo no pecado da gula.

O mesmo pode ser dito também para grupos de interesse de idosos, quando estes demandam aumentos em seus pagamentos previdenciários.  Como a previdência nada mais é do que um fraudulento esquema de pirâmide, não há nenhum dinheiro que foi ali guardado e investido apenas para, futuramente, ser devolvido com valores corrigidos aos depositantes originais.  Todo o dinheiro hoje direcionado para a previdência social é imediatamente gasto pelo governo.  Logo, quando aposentados exigem aumentos em suas aposentadorias, eles estão na realidade querendo melhorar suas vidas à custa da atual geração de trabalhadores, cujas contribuições previdenciárias teriam de ser elevadas.  Eis aí outro exemplo do pecado capital da gula.

E ele não se restringe aos idosos e aos funcionários públicos.  Trata-se de um fenômeno também entre aqueles pobres que foram condicionados pelo estado assistencialista a crer que têm o direito de viver bem sem a necessidade de ganhar dinheiro por conta própria.  Curiosamente, em vários países, as taxas de obesidade entre os pobres superam em muito as da burguesia.

A difusão da gulodice também aparece nos crescentes níveis de endividamento das pessoas em todo o mundo.  Tal comportamento implica o desejo de se consumir hoje sem qualquer consideração para com as consequências futuras.  O consumidor glutão não se importa em nada com o longo prazo; só se importa em saciar seu apetite hoje.

E quem estimula esse comportamento imprudente e estouvado, esse pecado capital, é justamente o banco central por meio de suas políticas de expansão monetária, de manipulação dos juros e de socorro a instituições em dificuldade, o que cria a ilusão de que não há aspectos negativos em se viver pensando apenas no presente à custa do futuro.  A inflação monetária estimula o gasto e desestimula a poupança, pois faz com que o dinheiro perca continuamente poder de compra.  A inflação institucionaliza o pecado da gula e o faz parecer algo racional.

Para um exemplo final, basta uma visita às instalações governamentais — de preferência, na capital do seu país — para ver intermináveis ostentações de gulodice: gula por dinheiro, por bens e por poder.  Do ponto de vista do estado, ele nunca possui uma quantidade suficiente de poder, de dinheiro e de bens.  Ele só faz comer, tornando-se cada vez mais gordo.  E se você apontar para este fato, será rotulado de extremista e depois será devidamente escarnecido.  

Preguiça
A história de como o estado assistencialista criou uma classe de pessoas preguiçosas é antiga, e raramente contestada.  A promessa de algo em troca de nada, e tudo à custa de terceiros, corrompeu não apenas os pobres, mas também os mais velhos e principalmente os jovens estudantes recém-graduados, especialmente aqueles entre 18 e 25 anos.

Entre os mais velhos, é patético ver como uma classe de pessoas preparadas, que deveria estar na vanguarda da sociedade com sua sabedoria e experiência, liderando-a rumo aos mais altos ideais, se tornou meramente uma classe de desocupados.  A coisa se torna ainda mais moralmente degradante quando os "velhos" em questão são funcionários públicos que tiveram aposentadorias precoces e privilegiadas, e se tornaram uma classe de meros viajantes, sustentados com dinheiro de impostos e com tempo de sobra em mãos.  Sejamos bem claros (e isso é válido para todos os tipos de aposentados): em uma sociedade livre, não existe algo como um 'direito à aposentadoria', e muito menos um direito a uma aposentadoria confortável.  Esse conceito foi inventado apenas no New Deal.  Antes dessa época, a preguiça era algo que deveria ser comprada com dinheiro próprio.  Hoje, qualquer um pode desfrutar dela por meio das tributações do estado.

Quanto aos jovens estudantes, nosso sistema educacional (público e privado), totalmente gerido pelos burocratas do Ministério da Educação, os socializou e os condicionou a acreditar que, quanto mais credenciais e títulos uma pessoa tem, mais ela tem o direito de exigir da sociedade alguma recompensa em troca da benção que é para o mundo a sua mera existência.  Pergunte a qualquer empreendedor sério hoje que queira contratar alguém.  Ele lhe dirá que é extremamente raro encontrar algum jovem que entenda que o emprego não é uma homenagem concedida, mas sim um arranjo voluntário em que o trabalho é ofertado em troca de um salário.  Quanto maior o nível de socialização do sistema educacional de um país, mais difundido é essa mentalidade do "direito adquirido".

O subsídio da preguiça cria um círculo vicioso.  Quanto mais o estado recompensa o ato de não trabalhar, menos as pessoas se dão ao trabalho de adquirir meios financeiros e pessoais para serem independentes do estado.  Os indolentes são naturalmente propensos a desenvolver dependências, que é exatamente aquilo que o estado quer e é exatamente aquilo de que ele gosta.

Enquanto isso, considere a indolência do próprio estado.  Não existe classe mais avessa ao risco do que a classe burocrática.  Fazer com que burocratas trabalhem é o mesmo que fazer com que porcos gordos disputem uma corrida.

Há alguns anos, um burocrata federal nos enviou um artigo, no qual ele se recusou a escrever seu nome verdadeiro.  Ele dizia:

O que leva as pessoas a trabalharem para o governo?  O que as mantém lá por toda a vida?  É simples: compensações excessivas, enormes benefícios e ótimas condições de trabalho.  É atraente para entrar e praticamente impossível de se querer sair...  O que eu perderia se saísse do governo?  Pra começar, uma semana de trabalho curta já estaria fora de qualquer perspectiva... Atualmente, posso gastar 17,4% do meu horário de trabalho em férias.  São doze semanas por ano, eternamente... Eu também poderia dar adeus aos "benefícios" extra-oficiais: por exemplo, todos os dias faço uma corridinha leve de uma hora, seguida de um banho prolongado e um almoço calmo e tranquilo.  Isso me mantém em ótima forma para usufruir minhas constantes férias.  E visitas a algum shopping durante minha hora de trabalho são sempre possíveis (pois ninguém é de ferro).  Stress?  Não tem como.  Se relaxamento prolongasse a longevidade, burocratas viveriam até os 150 anos de idade.

Entretanto, nessa área específica, talvez devêssemos ser agradecidos.  A única coisa pior do que um estado indolente é um estado energizado que acorda cedo todos os dias ávido para confiscar nossas liberdades.

Luxúria
Este pecado é normalmente visto como sendo apenas um problema pessoal.  Porém, vemos todo o seu potencial de destruição presente em qualquer política governamental que não considere a família como o alicerce da sociedade burguesa.  No atual cenário político, age-se como se a família fosse algo dispensável, quando na realidade ela é o baluarte essencial entre o indivíduo e o estado.

Economistas atentos como Ludwig von Mises e Joseph Schumpeter observaram que a família é o campo de preparo para a ética do capitalismo.  É com a família que aprendemos que o roubo é algo perverso, que respeitar a propriedade alheia é algo essencial e moralmente correto, que poupar e fazer planos para o futuro é indispensável para o sucesso e que manter a nossa palavra é uma atitude respeitável.

Não é nenhuma coincidência que os marxistas desde sempre tenham tentado esmagar a instituição da família e reduzir toda a sociedade a indivíduos atomísticos incapazes de se proverem a si próprios — e que, por isso, inevitavelmente teriam de acorrer ao estado, em vez de aos pais e à família, suplicando por ajuda.

Estes são os sete pecados capitais, e em cada exemplo — e de centenas de maneiras distintas que não mencionei aqui — as políticas governamentais estimulam esses pecados à custa da ética burguesa, que é a ética de um livre mercado, de uma sociedade produtiva, pacífica e blindada contra poderes arbitrários.

Por que atualmente pouco ouvimos falar dos sete pecados capitais?  Talvez porque nenhuma instituição é mais gulosa, avarenta, vaidosa e raivosa do que o próprio estado.  No setor privado, as instituições criadas pelo próprio mercado corrigem esses abusos ao longo do tempo.  No estado, como não há nenhum mecanismo de mercado para testar e coibir comportamentos antiéticos, esses pecados capitais prosperam violentamente.

Não estou de modo algum sem esperanças quanto ao futuro da burguesia.  Se houvesse um real perigo de que essa classe pudesse ser destruída, décadas de políticas estatais criadas justamente para aniquilá-la já teriam alcançado seu objetivo a esta altura.

Mesmo assim, não podemos nos tornar complacentes.  Da mesma maneira que várias batalhas políticas são reduzidas a um conflito entre culturas, raças, gêneros e sexualidade, a melhor maneira de oferecer resistência ao estado é vivendo e praticando a ética burguesa em nossos lares, comunidades e empreendimentos.

Relembremos constantemente, portanto, as quatro grandes virtudes burguesas da prudência, da justiça, da temperança e da fortaleza; e, ao praticá-las, façamos nossa parte para construir a liberdade e a prosperidade, ainda em nossa era.  Que jamais tomemos esses alicerces culturais da nossa civilização como um fato consumado e corriqueiro.




Fontes:
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http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1176
http://www.scientific-socialism.de/KMFEDireitoCAP41Port.htm
http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/c00002.htm
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres. 
Sejam abençoados todos os seres.

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