quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

A DECADÊNCIA DA ÉTICA


Osvaldo Giacóia Jr.
O impacto de Nietzsche no século XX - 50 min.



Decadência da Ética

Analisando-se a situação socioespiritual do planeta na atualidade, não há como negar-se a presença da destrutiva onda de pessimismo e utilitarismo que domina as criaturas humanas em toda parte.

Apoiados no niilismo, embora os comportamentos rotulados de religiosos de alguns dos seus segmentos sociais, o cinismo das pessoas e a decadência da ética dão-nos a dimensão do desespero que avassala as mentes e os corações atormentados.

Em consequência, a violência e o despautério, a drogadição e o erotismo substituem as aspirações de enobrecimento dos seres, como mecanismos escapistas para preencher o vazio existencial e o desencanto que se apossaram do século XX, que se desenhava com perspectivas iluministas, libertadoras, ricas de anseios de felicidade e de beleza.

A amargura toma conta dos indivíduos que se sentem coisificados, enquanto a revolta arma as multidões desvairadas que se levantam contra os abusos do poder, as injustiças sociais, os desregramentos dos dominadores, a desonestidade dos legisladores que perderam o respeito moral, a liberdade e o direito de viver com o mínimo de honestidade que seja...

Pode-se afirmar que a aparente calma que ainda paira sobre algumas nações não esconde os paióis de explosivos prestes a deflagrar o estouro prenunciador das tragédias que produz.

Não se trata, porém, de uma ocorrência inesperada, quando se observam as suas raízes plantadas no fim do século XVIII, por ocasião da Revolução Francesa, quando a tirania substituiu os ideais dos filósofos da liberdade, instaurando os dias do terror.

Em desesperada tentativa de manter a ordem na França, Robespierre, chamado “ o incorruptível”, que lutara pelos ideais da fraternidade, da liberdade e da igualdade, não teve forças morais para resistir às pressões do desespero das massas e de outros pensadores mantendo a guilhotina a funcionar sem trégua, ao ponto de tornar-se ultrajante ditador e sanguinário. Vítima de um golpe dos seus adversários da Convenção, foi preso e também guilhotinado.

Nesse período difícil, a morte de Deus foi anunciada, e a revolta retirou os vestígios da Sua presença no país, inclusive mudando os nomes de ruas, boulevards e praças que os tivessem de santos ou denominações religiosas, assim como os objetivos de culto das igrejas, tentando apagar a lembrança da fé e da crença espiritual no território francês.

Logo depois, com o retorno de Deus através da Concordata de 1802, firmada por Napoleão Bonaparte com o Vaticano, permaneceram os ódios e resquícios do período de revolta e de perseguições inclementes, dando lugar a um amortecimento ético dos sentimentos.

O Iluminismo em declínio favoreceu o Positivismo em ascensão, enquanto as ideias pessimistas e destrutivas de Arthur Schopenhauer espalhavam-se por toda parte, proclamando a desnecessidade de Deus e de qualquer formulação religiosa no comportamento humano.

À medida que o materialismo tomava conta da cultura, a amargura doentia de Friedrich Nietzsche passou a comandar as mentes e os corações desesperados no ceticismo científico das Academias, que asseverava ser a alma uma sudorese cerebral que desaparecia com a morte do encéfalo. Nessa paisagem de morbidez e desencanto, o ateísmo tornou-se a diretriz comportamental dos indivíduos, que logo depois se atiraram à guerra perversa de 1869-1870, que ressurgiu entre 1914-1918 e retornou calamitosa entre 1939-1945, com as mais inacreditáveis cargas de ódio e destruição de que a História tem notícias.

Muito contribuíram para essa tragédia as ideias do super homem do referido Nietzsche e o pensamento de Heidegger, que muito influenciou o surgimento do nazismo, partido ao qual ele se filiou por algum tempo, embora rompendo depois, quando da perseguição aos professores judeus da Universidade de Freiburg, onde era reitor...

A ética do mais forte substituiu a dos direitos humanos e da dignidade, em face da aristocracia do poder totalitário e insano de alguns governantes...

Heidegger influenciou filosoficamente Jean-Paul Sartre com o seu pensamento sobre o ser, servindo de inspiração para o existencialismo e total desinteresse pelos valores ético morais que conduziram a civilização ao largo dos séculos.

Viver agora e fruir ao máximo, não poucas vezes sem qualquer respeito pelos direitos dos outros, cultivar o prazer até a exaustão, passaram a ser os comportamentos aceitos e divulgados como recurso valioso para a preservação da vida e das experiências de alegria e de bem estar.

Lamentavelmente, as religiões ortodoxas, incapazes de oferecer resistência filosófica e ética aos absurdos da nova ordem por se manterem fiéis aos programas medievais totalmente ultrapassados, foram desprezadas e consideradas responsáveis pela miserabilidade do ser humano, pelos seus desaires, pelas suas amarguras.

Carregado pelas heranças teológicas do pecado e da culpa, o ser humano rompeu com as tradições enganosas e preferiu arrostar as consequências de sua liberdade, derrapando na libertinagem.

Sucede que, toda vez quando se arrebentam as algemas da escravidão de qualquer tipo, a ânsia de liberdade é tão grande que, por desconhecimento dos seus limites, aquele que a aspira tomba nos resvaladouros da irresponsabilidade, da agressividade aos direitos alheios, do abuso desrespeitoso...

Assim ocorrendo, desaparece a ética da conduta para apresentar-se o direito de exceções colocando-se o indivíduo acima da lei, da ordem e de qualquer restrição.

Os avanços da Ciência, demitizando algumas das informações e dogmas religiosos, os milgres de Jesus, que passaram a ser observados do ponto de vista das doutrinas psicológicas e parapsicológicas, reduziram a cultura ao materialismo, desde 1859, quando Charles Darwin, através do Evolucionismo, aplicou o golpe de misericórdia no mitológico Criacionismo bíblico, servindo de suporte para a vitalização do ateísmo...

A contribuição da Tecnologia, alargando e aproximando os espaços e as distâncias, facultando a demonstração dos postulados científicos através das experiências dos fatos, foi fundamental para a indiferença humana pelos códigos de dignidade e de valorização da própria vida.

O século XX, portanto, herdeiro da revolução filosófico científica do passado, rapidamente aceitou o novo comportamento que se consolidou durante a revolução hippieísta dos anos 60, quando se deram as grandes mudanças de conduta, e as tradições nobres como a família, o casamento, a dignidade, a ordem passaram a ser instituições ultrapassadas.

Irrompendo em avalancha avassaladora, tomou conta da juventude, que se sentia castrada pela intolerância e pelo poder dominador, passando a constituir um novo mundo, um modo diferente de vida...

O aborto, a eutanásia, o suicídio, a agressividade, passaram a ser éticos na linguagem nova, que iria culminar nos homens e mulheres bombas, nos atentados terroristas, no crime organizado, na violência urbana, no alcoolismo exacerbado, no tabagismo, na drogadição e no sexo destituído de qualquer sentido moral e afetivo.

Dando-se largas aos instintos primários, o nadaísmo, estimulando o erotismo, coisificou os seres humanos, que passaram a vender-se no mercado da luxúria sem qualquer pudor, sob o disfarce de experiências artísticas, desde que economicamente rentáveis.

Nesse comércio hediondo, em que pouquíssimos logram alcançar os patamares elevados, multidões de jovens inexperientes são devoradas pelas máfias que o administram, passando os tratores da indiferença sobre os corpos e as almas mutiladas daqueles que ficaram vencidos durante as tentativas iniciais.

Inevitavelmente, houve uma total decadência ética da cultura e da civilização, que passaram a adotar os novos deuses do prazer e do engodo, da utopia e da mentira, embora vivendo-se o vazio existencial que leva à depressão e ao suicídio.

Nada obstante, nesse ínterim, surgiu o Espiritismo em 1857, revitalizando a ética moral, baseada nas lições insuperáveis de Jesus, que foram corrompidas pelas ambições e conchavos humanos através dos séculos, desde o dia em que se uniram ao Império Romano, passando de perseguidas a perseguidoras.

Com a revelação dos imortais, a vida passou a ter sentido profundo e significado psicológico indiscutível como decorrência da proposta filosófica erguida pelos pilotis dos fatos demonstrativos da imortalidade da alma, da vida futura, da justiça divina e da Lei de Causa e Efeito, responsável por todos os fenômenos humanos.

A partir de então, embora lentamente, vem sendo restaurada a proposta do amor como sendo a fonte inexaurível para a felicidade, em razão dos seus conteúdos otimistas e realistas, que dignificam a espécie humana, proporcionando-lhe os necessários estímulos para desenvolver-se e atingir as culminâncias da iluminação pessoal.

A falência do novo comportamento niilista encontra-se em toda parte, porque a sua doutrina enganou os seus adoradores, conduzindo-os às aflições superlativas e às angústias dantes jamais vivenciadas.

Aturdidas, essas multidões decepcionadas e sem rumo buscam, mesmo sem o saber, retornar às origens do bem e da alegria, ao encontro da pureza de sentimentos e de convivência nobre, sentindo falta da fraternidade que deve sempre viger entre os seres humanos, sequiosos de paz e de esperança.

Ninguém pode viver em equilíbrio sem a bênção confortadora da esperança que abre perspectivas formosas para o futuro.

O Espiritismo, portanto, possuindo os paradigmas que foram deixados para trás pelo anarquismo e ceticismo, apresenta-os como propostas que levam à ética do dever e da harmonia, propiciando ventura.

A crença em Deus, a crença na imortalidade da alma, a crença na comunicabilidade dos Espíritos, a crença na reencarnação, a crença na pluralidade dos mundos habitados e as propostas ético morais de O Evangelho segundo o Espiritismo, que proporciona uma releitura das lições insuperáveis de Jesus, conforme as conhecemos em as narrativas dos evangelistas, são as novas diretrizes para a construção do ser humano feliz e da sociedade ditosa que todos aspiram.

Não há alternativa, exceto a coragem para superar a crise moral que domina praticamente toda a sociedade contemporânea, reflexionando e vivendo a vigorosa ética espírita, que resume as mais grandiosas formulações da ancestral diante das novas necessidades que tomam conta da sociedade.

Revigorada, a ética lentamente ressurge e passará a comandar os destinos humanos na direção da paz e da alegria de viver mediante o correto culto dos deveres.

Vianna de Carvalho

(Página psicografada pelo médium Divaldo Pereira Franco, em Boca Raton, Flórida, EUA, na manhã de 24 de junho de 2009, publicada em “Reformador” de setembro de 2009).

Palestra do Prof. José Paulo Neto
- Modernidade e Pós-Modernidade - 89 min.

Cultura Pré-Romântico: 
crítica ao Iluminismo e ideia de Decadência
(1750-1784).

Márcio Macedo Moreira
Universidade Federal da Paraíba - Graduando
José Ernesto Pimentel Filho (Orientador)
Universidade Federal da Paraíba - Professor Doutor

Resumo
 O pensamento racional formulou a ideia de civilização, o apogeu do homem
estava por vir pelo refinamento dos costumes e pela valorização da polidez. Para
os iluministas “as leis naturais” levariam o homem ao progresso, logo civilização e
progresso são conceitos inseparáveis. Ocorre que dentro do movimento
iluminismo denominado Ilustração se deu a crítica à ideia de progresso. Esta
crítica se iniciou com Jean-Jacques Rousseau, genebrino que a partir de suas
obras criticou a ideia de razão e formulou o pessimismo histórico do qual a
civilização estava desmoralizada, corrompida e desligada de suas vontades
naturais nobres. Rousseau abriu as portas para uma crítica mais forte para o
racionalismo iluminista que veio de uma Alemanha descrente de seus ideais
políticos e nacionais. 

O Sturn und Drang, movimento cultural e literário organizado
por jovens alemães da classe média criticou a corte prussiana de Frederico II e
formulou a ideia de kultur. Tanto em Rousseau como no Sturn und Drang se
origina o sentimentalismo romântico e dentro deste sentimentalismo o
pessimismo. A ideia de uma “civilização” decadente era evidente e já que a
solução era abstrata cabia aos poetas alemães e a Rousseau apenas
deslumbrar a decadência do homem. A metodologia usada para o trabalho foi
derivada da leitura de textos traduzidos das obras de Rousseau, Herder e Goethe
assim como teóricos da ideia de decadência tais como Le Goff e Harman. 

Este movimento que vai de 1750 com a publicação do Discurso sobre as Ciências e as
Artes de Rousseau até 1784 quando Herder termina de publicar Idéias para a
Filosofia da História da Humanidade montou as bases para o Romantismo,
movimento filosófico do século XIX que continua até os dias atuais. A ideia de
decadência da “civilização” ocidental esteve sempre presente nos debates
filosóficos e historiográficos, idéia esta lançada pelo movimento acima citado.
Palavras – chave: 1- Ideia de decadência 2- Pré-Romantismo 3- Iluminismo 2 

1.0 Apresentação
O século XVIII foi o século das luzes na França assim como na Alemanha
foi o século das brumas. A ideia de progresso e de uma ciência cartesiana
preponderava no pensamento francês. Objetividade e racionalismo diferenciavam
civilização e barbárie. No mesmo século XVIII o Iluminismo foi criticado em duas
frentes, de um lado Rousseau, com “uma reflexão sobre o homem e o homem
“natural” – historicidade da razão e das linguagens, história do homem, do
homem mau. O amor de si que se desvia em amor próprio, pela razão” (Ituassu,
2002, p.184). Do outro lado, na Alemanha, a critica vem do movimento conhecido
como Sturn und Drang. Movimento de jovens alemães que buscavam uma
identidade nacional ao criticar a corte alemã. Entre estes se destacaram Herder, o
jovem Goethe e Schiller.

 No embate historiográfico a crítica ao Iluminismo tanto em Rousseau
quanto no Sturn und Drang estava centrado no pessimismo histórico relativo a
ideia de decadência. Certamente Rousseau e o Sturn und Drang não
concordavam em todos os pontos relativos ao processo civilizador que será
explicado adiante.

 Rousseau e o Sturn und Drang trazem uma nova maneira de pensar a
idéia de progresso, esta linguagem agora está na decadência. Razão, costumes
civilizatórios, urbanidade entre outras características do Iluminismo serão
duramente criticados.

Foi a partir de Rousseau que o progresso Iluminista passou a ser criticado,
ainda que o próprio Rousseau fosse um Iluminista. Rousseau influenciou o Sturn
und Drang nos aspectos relativos a volta ao estado de natureza e ao
subjetivismo. Este período dos anais da crítica ao Iluminismo é conhecido como
pré-romantismo.

 Entre a critica de Rousseau e a do Sturn und Drang há uma diferença
fundamental exposta por Norbert Elias:
A despeito de todo o radicalismo de sua critica social, porém,
Rousseau não chegou a forjar um contraconceito inclusivo e
unificado contra o qual lançar as críticas acumuladas. (...)
Enquanto os membros da intelligentsia alemã de classe média
(...) forjam conceitos que divergem frontalmente dos modelos da
classe alta.(...) À parte alguns estranhos, como Rousseau, não
opõem ideais e modelos dessa ordem. As palavras “falsa
civilização” contêm tudo o que a diferencia do modelo alemão.3

Os escritores franceses sugerem 
que a falsa civilização deve ser substituída pela autentica. 
( ELIAS,1994, p.55)

Elias em seu clássico O processo civilizador (1939), expõe no volume 1 a
construção da ideia de civilização tanto na França quanto na Alemanha. Para ele
é a estrutura da construção do Estado que diverge o conceito de Zivilisation na
França contra o conceito de Kultur na Alemanha. A França constrói o conceito de
civilização e o leva até a corte alemã, a sociedade perfeita é uma sociedade
“civilizada” com etiquetas e costumes nobres. Frederico II é o maior exemplo de
como a corte alemã estava carregado de pensadores franceses entre eles
Voltaire do qual foi de estima amizade para com o rei da Prússia. Da crise de
identidade da corte e de uma Alemanha esfacelada territorialmente surge uma
classe média desesperançada e pessimista.

Enquanto a Inglaterra já realizou sua revolução política e na
França se trava a luta ideológica da qual a realeza sairá vencida,
a Alemanha esgotada pela guerra dos Trinta Anos, ainda não
passa de um conglomerado de Estados que só tem em comum a
língua. Os príncipes, mais preocupados em manter os seus
privilégios do quem em assegurar o bem-estar de seus povos,
são solidários das aristocracias estrangeiras que eles se
esforçam por macaquear. (AUTRUSSEAU, 1982, p.109)

 O Sturn und Drang buscava uma mudança política na Alemanha, mas
como não encontrava brecha para se expressar, para criticar o projeto civilizador
francês, utilizavam a literatura para tal processo. A única maneira de combater a
zivilisation era impondo o projeto de kultur. Foi na busca desta cultura, que hoje
podemos chamar de cultura popular o que Herder, sob a influencia dos irmãos
Grimm, valorizou as raízes alemã e moldou uma História Cultural alemã. A
decadência para os alemães estava na extrema sensibilidade, “no amor de si”
com características ambíguas em Herder e Goethe. No discurso de kultur esta
guardada a decadência da zivilization.

 Rousseau é um “estranho” na França até certo ponto. Seu objetivo não é
adotar a kultur, como salvação pra o projeto civilizador, mas é criticar vertentes
iluministas que adotam os costumes bizarros das artes e das ciências como
estado perfeito da civilização. Rousseau critica a civilização do progresso e busca
uma civilização perfeita, contratualista e de plena liberdade para seus cidadãos.
 Exposta as contradições entre Rousseau e o Sturn und Drang para não
nos iludir, as duas vertentes de pensamento tem um ponto em comum de grande
importância para a História e para a Filosofia: a origem do Romantismo.

Pessimismo, irracionalismo e ilusão são palavras-chave usadas contra a
“verdade” burguesa de progresso e civilização expostos no Iluminismo, são
palavras românticas que desembocam na linguagem da decadência.

2.0 O Pessimismo rousseauniano  
Rousseau, Herder e Goethe olhavam a natureza, as origens do homem, como estado de paz e de vigor. A civilização representada pela urbanidade foi originada pela desgraça do mundo, pelo homem corrompido.
 A partir de agora observaremos como estes pensadores viam a natureza como refúgio
 para o espírito humano.

 Rousseau busca conhecer o homem em seu estado mais natural e em
seguida expõe como este homem foi corrompido. Duas obras são importantes
para tal levantamento: Discurso sobre as Ciências e as Artes (1750) e Discurso
sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens (1754/55). A
desigualdade para Rousseau não decorria da natureza, pois no estado de
natureza o homem era livre e feliz, ao viver de acordo com a sua conservação,
“os únicos bens que conhece no universo são a alimentação, uma fêmea e o
repouso; os únicos maus que teme, a dor e a fome” (ROUSSEAU, 1988, p.48.) 

progresso levou este “noble savage” ao enfraquecimento. Na primeira parte do
livro sobre a desigualdade entre os homens, Rousseau descreve como o homem
em seu estado selvagem é forte e veloz e como este homem ficou fraco e lento
com o progresso civilizador. A origem da desgraça humana Rousseau descreve
quase sempre nas aberturas de seus principais livros. No inicio do livro II sobre a
Origem das Desigualdades Rousseau expõe:

O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que,
tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer isto é meu e
encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo.
Quantos crimes, guerras, assassínios, misérias e horrores não
poupariam ao gênero humano aquele que, arrancando as
estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado a seus
semelhantes: “defendei-vos de ouvir esse impostor: estareis
perdidos se esquecerdes que os frutos são de todos e que a terra
não pertence a ninguém!”(Rousseau, 1988, p. 63)

A propriedade privada levou o homem a decadência, propriedade esta tão
louvada por Locke e outros iluministas. Além desta citação á outras de grande
importância:

Tudo esta bem quando sai das mãos do autor das coisas, tudo
degenera entre as mãos do homem. Ele força uma terra a
alimentar as produções de outra, uma arvore a carregar os frutos
de outra. Mistura e confunde os climas, os elementos, as
estações. Mutila o seu cão, seu cavalo, seu escravo. Perturba
tudo, desfigura tudo, ama a deformidade e os monstros. Não quer
nada da maneira como a natureza o fez, nem mesmo o homem; é
preciso que seja domado por ele, como um cavalo adestrado; é
preciso apará-lo a sua maneira, como uma árvore de seu jardim.
(ROUSSEAU, 2004, p.7)

 No Contrato Social (1757), Rousseau expõe no capítulo I, “O homem
nasce livre, e por toda a parte encontra-se a ferros. O que se crê senhor dos
demais, não deixa de ser mais escravo do que eles”. É sobre esta ótica
pessimista do homem civilizado que Rousseau critica e inaugura a profetização
da decadência do homem. O progresso civil trouxe para o homem o
aprisionamento ao submeter o homem ao trabalho e à miséria. A direção que
Rousseau toma para a História não ficou clara. No Contrato Social e no Emílio
(1762) uma sociedade utópica é construída por Rousseau como solução para
resolver os problemas do homem. Ocorre que o próprio Rousseau não coloca a
mão no fogo por suas idéias. No caso da educação, uma das maneiras de
solucionar a decadência humana Rousseau escreve:

Mas terei dito que era fácil uma educação natural? Ó homens!
Será minha culpa se tornastes difícil tudo o que é bom? Percebo
estas dificuldades, concordo; talvez sejam insuperáveis, mas
também é verdade que nos esforçando para preveni-las,
prevenimo-las até certo ponto. Mostro o alvo que devemos
propor-nos; não digo que possamos alcançá-los, mas sim que
aquele que mais se aproximar dele será o mais bem sucedido.
(ROUSSEAU, 2004, p.99)

Só “até certo ponto” a sociedade utópica de Rousseau alcançaria seu
objetivo, mas que ponto é este? Deixo aqui a dúvida.
Rousseau foi o primeiro crítico do capitalismo e ao fazer esta crítica,
atingiu a sociedade mercantil e deu espaço para o liberalismo romântico
(HERMAN, 1997, p.38). Com o liberalismo romântico, a burguesia passou a
valorizar o estado democrático formado por uma nacionalidade, por uma
identidade linguística e cultural. Rousseau influenciou a política francesa
pós-revolução tal como Robespierre e Napoleão. No campo filosófico seu
pessimismo continuou tanto em liberais quanto em socialistas.

A crítica ao Iluminismo estava formada, a ideia de Nação francesa como
uma civilização verdadeira estava posta em campo. Enquanto isto na Alemanha
as nevoa só estavam aumentando enquanto as luzes ficavam ofuscadas, a
necessidade de uma Nação era maior do que na França. O Sturn und Drang
estava chegando para fazer uma crítica mais forte do que a crítica de Rousseau.
Era a Tempestade e Ímpeto sobre a literatura alemã que faria a crítica ao
Iluminismo. 6

3.0 Tormento e Ímpeto
O Sturn und Drang ultrapassou as fronteiras de Rousseau e negou a
existência de uma razão universal. A idéia de individuo, de uma nação “alemã”
veio à tona contra as coroas absolutistas. Para encontrar a “alma” alemã, os
jovens do Sturn und Drang foram buscar suas raízes na natureza. Esta busca
encontrou a Idade Média cheia de lendas e heróis. Ao mesmo tempo em que a
Alemanha buscava seu mito fundador, o sentimentalismo invadiu a classe média
burguesa desprivilegiada culturalmente. Para eles só no individualismo o
“homem” se conhecia e não através de uma Razão cortesã corrompida. A
burguesia alemã passou a viver de “Tormento e Ímpeto” , nome dado á uma peça
teatral de Maximilian Klinger em 1776, nome que em alemão significa “Sturn und
Drang”, dado ao movimento literário e cultural.

 A corte alemã para esses jovens poetas da classe média foi corrompida
pelo Iluminismo francês, daí surge a crítica ao Iluminismo e o pessimismo
histórico. Vale salientar que a briga no Sturn und Drang não estava no plano
político, pois eles não queriam uma Revolução política tal como ocorreu na
França. O que os alemães queriam eram valorizar seus próprios costumes, uma
identidade cultural e não um Iluminismo estrangeiro que levava a decadência. As
diferenças entre as idéias das classes sociais alemães são evidentes, tal como
mostra Norbert Elias:

Na Alemanha, igualmente, a burguesia torna-se mais prospera. O
rei da Prússia percebe este fato e diz a si mesmo que ele levara
ao despertar da arte e da ciência, a uma “feliz revolução”. A
burguesia porém, fala uma língua diferente da usada pelo rei. Os
ideais e gosto da juventude burguesa, seus modelos de conduta,
são quase o oposto dos seus.

Em Dichtung und Wahrheit (Poesia e Verdade), Livro 9 escreve
Goethe: “Em Estrasburgo, na fronteira francesa, libertamo-nos
imediatamente do espírito dos franceses. Descobrimos que seu
estilo de vida era regulamentado e aristocrático demais, fria a
sua poesia, destrutiva sua critica literária, e abstrusa e
insatisfatória sua filosofia.” (Elias, 1994, p.35)

 Contrario ao “progresso corrupto francês” evidenciado por Rousseau, os
alemães encaram o progresso tristemente.

 O inicio do Sturn und Drang ocorreu quando Herder ao viajar para Paris,
se apavorou com a moderna e civilizada urbanidade francesa, ao fugir da
pavorosa cidade, Herder se instalou em Estrasburgo onde conheceu Goethe, fato
ocorrido em 1769 (AUTRUSSEAU, 1974, p. 120). Herder e Goethe foram as
personalidades mais conhecidas do movimento. Percebe-se em suas obras um
homem ou uma nação sem esperança, característica de um ideal de decadência.7

 O Goethe mais conhecido da História da Literatura é o autor de Fausto,
este já mais erudito, mais recepcionado pela grande intelligentsia alemã, o
Goethe que tratamos neste artigo é o jovem, o romântico e sentimental que fugia
da urbanidade francesa. .Sua obra principal conhecida neste período é Os
sofrimentos do Jovem Werther (1775), Werther é um jovem que foge da
civilização e vai morar no campo, onde vive um extremo sentimentalismo que o
acaba levando ao suicídio. Werther via a decadência humana na própria “alma”:
A vida humana não passa de um sonho. A muita gente ocorreu
essa impressão que também me acompanha por toda a parte.

Quando vejo os limites que aprisionam as faculdades de ação e
pesquisa do homem, e como toda atividade visa apenas a
satisfazer nossas necessidades, que por sua vez não tem outro
objetivo senão prolongar nossa mísera existência; quando
verifico que toda a tranqüilidade em relação a certos pontos não
passa de uma resignação sonhadora, como um prisioneiro que
enfeitasse de figuras multicoloridas e luminosas perspectivas as
paredes da sua prisão... tudo, Wilhelm, me faz emudecer.

Concentro-me e encontro um mundo em mim mesmo! Mas,
também aí, é um mundo mais de pressentimentos e desejos
obscuros do que de imagens nítidas e forças vivas. Tudo flutua
vagamente em meus sentidos, e assim, sorrindo e sonhando,
prossigo na minha viagem pelo mundo. (GOETHE, 2006, p.18).
 Werther é o personagem que se enquadra no homo romanticus e
desemboca no homo hystericus, um homem sem saída, um homem no fim
(BRUSEKE, 2004, p.26). 

Assim como Rousseau, Goethe vê o progresso civilizador como uma “prisão” do qual a única maneira de alcançar a liberdade encontra-se no extremo eu e na natureza. Os costumes naturais em Rousseau tal como foi exposto no Emílio são os costumes do qual o Sturn und Drang tenta construir para salvar a Alemanha da decadência. Para os dois a natureza
humana é limitada, o homem esta cada vez perto de seu fim, pois este não pode
amar, sorrir e nem sonhar, a sociedade sucumbe perante uma gaiola de ferro
construída pelos Iluministas. É de bom grado repetir que este sentimentalismo
estava presente quando as Luzes atavam mais acessas do que nunca. Goethe
não viu escapatória para o jovem Werther, pois este teve que se matar para se
livrar deste mundo. Agonia de viver em uma realidade progressista e decadente,
a única salvação estava no individuo só este poderia resolver seus problemas (e
não o Estado). Fugindo da realidade o homo hystericus vive um mundo de
ilusões, uma ficção do qual o resultado é a morte.

A natureza humana – prossegui – é limitada: ela suporta a
alegria, a tristeza, a dor até certo ponto; se ultrapassar ira
sucumbir. (...) Nesse caso acho tão absurdo dizer que um homem
é covarde por haver dado cabo da própria vida, como seria
absurdo chamar de covarde o que esta morrendo de uma febre
maligna. (GOETHE, 2006, p.50) 8

Famoso livro, Os sofrimentos do Jovem Werther arrastou suicidas pelo
mundo durante os séculos XVIII e XIX como obra fundadora do Romantismo.
Ao discordar do Iluminismo, Herder não pensava a História como
cosmopolita, e sim como individualista e variável. Ele compara as nações a uma
planta, ela nasce, cresce, floresce e morre, cada nação tem sua característica,
sua kultur. O pessimismo histórico em Herder está em sua historicidade orgânica
das nações, perto do progresso esta a decadência. O Iluminismo revelava um
falso progresso tal como foi explicado em Rousseau e isto fica claro em Herder:
E ainda se com tudo isto algum progresso fosse visível? 

Mas onde se revela ele na História? Nesta só se vê por toda parte destruição, 
sem qualquer vislumbre de o que aparece de novo ser melhor do que foi destruído.
 Há nações que florescem e outras que declinam. (...) Triste destino o do gênero humano que, apesar de todos os seus esforços, se encontra preso à roda de Ixíon, agrilhoado
 à pedra de Sísifo, condenado a um suplício de Tântalo. (Herder, 2004, p-52)

Para Herder a humanidade estava fadada a um eterno retorno, sempre
que se atinge o ápice civilizatório, ocorria a decadência, dos escombros desta
decadência surgia uma nova nação, brotava dos restos de uma planta antiga,
assim se baseia a História. Este fardo era inevitável. Nota-se que Herder busca a
solução para a decadência ao fazer a sociedade retornar para suas origens, sua
infância, como descreveu Rousseau, o retorno à natureza. Este retorno para
Herder estava no desvendamento da Cultura Popular, daí a ligação entre Herder
e os irmãos Grimm: a busca das fábulas. A História é irreversível, a decadência
também, daí surgi o pessimismo de Herder. Com uma identidade cultural forte, a
nação alemã estaria mais saudável, a corte alemã era a doença da nação, sem
ela a Alemanha ficaria mais próspera e repudiaria a decadência.

A fuga em Herder era para os costumes formadores da nação alemã e
cada nação seria uma nação fechada. Este individualismo exagerado derrama no
nazismo orgulho e identidade de uma raça ariana. A Alemanha unificada seria
uma grande nação, uma nação melhor do que todas as outras e que ao estar em
progresso poderia levar outras nações a decadência. Herder foi um grande
pensador, sua ideia de nação fermentou a política romântica no século XIX. Toda
sociedade estava fadado à decadência, bastava ao “gênero humano” se
resguardar na sua cultura, nas suas origens.

Nem só de Goethe e Herder foi feito o Sturn und Drang. Para não ficarmos
neles mais dois exemplos serão mostrados: Hamann e Schiller.9

 Johann Georg Hamann (1730-1788) era mais um filósofo sem esperança,
a razão como em Goethe era para ele limitada, a angústia leva a interioridade e a
interioridade a decadência da alma.

A razão não descobri nada mais do que aquilo que Jô já havia
visto, a saber, a desventura do nascimento, a superioridade da
morte, a inutilidade e a insuficiência da vida humana, pois não
sabemos nada e sentimos em nós paixões e instintos cujas
razoes não compreendemos. (AUTRUSSEAU, 1982, p-117)

Para Hamann, faltava a sociedade entender o gênio que guia a
humanidade, a razão iluminista era insuficiente para entender isto, logo Hamann
via a decadência na própria alma, a decadência como algo imanente ao homem.
A crítica neste caso ia direto ao racionalismo que trazia a desesperança e não a
uma sociedade decadente em si. A razão transcendente levava a emoção
imanente. Friedrich von Schiller (1759-1805) foi outro exemplo de escritor
atormentado, ele abalou as estruturas absolutistas da Alemanha com sua obra.

Os salteadores, além de ser contra a cultura cortesã, Schiller criticava
arduamente os costumes iluministas e assim como os outros via a sociedade
européia atual como decadente. Seus personagens tinham caracteres
revolucionários como o Karl Moor que tinha como ultima opção incendiar uma
cidade para reverter um Estado inabalável. No livro Cabala e Amor o nobre
Ferdinando e a humilde Luísa se refugiam da sociedade cortesã e acabam
quebrando a estrutura social da época, um escândalo e ao mesmo tempo, uma
desesperança com a impossibilidade de mudança. Além de Hamann e Schiller,
maus conhecidos do Brasil, á outros autores do movimento tais como Klopstock,
Wieland e Lenz.

4.0 Conclusão
 O pensamento negativo ligava os pensadores que criticavam o
Iluminismo. Rousseau foi o profeta da negatividade, a ovelha negra da família
iluminista, o que limpou o terreno para o Sturn und Drang, aqui a critica foi mais
ferrenha. “A crítica” não é o resultado destes movimentos. A negatividade e o
pessimismo histórico, a História “desconstrutiva” nasce aqui, com a desconstrução  
da razão dos antigos e dos iluministas. A partir daqui a História corre para o seu fim, 
não escatológico, mas político seja democrático como foi posto em Fukuyama ou
 comunista tal como pregava Karl Marx. A partir do Romantismo duas vertentes da direção da História vieram a tona: o progresso e a decadência. Rousseau e o Sturn und Drang foram o percussores da doutrina de uma sociedade decadente, em seu estado final.

 Sobre a base da ideologia estão as revoluções. A Revolução burguesa foi
preparada para fins progressivos. Ocorre que a sociedade perfeita, “a vontade
geral” não foi uma realidade concreta. O pessimismo entre os descontentes fez
surgir uma escapatória para a direção da História. Esta direção marcou o
Romantismo, uma direção sem volta, a morte da alma e a morte da civilização.
No fundo era isto que Rousseau e o Sturn und Drang queria trazer de novo:
repensar a sociedade burguesa o que daria massa para uma nova pesquisa.


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Fontes:
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http://doutrinaespirita.com.br/?q=node/94
Sejam felizes todos os seres. 
Vivam em paz todos os seres. Sejam abençoados todos os seres.

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