I. BREVE INTRODUÇÃO Originário de uma família judia marrana [4] de origem portuguesa [L,C,M] – alguns afirmam ser apenas de uma « família judia » [K, B], ou ainda, « de família pobre [L, B], « de família distinta » [M], « de família distinta e gozava de abundantes meios econômicos » [C] –, filho da segunda esposa, Hana Débora d'Espinosa [F], de Michael de Espinosa [F], o jovem Baruch era dotado « por natureza, de uma inteligência fora do comum e de uma rápida capacidade de percepção » [C]. E, talvez por este motivo, tenha sido « membro da sociedade judia de estudos Ets Haym [5] » [VD/T], ainda que não tenha recebido lições nas classes superiores [VD/T], não passando do quarto ou quinto grau, de um total de seis graus [SN, p. 76], não tendo portanto, formação para rabino [SN, p. 90]. Seu pai, Michael, « era muito pobre para iniciar Spinoza no comércio, por isso quis que o filho aprendesse hebraico » [L] – ou como crêem alguns, « o pai queria fazer dele um comerciante, mas ele preferiu estudar [K]. Spinoza estudou primeiro Teologia e logo depois Filosofia [JJ, B, C] – ou ainda, Latim e logo depois Teologia [B, C]. Seus estudos de Latim foram na escola de Franciscus van den Endens [L], ou Frans van den Endens [C], instruído inicialmente por um estudante alemão [C], ou uma virgo douta [ K], ou por um médico [B], ou por um ex-jesuíta, Fr. Van den Endenn [St-H, F], e seu aprendizado só ocorreu « após as dificuldades com os judeus » [L, St.-H]. Para alguns, sua relação com van den Endens é a fonte principal de seu ateísmo [C]. Para outros, ele chegou às perguntas críticas por seu próprio engenho [L]. Clara Maria, a filha de van den Endens (a virgo douta) é a única referência a alguma espécie de relação amorosa de Spinoza [C] – alguns apenas fazem referência a ela, sem estabelecer qualquer ligação com Spinoza [St.-H]. Não é de se admirar a falta de referência a relações amorosas na vida de Spinoza, pois, muito cedo lhe foi diagnosticado um mal pulmonar [Ep] – tuberculose para alguns [JJ, C, St.-H], silicose para outros. Ora, o primeiro tratamento para qualquer mal nos pulmões no século XVII era a abstinência de qualquer forma de sexo, para não debilitar o paciente. Excomungado em 27 de julho de 1656 [F], Baruch, a partir de agora, só assinará suas cartas ou ocultando o nome com B., ou latinizando-o, como Benedictus. Os motivos que levaram a comunidade judaica de Amsterdã a excomungá-lo não são muito claros, pois, para alguns Spinoza « não foi acusado de blasfêmia, mas somente de desacato à Lei judaica » [L]; para outros, ele foi sim « acusado de blasfêmia » [C]; já os documentos referem-se a « heresias e más ações » [F]. O próprio texto do Herem foi apresentado erroneamente [C]. E esta confusão continua nos dias de hoje: Yovel, ao consultar um rabino sobre o Herem de Spinoza, para saber se « a excomunhão se destinava a vigorar apenas em vida de Spinoza ou também em gerações futuras, o rabi Herzog não se pronunciou, deixando a questão aberta a ulterior consideração. Mas a respeito da interdição das obras de Spinoza, o parecer do rabi foi claro: [...] um subterfúgio lingüístico permitiu ao grande rabi declarar não existir já uma interdição à leitura de Espinosa [6] ». A seguir, reproduzimos o texto original do Herem, datado de 6 de Ab de 5416 (27 de julho de 1656). Texto original do Herem “contra Baruch espinoza” – Livro dos Acordos da Nacám, A[n]o 5398-5440, p. 408 Após sua excomunhão, segundo alguns biógrafos, Spinoza escreveu uma « apologia em língua espanhola » [B, C] sobre os motivos que causaram sua saída, que apesar de não chegar a ser impressa [B, C, St.-H], não se perdeu inteiramente, pois grande parte dela encontra-se no Tratado Teológico-Político (TTP) [B, C]. Não só os motivos que levaram os judeus de Amsterdã a excomungar Spinoza são confusos, mas também a sua relação com a comunidade judaica após a excomunhão não está muito clara. Para alguns, « Spinoza cultivou o contato com os judeus depois da excomunhão » [K] ; para outros, « interrompeu o contato com os judeus » [C] ; para outros ainda, « depois da excomunhão, Spinoza somente se relacionou com judeus liberais e mais ou menos hereges » [IE], mas « professando a Lei de Moisés » [IE]. A relação dos judeus com Spinoza também permanece pouca clara, pois para alguns, « Os chefes judeus ofereceram a Spinoza uma soma anual de dinheiro [C, 1000 florins], sob a condição de que professaria externamente o judaísmo. » [B, C, St.-H, F]. Já para outros, a reação foi mais violenta: « À saída do teatro [C, « sinagoga portuguesa »], cometeu-se um atentado contra Spinoza » [B]. Segundo relato de seus hospedeiros, Spinoza guardou como lembrança deste ato a túnica furada pelo punhal do agressor [C]. Mas, para Yirmiyahu Yovel, este não foi um ato de perseguição ou foi perpetrado por um gentio, pois, para Yovel, Spinoza « não foi vítima de perseguição [7] » por parte dos judeus. Para outros, o rabino Morteira chegou mesmo a solicitar aos burgomestrres da cidade de Amsterdã uma ordem de expulsão de Spinoza da cidade [L], que foi ao encontro da intenção do próprio Spinoza de abandonar Amsterdã [L]. Outros ainda aventam a hipótese de que ele abandonou a cidade para que « molestassem menos seus amigos » [JJ, B]; ou por causa do atentado [C]. De Amsterdã, transladou-se para Ouwerkerk [C, M] ou a Rijnsburg [JJ, L, K, C, M]. De qualquer forma, em 1661 estava em Rijnsburg [Ep1], onde « permaneceu por dois anos » [L]. Postal russo – Século XIX Seja como for, Spinoza « abandonou Amsterdã para viver na província – Rijnsburg ou Voorburg » [B]. A casa em Rijnsburg « tinha uma pedra na qual estava gravada uma poesia que ajudava a identificá-la » [M]. Mas, « entre o dia 20 de abril e o dia 1º de maio de 1663 » [Ep12, Ep13] « se transladou a Voorburg » [JJ, K, C, M], passando aí « três a quatro anos » [C] onde « viveu na casa de Daniel Tydeman, na Kerkstraat » [M, Ep19], quando « ajudou Tydeman e outros a conseguir um pároco liberal » [F]. A seguir, « entre o dia 5 de setembro de 1669 e o dia 17 de fevereiro de 1671 » [Ep41, Ep44], Spinoza « translada-se para La Haya » [JJ, L, K, B, C, M], vivendo « inicialmente na tranqüila Veerkade, na casa da viúva do advogado Willem van der Werve [C, Van Velen; h, Van Velden) » [C]. « Logo se translada a Paviljoensgracht, vivendo na casa do pintor luterano Henderyck van der Spyck » [K, C, M]. E seu hospedeiro, « Van der Spyck era também solliciteur-militair (ou seja, tramitava para os outros solicitações em despachos oficiais) » [M]. Após sua exclusão do judaísmo, Spinoza passou a « polir lentes para microscópios e telescópios » [JJ, L, K, B, C, M, St.-H]. Para alguns, o fazia por « interesse científico » [L, K]; para outros, era para « alimentar-se » [C, M]; ou ainda, para as duas coisas [St.-H]. Além disso, ele também « pintava e desenhava » [K, C, M], chegando mesmo a « ministrar aulas de desenho » [C], ofício este « aprendido com o pintor Daniel Tydeman » [M]. É bastante conhecido o relato que nos faz um biógrafo de um autoretrato de Spinoza, no qual ele representa-se com o seu rosto no corpo do revolucionário napolitano Masaniello [C]. Em 1673, Spinoza « recebeu um convite de Condé » [L, B, C], « por meio de Stouppe, e viaja a Utrecht » [C]. Mas « não se encontra com ele » [C]; ou, « encontra-se com ele » [B]. E, « por causa desta viagem, quase é assassinado por uma multidão » [C]. É convidado pelo Eleitor Palatino a ocupar uma cadeira na Universidade de Heidelberg, mas recusou [JJ, L, K, B, C, Ep47, Ep48]. Spinoza está enfermo [JJ, L, K, B, C, St.-H]. A « enfermidade se agravou com o trabalho duro, pouco sono, etc. » [L, K]. Spinoza morre em 21 de fevereiro de 1677 [JJ, L, K, B, C]. Foi enterrado em La Nieuwe Kerke [C, F], em uma tumba número 162 [F]. Sua morte « foi doce e tranqüila, ao contrário de certos rumores [C], e ocorreu na presença de um médico de Amsterdã [K]; ou Lodewijk Meyer [C]. Este levou consigo como « recordação de Spinoza » [M], dinheiro e um punhal [C]. Antes de sua morte, Spinoza encarregou sua hospedeira de enviar a Rieuwertsz seus livros [K, C]. Os herdeiros impugnaram o testamento [C, F]. Antes de morrer, Spinoza também deu instruções para que sua Opera posthuma fosse impressa somente com as letras BDS como referência ao seu autor [JJ]. NOTAS: [1] Uma das fontes utilizada para nossa Introdução foi a Sinopse da vida de Spinoza segundo diversas fontes, de H. G. Hubbeling, em sua tradução espanhola (HUBBELING, H. G. Spinoza. Barcelona: Herder, p. 10-22, 1981). [2] MÉCHOULAN, Henry. Dinheiro & Liberdade - Amsterdam no Tempo de Spinoza. Tradução de Lucy Magalhães. Revisão técnica de Ronaldo Vainfas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, p. 9, 1992. [3] MÉCHOULAN, Henry, Op. Cit., p. 35. [4] Termo utilizado para designar os judeus (e seus descendentes) oriundos da Sefardia (Península Ibérica). Originalmente na Península Ibérica, este termo é uma injúria que atinge a todos os descendentes de judeus convertidos (MÉCHOULAN, Henry, Op. Cit., p. 132, Nota 24). [5] Segundo NS, Ets Haim foi “[...] inicialmente uma organização destinada, sobretudo, a atribuir bolsas e estudo. [...] No entanto, Ets Haym depressa começou a funcionar como um estabelecimento de ensino talmúdico para os estudantes mais velhos, responsável pela formação oficial dos rabinos. » (Op. Cit. , p. 74). [6] YOVEL, Yirmiyahu. Espinosa e outros hereges. Lisboa: Imprensa Nacional, v. 1, p. 205, 1993. [7] YOVEL, Yirmiyahu. Op. Cit., v. 1, p. 22. ABREVIATURAS: [B] – Pierre Bayle: autor do célebre Dicionário Histórico Crítico – Verbete Spinoza. [C] – Johannes Colerus: autor da quiçá mais célebre biografia de Spinoza. [F] – Documentos diversos citados por Hubbeling a partir da obra de Freudenthal, J. Lebensgeschichte Spinoza’s in Quelleschriften, Urkunden und Nichtamtlichen Nachrichten, Leipzig, 1899. [VD/T] – Documentos diversos citados por Hubbeling a partir da obra Vaz Dias, A. M. E Tak, W. G. Spinoza Mercator et Autodidactus. Oorkonden en andere authentieke documenten betreffende des wijsgeers jeugd en diens betrekkingen, met dertien fascimile’s, La Haya, 1932. [Epn] – As Cartas de Spinoza e de seus correspondentes (sendo n o número da carta, segundo a tradução de Atilano Domínguez, Correspondencia. Introducción, traducción, notas y índice de Atilano Domínguez. Madri: Alianza, 1988). [h] – A tradução francesa de Colerus. [L] – Jean Maximilien Lucas: autor de La Vie et l’esprit de Mr. Benoit de Spinoza. Talvez a segunda mais célebre biografia de Spinoza. [H] – Refere-se à biografia de Lucas (cf supra) publicada em livro, surgida em Amsterdã, no ano de 1719. Esta assume acréscimos baseados em Colerus. [N] – Refere-se à biografia de Lucas (cf supra) publicada na Revista Nouvelles Littéraires. [JJ] – Jarig Jelles: autor do célebre Prefácio (Voorreden) en: De Nagelate Schriften (Opera Posthuma – OP). [K] – Prólogo de Kortholt no livro de seu pai, Christian Kortholt: De Tribus Impostoribus magnis, Hamburgo, 1700. [M] – Biografia de Spinoza de Johannes Monnikhoff. [St.-H] – Relato de viajem de viajem de Stolle e Hallmann nos Países Baixos, 1703. [SN] – Steven Nadler: autor de Spinoza – A Life, publicada pela Cambridge University Press em 1999. Nós utilizamos a tradução portuguesa, Espinosa – Vida e Obra, publicada em Portugal pela Publicações Europa-América no ano de 2003. Trata-se da mais recente biografia de Spinoza, ainda que não apresente nada de novo, pois se fundamenta praticamente nas mesmas fontes que todos os biógrafos do século XX e da contemporaneidade se basearam. [IE] – Documento da Inquisição Espanhola: o depoimento frente ao Tribunal do Santo Ofício de Fray Tomás Solano y Robles e o capitão Miguel Pérez de Matranilla, ocorridos em 8 de agosto de 1659 e 9 de agosto de 1659, respectivamente. Para citar e/ou incluir este texto em Referências Bibliográficas, deve-se adotar o modelo abaixo, conforme as normas da ABNT prescrevem (não esquecer de atualizar a data para a de seu acesso): FRAGOSO, Emanuel Angelo da Rocha. Breve Introdução. Disponível em: VIII. Por eternidade entendo a própria existência, enquanto concebida como seqüência necessária da mera (ex sola) definição de coisa eterna. Explicação: Pois que tal existência se concebe, assim como a essência da coisa, como verdade eterna, daí resulta que não pode ser explicada pela duração ou pelo tempo, ainda que se conceba a duração sem começo nem fim. (E1Def8) | ||
Fonte:
A Revista Conatus - Filosofia de Spinoza
A Revista Conatus - Filosofia de Spinoza
Introdução. Disponível em:
.Acesso em: 09 abr. 2007.
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Sejam abençoados todos os seres.
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