Conferência do Prof. Humberto Maturana no IEAT da UFMG.
Humberto Maturana - Universidade do Chile
Humberto
Maturana é biólogo, nascido no Chile, e co-criador da Teoria da
Autopoiese junto com Francisco Varela. Na década de 50 Maturana
trabalhou com o pioneiro da epistemologia experimental Warren
McCullouch, e desenvolveu vários trabalhos de ruptura na área de
neurofisiologia da percepção. Publicou inúmeros artigos em revistas
especializadas, explorando as implicações da teoria da autopoiese em
áreas tão diversas quanto a terapia de familia, a ciência política e a
educação.
É autor dos livros Autopoiesis and Cognition e The Tree of
Knowledge (ambos em parceria com Francisco Varela), Origen de las
Especies por Medio de la Deriva Natural (em parceria com Jorge
Mpodozis), El Sentido de lo Humano, Emociones y Lenguaje en Educacion y
Politica, La Democracia como una Obra de Arte, Amor y Juego: Fundamentos
Olvidados de lo Humano (com Gerda Verden-Zoller), dentre outros. Desde o
início dos anos 50 Maturana vem atuando como professor da Universidade
do Chile, onde criou o Laboratório de Epistemologia Experimental,
atualmente dirigido por seu ex-aluno e colaborador Jorge Mpodozis.
Em
1995 Maturana foi premiado pela Academia de Ciências do Chile em
reconhecimento ao conjunto de sua produção intelectual.
67 proposições de Humberto Maturana sobre a biologia do amor
Da natureza humana
1. "Biologicamente somos Homo sapiens amans,
isto é, pertencemos a uma história biológica na qual surgimos primatas
bípedes ´linguajantes’ amorosos, mas não somos o que somos como Homo sapiens amans
em um sentido essencial, porém sistêmico. Quer dizer, nosso ser
biológico, como o ser de todo ser biológico, tem dois aspectos: (a) um estrutural, que é uma estrutura inicial total que especifica o campo do possível no curso do viver do ser vivo, e (b) outro epigênico, que
é a realização de um ser particular entre todos os possíveis, o qual
surge da transformação da estrutura inicial segundo um curso que se vai
gerando momento a momento nas interações do ser vivo com o meio, nas
circunstâncias que lhe toca viver. O ser do ser humano é sistêmico,
surge no conviver e se conserva no conviver. Somos Homo sapiens amans e permaneceremos como tal em nosso devir histórico somente enquanto vivamos como Homo sapiens amans entre Homo sapiens amans." ("Formação Humana e Capacitação, p. 168)
2. "Se deixamos de viver como Homo sapiens amans,
desaparecerá, primeiro de um modo não definitivo, o aspecto epigênico
do nosso ser amans, mas logo mudará nosso ser estrutural, e será cada
vez mais difícil, e eventualmente impossível, que o Homo sapiens amans apareça de novo. Em seu lugar haverá outro ser, talvez um Homo sapiens agressans, ou Homo sapiens arrogans." (Idem, ibidem)
3. "Sem
dúvida os seres humanos podemos cultivar a agressão, mas a agressão
ainda não é o centro do nosso viver; ainda buscamos viver no amor como a
emoção que gera bem-estar no viver em qualquer idade." (Idem, ibidem)
4. "O
recém-nascido não nasce no medo ou na agressão, nasce na confiança em
que há um adulto amoroso que o espera para acolhê-lo, assim como a
borboleta que ao sair do casulo nasce confiante em que haverá flores e
néctar que farão possível a sua vida. O recém-nascido parece dizer: aqui
estou, ame-me e serei um adulto amoroso; o menino ou a menina que chega
à creche, ou ao jardim da infância, ou à escola, ou à universidade, a
menos que haja sido criado na agressão, na desconfiança, na competição
ou na ambição, diz o mesmo e deseja o mesmo. Vivemos numa cultura que
consciente e inconscientemente cultiva a agressão, e se não queremos que
os descendentes dos nossos filhos dêem origem ao Homo sapiens
agressans, temos de viver intencionalmente com eles como o que ainda
somos, Homo sapiens amans, Homo sapiens que vivem no respeito por si mesmos e pelos outros, com consciência social e responsabilidade ética." (Idem, ibidem)
1. O amor, nossa origem
5. (O amor) "a condição biológica que é a base da humanidade." (Ontologia da Realidade, p. 186)
6. "É o modo de vida hominídeo que torna possível a linguagem, e é o amor, como
a emoção que constitui o espaço de ações em que se dá o modo de viver
hominídeo, a emoção central na história evolutiva que nos dá origem. Que
isso seja assim é claro no fato de que a maior parte das enfermidades
humanas, somáticas e psíquicas, pertencem ao âmbito de interferência com
o amor." (Idem, p. 174)
7. "A origem
antropológica do Homo Sapiens não se deu através da competição, mas sim
através da cooperação, e a cooperação só se pode dar como uma atividade
espontânea através da aceitação mútua, isto é, através do amor." (Idem, p. 185)
8. "{...} o amor é o fundamento do fenômeno social e não uma conseqüência dele." (Idem, p. 184)
9. "Nós
somos biologicamente diferentes dos chimpanzés (vivemos um fenótipo
ontogênico diferente) devido a que pertencemos a uma história de
conservação do amor como fundamento do nosso conviver, enquanto eles
não. Há semelhança entre nós e os chimpanzés, sem dúvida, e algumas têm
fundamento biológico ancestral, mas outras são o resultado de um
aproximação cultural muito recente à maneira de viver dos chimpanzés, na
instrumentalização patriarcal que fazemos das relações de dominação e
submissão em nossa vida política humana." (Formación..., p. 140)
2. O amor, nossa essência
10. "O
amor consiste na abertura de um espaço de existência para um outro em
coexistência conosco, em um domínio particular de interações. Como tal, o
amor é a expressão de uma congruência biológica espontânea, e não tem
justificação racional: o amor acontece porque acontece, e permanece
enquanto permanece." (Ontologia..., p. 184)
11. "Os
aspectos importantes da dinâmica sistêmica que nos fazem e conservam
como seres humanos são (a) a intimidade do amor e do jogo na relação
materno-infantil e (b) uma infância vivida de maneira que a pessoa em
crescimento conserva o respeito por si mesmo e pelo outro (aceitação que
não requer justificação da própria legitimidade nem da legitimidade do
outro) num domínio social de cooperação e cuidado mútuo." (Formación...,
p. 143)
12. "Como um de nós (Gerda Verden-Zöller, em
Maturana e G.V.-Z, 1993) mostrou, a relação primária mãe-filho ou filha é
uma relação de total confiança e mútua aceitação corporal em que, na
dinâmica do jogo com a mãe, a criança aprende a sua corporalidade e a
corporalidade dos outros, desenvolvendo sua consciência de si e sua
consciência social no auto-respeito e respeito pelos outros, ao mesmo
tempo em que cria o mundo em que vive como uma expansão de sua dinâmica
racional e corporal. Se essa relação primária mãe-filho ou filha não é
perturbada, o humano se conserva como maneira de viver na vida adulta." (Idem, ibidem - grifado DR)
13. {...}
o amor é a fonte da socialização humana e não o resultado dela, e
qualquer coisa que destrói o amor, qualquer coisa que destrói a
congruência estrutural que ele implica, destrói a socialização. A
socialização é o resultado do operar no amor, e ocorre somente no
domínio em que o amor ocorre." (Idem, p. 185)
14. "O
que nos faz seres humanos é nossa maneira particular de viver junto
como seres sociais na linguagem. E nessa maneira particular de
coexistência que nos faz humanos o amor é o fenômeno biológico que nos
permite escapar da alienação anti-social criada por nós através de
nossas racionalizações. É através da razão que justificamos a tirania, a
destruição da natureza ou o abuso sobre outros seres humanos na defesa
de nossas propriedades materiais ou ideológicas." (Idem, p. 184)
15. "O
amor, o anseio biológico que nos faz aceitar a presença do outro ao
nosso lado sem razão, nos devolve à socialização e muda a referência de
nossas racionalizações. A aceitação do outro sem exigências é o inimigo
da tirania e do abuso, porque abre um espaço para a cooperação. O amor é
o inimigo da apropriação." (Idem, p. 185)
16. "Nós,
seres humanos, não somos animais racionais. Nós, seres humanos, somos
animais que utilizam a razão, a linguagem, para justificar nossas
emoções, caprichos, desejos... {...} somos animais que, através da
razão, através da linguagem, podemos vir a ser conscientes de nossas
emoções, e então experienciamos sua mudança, e nisso o amor é central." (Idem, p. 186)
17. "Existimos
como seres humanos na existência social, e a linguagem, a razão e a
autoconsciência surgem e se dão como fenômenos sociais: sem socialização
não há linguagem, não há razão, não há autoconsciência, não há
apercebimento de emoções e, sem amor, nós não somos seres sociais." (Idem, p. 186)
18. "O
amor é a emoção central na história evolutiva humana desde o seu
início. Toda ela se dá como uma história na qual a conservação de um
modo de vida em que o amor - a aceitação do outro como um legítimo outro
na convivência - é uma condição necessária para o desenvolvimento
físico, comportamental, psíquico, social e espiritual do adulto. Em um
sentido estrito, os seres humanos fomos originados no amor e somos
dependentes dele." (Emociones y Lenguaje em Educación y Política, p. 26 -
trad. DR)
3. O amor e a nossa inteligência
19. "Como
seres que existimos na linguagem, todos os seres humanos somos
igualmente inteligentes, a menos que haja um dano do sistema nervoso por
alguma circunstância patológica." (Formación, p. 79 - Grifado DR)
20. "{...}
a constituição inicial das crianças humanas é essencialmente igual no
âmbito da inteligência {...} e as diferenças, se existem, se devem a
alterações do crescimento normal do sistema nervoso por aspectos
genéticos, nutricionais ou traumáticos." (Idem, p. 79-80)
21. "As
emoções modulam o operar da inteligência como um aspecto concreto do
conviver, e abrem ou fecham os caminhos para a consensualidade na vida
cotidiana. Assim, a inveja, o medo, a ambição, a competitividade,
restringem a conduta inteligente porque estreitam o olhar e a atenção.
Só o amor amplia o olhar na aceitação tanto de si mesmo e como da
circunstância, expandindo a possibilidade de um operar inteligente.
Sabemos isso na vida cotidiana, o que se revela quando dizemos de alguém
que está ‘cego’ de ambição, de inveja ou competição, ou de medo." (Idem, p. 80)
22. "Na
vida cotidiana comumente geramos situações que restringem o operar
inteligente das pessoas, particularmente das crianças, ao minar o seu
auto-respeito com a constante desvalorização de suas condutas, com
críticas, controle permanente na desconfiança, exigências cegas à
circunstância que vivem etc. Isto é, restringimos a inteligência dos
outros, em particular das crianças, com nossas próprias cegueiras,
vaidades e inseguranças, quer dizer, com a nossa falta de inteligência
em nossa ação, ao viver no desamor, na ambição, na competição, no medo e
na inveja." (Idem, ibidem)
23. "O amor é a única
emoção que expande a conduta inteligente em toda a sua magnitude
possível, trazendo à mão todos os recursos intelectuais e racionais de
que a pessoa dispõe." (Formación... p. 170)
24. "O amor
não é brando nem duro, não é tolerante nem aceitador, não é bom nem mau,
é um espaço relacional no qual se vive com o olhar aberto para ver o
outro, a outra, qualquer outro, e no qual não se corrige o ser do outro,
ainda que o olhar reflexivo sobre a ação que se faz possível nele
resulte numa mudança do ser sistêmico que o outro e nós mesmos vivemos."
(Idem, p. 171)
25. "O viver inteligente se
amplia na convivência com respeito mútuo, e se restringe ou diminui no
temor, na competição e na ambição. Se não temos consciência disso, somos
cegos com relação ao que passa com nossos alunos e alunas, e os negamos
criando situações eu diminuem o seu viver inteligente." (Idem, p. 82)
4. A falta do amor, nossa doença
26. "{...} a saúde psíquica e fisiológica depende do amor {...}." (Formación... p. 142)
27. "{...} a criança que não cresce no amor não cresce como um ser social." (Ontologia... p. 47 - grifado DR)
28. {Quando...}
e a criança não cresce no amor, sua fisiologia se distorce, surgem
problemas de desenvolvimento, problemas de relação, problemas
fisiológicos, psicológicos. Quando isso ocorre altera-se também seu ser
social. Se não cresce no amor, altera-se sua fisiologia e com isso sua
configuração de mundo.
29. "A maior parte do sofrimento
humano vem da negação do amor: os seres humanos somos filhos do amor.
{...} Em verdade eu diria que 99% das doenças humanas têm a ver com a
negação do amor." (Idem, p. 26)
30. "Adoecemos se
não nos querem, se nos rejeitam, se nos negam ou se nos criticam de uma
maneira que nos parece injusta. Podemos inclusive desenvolver um
câncer, porque a dinâmica fisiológica tem a ver com a dinâmica
emocional." (Idem, p. 97)
31. "{...} há muitas
doenças que são, na verdade, distorções do fluir harmônico do nosso
sistema imune. Do fluir harmônico com quê? Com a harmonia do organismo,
com a harmonia sistêmica do organismo. E nessas distorções desse fluir
harmônico aparece o que vivemos como uma experiência patológica." (A
Ontologia..., p. 330)
32. "{...} o amor é tão
fundamental em nós porque especifica o espaço de harmonia na realização
do organismo, o espaço de harmonia da epigênese na realização do
organismo. Então você rompe com isso, rompe com a harmonia do sistema
imune com o sistema nervoso, com todas as configurações orgânicas. E
surge uma patologia. Recupera as relações amorosas, ou seja, a aceitação
do outro como um legítimo outro na convivência, e se restabelece a
harmonia." (Idem, ibidem)
33. "A maior parte do
sofrimento humano surge com a negação do amor, e a maior parte da nossa
falta de compreensão do sofrimento humano resulta da nossa falta de
compreensão do papel fundamental que o amor desempenha na biologia
humana." (A Ontologia..., p. 320)
34. "Essa negação do
amor pode tomar muitas formas, mas todas elas acarretam uma cegueira
operacional por parte de alguém a respeito da presença do outro, que é
então negado na base de sua existência humana. Assim, não há
desenvolvimento corporal, psíquico e social sadio na negligência do
amor." (Idem, ibidem)
35. "{...} não há nenhuma
saúde corporal, psíquica e social adulta no meio de conversações
recorrentes que negam a auto-aceitação; e não há nenhuma relação
corporal, psíquica e socialmente sadia no meio de conversações
recorrentes que negam o amor." (Idem, ibidem)
36. "O
amor não é bom nem mal, mas fora dele não há respeito mútuo, não há
respeito por si mesmo, não há colaboração, isto é, não há convivência
social, só há comunidades nas quais se vive na dominação e na
obediência, na competição e na negação mútua, na inveja, na apropriação
do que é do outro, na agressão, sem consciência e sem responsabilidade
individual e social, e, por último, sem ética." (Formación... p. 171)
5. Centralidade da emoção
37. "As emoções são um fenômeno próprio do reino animal. Todos os animais as temos." (Emociones..., p. 16 - trad. DR)
38. "A
presença fundamental do emocionar em tudo o que fazemos, e que nos
conecta com nossa história biológica de mamíferos e primatas, não é uma
limitação de nossa humanidade mas, ao contrário, é nossa condição de
possibilidade enquanto seres humanos. É nossa forma de emocionar que dá
forma à maneira de viver na qual somos humanos como animais racionais
linguajantes, e através da qual a humanidade surge na história dos
primatas." (Idem, ibidem)
39. "Dizer que o
emocional tem a ver, em nós, com o animal, certamente não é novidade; o
que estou acrescentando, sem dúvida, é que a existência humana se
realiza na linguagem e no racional partindo do emocional." (A
Ontologia..., p. 170)
40. "A presença fundamental do
emocionar em tudo o que fazemos e que nos conecta com nossa história
biológica de mamíferos e primatas, não é uma limitação de nossa
humanidade mas, ao contrário, é nossa condição de possibilidade enquanto
seres humanos. É nossa forma de emocionar que dá forma à maneira de
viver na qual somos humanos como animais racionais linguajantes, e
através da qual a humanidade surge na história dos primatas." (Ontologia
da Realidade, p. 278)
6. Emoção, fundamento último da razão e da ação
41. "Nós,
seres humanos, não somos animais racionais. {...} somos animais
linguajantes emocionais que usamos as coerências operacionais da
linguagem para justificar nossas preferências e nossas ações no
processo, e, sem nos darmos conta disso, nos cegamos para o fundamento
emocional de todos os domínios racionais que trazemos à mão." (A
Ontologia..., p. 319)
42. "Nós, seres humanos ocidentais
modernos, comumente afirmamos que somos animais racionais para nos
distinguirmos de outros animais que afirmamos moverem-se apenas mediante
impulsos emocionais. Que somos animais que usamos a razão, não há
dúvida. Apesar disso, somos movidos por emoções como qualquer animal. A
razão nos move somente através das emoções que surgem em nós no curso de
nossas conversações (ou reflexões) dentro do curso entrelaçado de nosso
linguajar e emocionar." (Idem, p. 278)
43. "{...}
sustento que não há ação humana sem uma emoção que a funde como tal e a
faça possível como ato. {...} não é a razão que nos leva à ação, mas
sim a emoção." (Idem, p. 23)
44. "Com efeito, ao
convidá-los a reconhecer que as emoções são disposições corporais que
determinam ou especificam domínios de ações, e que as diferentes emoções
se distinguem precisamente porque especificam domínios de ações
distintos, convido-os também a reconhecer que, devido a isso, todas as
ações humanas, independente do espaço operacional em que se dão, se
fundam no emocional, porque ocorrem no espaço de ações especificado por
uma emoção. O raciocinar também.." (Idem, ibidem)
45. "{...}
sustento que não há ação humana sem uma emoção que a funde como tal e a
faça possível como ato. {...} não é a razão que nos leva à ação, mas
sim a emoção."
46. "{...} ocorre que somos mamíferos, e
como tais somos animais que vivem na emoção. As emoções não são
"apagões" do entendimento, não são restrições da razão; as emoções são
dinâmicas corporais que especificam os domínios de ação em que nos
movemos. Uma mudança na emoção implica uma mudança de domínio de ação.
Nada nos acontece nem nada fazemos que não esteja definido como uma ação
de certa classe pela emoção que a faz possível." (Emoções..., p. 107)
47. "Um
encontro com alguém que pertence ao meu mundo, e que respeito, não é
igual a um encontro com alguém que não pertence ao meu mundo e que me é
indiferente {...}. E não é igual porque as emoções envolvidas são
diferentes." (Emociones..., p. 14)
48. "Se queremos
entender as ações humanas não devemos olhar o movimento ou o ato como
uma operação particular, mas a emoção que o possibilita. Um choque entre
duas pessoas será vivido como agressão ou acidente segundo a emoção na
qual se encontram os participantes. (Idem, p. 107)
49. "Não
é o encontro que define o que ocorre, mas a emoção que o constitui como
um ato. Daí que os discursos racionais, por impecáveis e perfeitos que
sejam, são completamente ineficazes para convencer alguém se o que fala e
o que escuta fazem-no a partir de emoções diferentes." (Idem, p. 107)
50. "Dizer
que a razão caracteriza o ser humano é usar antolhos, porque isso não
nos deixa ver a emoção, que fica desvalorizada como algo animal ou algo
que nega o racional. Isto é, ao declarar-nos seres racionais vivemos uma
cultura que desvaloriza as emoções, e não vemos o entrelaçamento
cotidiano entre razão e emoção que constitui o nosso viver humano, e não
nos damos conta de que todo sistema racional tem um fundamento
emocional." (Idem, p. 15)
51. "Correntemente
vivemos nossos argumentos racionais sem fazer referência às emoções nas
quais se fundam, porque ignoramos que eles e todas as nossas ações têm
um fundamento emocional, e acreditamos que tal condição seria uma
limitação ao nosso ser racional. Mas, será uma limitação ter o racional
um fundamento emocional? Não! Ao contrário: é sua condição de
possibilidade." (Idem, p. 19)
52. "A ética não tem fundamento racional, mas sim emocional." (Idem, p. 80)
7. Controle do emocionar e mudança do emocionar e do relacionar
53. "Se
me encontro com alguém na negação, na agressão, e logo, no processo do
encontro, digo para mim mesmo: ´mas, na realidade não quero atacar essa
pessoa"; então começo a relacionar-me com ela de outra maneira. O que
aconteceu? Minha emoção mudou. {...} Mas tenho de ousar fazer essa
reflexão, ou treinar-me para fazê-la; ou, em outras palavras, tenho de
querer fazer a reflexão, e para querer fazê-la tenho de partir da
legitimidade de aceitar o outro."
54. "Quanto ao
controle das emoções, penso que se trata de uma proposta inadequada,
porque supõe que elas devem ser controladas por seu caráter negativo.
Mas não é assim: as emoções constituem o fundamento de todo o nosso
fazer. O que cabe, sim, é dar-nos conta das emoções para atuar
responsavelmente, isto é, perceber se queremos ou não as conseqüências
das nossas ações." (Idem, p. 97)
55. "Freqüentemente
nos dizem que precisamos controlar nossas emoções e nos comportar de
maneira racional, principalmente quando somos crianças ou mulheres. Quem
nos fala assim quer que nos comportemos de acordo com alguma norma de
sua escolha. {...} quando negamos nossas emoções, nenhum raciocínio pode
apagar o sofrimento que geramos em nós mesmos ou nos outros." (A
Ontologia..., p. 167)
56. "Se uma criança cresce desde
pequena sem respeito por si mesmo e sem respeitar o outro, com uma
debilidade em seu respeito próprio e, portanto, com uma debilidade no
respeito pelo outro, essa criança vai crescer com certas características
que vão configurar seu viver de uma maneira na qual essas
características se conservam. Então nos parecerá que esse ser é
imutável, precisamente porque já foi assim desde pequeno. Mas uma vez
que o julgamos imutável, não fazemos as coisas que permitiriam sua
mudança. Se essa pessoa não respeita a si mesma nem respeita o outro, e
eu considero isso uma característica constitutiva sua, só irei ter com
ela condutas negadoras do respeito por si mesma e pelo outro." (Idem, p. 48)
8. Conversar, nosso modo de ser
57. "A palavra conversar vem da união de duas raízes latinas: cum, que quer dizer com, e versare, que quer dizer dar voltas com o outro. Por isso é que, neste artigo, minha pergunta será: o que ocorre no dar voltar juntos dos que conversam, e o que acontece aí com as emoções, a linguagem e a razão?" (Idem, ibidem)
58. "O
humano é vivido no conversar, no entrelaçamento do linguajar e do
emocionar que é o conversar. Além disso, o humano se vive em redes de
conversações que constituem culturas, e também se vive nos modos de vida
que as culturas constituem como dimensões relacionais, que descrevemos
como dimensões psíquicas, espirituais ou mentais." (Ontologia, p. 121)
59. "{...}
considero central para a compreensão do humano, tanto na saúde como no
sofrimento psíquico ou somático, entender a participação da linguagem e
das emoções no que, na vida cotidiana, conotamos com a palavra conversar." (Idem, p. 167)
60. "O
central do fenômeno social humano é que ele se dá na linguagem, e o
central da linguagem é que apenas nela se dão a reflexão e a
autoconsciência. A linguagem em um sentido antropológico é, portanto, a
origem do humano enquanto tal, uma vez que é tanto sua queda quanto sua
libertação. A linguagem retira a biologia humana do âmbito da pura
estrutura material, e inclui nela o âmbito da estrutura conceitual ao
tornar possível um mundo de descrições no qual o ser humano deve
conservar sua organização e adaptação,. Assim, a linguagem dá ao ser
humano sua dimensão espiritual na reflexão, tanto da autoconsciência
quanto da consciência do outro. Mas a linguagem é também a queda do ser
humano, ao permitir as cegueiras frente ao ser biológico, que trazem consigo as ideologias descritivas daquilo que deve ser." (Ontologia, p. 207 - grifo DR)
61. "{... a saúde psíquica e fisiológica depende do amor e} a palavra pode restabelecer ou contribuir para a harmonia fisiológica, qualquer que seja a maneira em que foi perdida.
Sabemos tudo isso, mas o esquecemos na ilusão de onipotência ao
confundirmos inteligência com manipulação." (Formación..., p. 142 -
grifado DR)
62. "Como seres humanos somos o que somos no conversar, mas na reflexão podemos mudar nosso conversar e nosso ser. Essa é nossa liberdade, e nossa liberdade pertence ao nosso ser psíquico e espiritual." (Ontologia, p. 121 - grifado DR)
63. "{...}
quando temos alguma desavença, ainda no calor da raiva, dizemos que
devemos resolver nossas diferenças conversando e, de fato, se
conseguirmos conversar, as emoções mudam e a desavença ou se esvai ou se
transforma, com ou sem briga, numa discordância respeitável." (Idem, ibidem)
64. "Na
biologia do amor se vive desde o ver com consciência social,
responsabilidade e ética, seja qual for o espaço relacional, sem esforço
nem sacrifício, porque se vive a partir do respeito por si mesmo. Na
biologia do amor o outro ou a outra tem presença, não precisam
justificar o seu ser, e pode-se conversar de modo que tanto nós como o
outro ou a outra estão abertos à reflexão, porque esta não é uma ameaça
nesse olhar precisamente porque surge no espaço relacional que constitui
o amor." (Emocionar..., p. 171)
9. Tipos de conversações
65. "Há
diversas classes de conversações que um observador pode distinguir no
domínio das relações e interações humanas. Diferenciam-se pelos tipos de
coordenações de ações e emoções nelas envolvidas, e cada uma delas é
definida por um padrão ou configuração particular de coordenações de
ações e fluir emocional." (Ontologia, p. 280)
66. "{...}
cada ser humano normalmente participa, simultânea ou sucessivamente, de
muitas conversações diferentes, senão independentes, que se influenciam
mutuamente de modo indireto ao se entrelaçarem na sua realização
através da dinâmica de nossas corporalidades." (Idem, ibidem)
67. (Tipos de conversações:) {...}
a) conversações de coordenações de ações presentes e futuras
b) conversações de queixas e pedidos de desculpa por acordos não mantidos
c) conversações de desejos e expectativas
d) conversações de mando e obediência
e) conversações de caracterizações, atribuições e avaliações
f) conversações de queixas por expectativas não preenchidas ou de promessas não cumpridas e que sequer foram feitas
g)
conversações de co-inspiração {...} nas quais as coordenações de ações e
emoções que elas envolvem resultam no desejo de um empreendimento comum
e nas ações que o realizam. {...} se fundam no respeito mútuo e
conferem dignidade aos participantes, bem como liberdade para ações
responsáveis." (Idem, p. 280-283)
© Atualização 3/2/2009
- Damtom G P Silva ( dansilva@pr.gov.br )
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Sejam felizes todos os seres.Vivam em paz todos os seres.
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