segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

A DEIDADE - A MISSÃO : AMOR - PAZ E CARIDADE -Giridhari das




Moutain -Hare Krishna -  Krishna Das - 14min.

 Giridhari Das

 

Meu nome é Giridhari Das 
 e meu objetivo é lhe fornecer um canal para conhecer mais a fundo
 a autorrealização em yoga, a consciência de Krishna,
 a cultura Hare Krishna e os Vedas.



A Deidade
 por Giridhari Das

Para muitas pessoas, a adoração da Deidade é um dos elementos mais difíceis de compreender (ou aceitar) das práticas de bhakti-yoga. Causa profunda estranheza para certas pessoas a noção de Deus como uma estátua ou quadro, aparentemente tão limitado, imóvel...tão material!

Tem um verso muito importante no Srimad Bhagavatam, que diz: “Transcendentalistas eruditos que conhecem a Verdade Absoluta, chamam essa substância não dual de Brahman, Paramatama e Bhagavan” (SB 1.2.11).

Brahman é a luz, ou efulgência, de Deus que tudo penetra, que permeia toda realidade. Os impersonalistas tem como meta se fundir nessa luz divina, perdendo sua identidade e individualidade. Livrando-se da contaminação material, esse tipo de transcendentalista experimenta uma profunda paz e alívio.

Paramatma, que literalmente significa Superalma, é a forma localizada do Senhor que sustenta a realidade material. Deus está no coração de todos nessa forma de Paramatma. Não só no coração de todo corpo material, mas também em todos os átomos da criação. Os grandes místicos entravam em meditação profunda na Superalma, adquirindo assim todo tipo de poder místico e controle sob seus corpos e a energia material de Deus, em sua comunhão com o divino.

Bhagavan, porém, é a forma pessoal de Deus, do Senhor Transcendental. Deus tem ilimitadas formas espirituais (não materiais) para se relacionar pessoalmente de ilimitadas maneiras com Seus ilimitados devotos. Essa é a plataforma suprema de amor, onde existe um campo ilimitado para o ser vivo expressar seus sentimentos amorosos em relação ao Senhor. De todos os prazeres, nenhum se compara ao prazer do relacionamento amoroso, seja como amigo, parente (filho, pai, mãe, etc.) ou amante. E a qualidade do relacionamento é diretamente ligada às qualificações de quem está amando e de quem está sendo amado. Assim, pode-se entender que não há situação mais elevada, mais prazerosa e feliz, do que eternamente ser supremamente qualificado e amar alguém supremamente qualificado. Essa é a posição da plataforma transcendental da Verdade Absoluta em Bhagavan. Como somos, por constituição, partes e parcelas do Senhor com Suas mesmas qualidades, já somos, sempre fomos e sempre seremos, supremamente qualificados. Basta nos livrar de nossas errôneas e ilusórias concepções sob nosso eu, ou seja, limpar o coração de tudo aquilo que nós não somos. E a Suprema Personalidade de Deus, que tem ilimitados nomes devidos a Suas ilimitadas formas transcendentais, é por definição o reservatório infinito de todas as boas qualidades. Portanto, nosso estado original é de estar assim situado numa rica, variada e eterna relação pessoal de amor puro com o Senhor.

Vale a pena notar que a plataforma Paramatma, inclui e supera as realizações e benefícios da plataforma Brahman e que a plataforma Bhagavan, inclui e supera as realizações e benefícios das plataformas Brahman e Paramatma. Tudo se cumpre e atinge automaticamente ao entrar no estágio de perfeita comunhão amorosa pessoal com Deus.


Uma dessas formas ilimitadas que o Senhor aceita é a Deidade, tecnicamente chamada de arca-vigraha. Em nosso estado condicionado perdemos nossa capacidade natural de ver, tocar, cheirar, sentir, etc. aquilo que é transcendental. Conseguimos apenas ter essas experiências com a energia inferior de Deus, Sua energia material. Por isso, sendo todo misericordioso, Deus aceita uma forma composta de Sua energia material (na forma de pedra, metal, tinta, etc.) para que mesmo em tal condição podemos nos relacionar com Ele diretamente em Sua forma Bhagavan. A Deidade assim deixa de ser matéria, deixa de ser uma estátua ou pintura, e passa a ser uma forma transcendental do Senhor, apesar de manter as características de uma criação material. Sem Sua forma arca-vigraha, e sem já estar na plataforma transcendental liberada, limitamos muito nossa oportunidade de nos relacionar com Deus na plataforma Bhagavan, Seu supremo aspecto. A adoração da Deidade, portanto, é a oportunidade de se situar na plataforma transcendental de serviço amoroso ao Senhor, de realizar importantes aspectos inerentes ao relacionamento amoroso entre duas pessoas, como alimentar, tocar, presentear, cuidar, etc.

Praticar vida espiritual significa justamente isso – praticar vida espiritual! Significa fazer aqui e agora aquilo se faz no estado espiritual puro almejado. Aquele que ignora sua individualidade e a existência individual de Deus e almeja a plataforma Brahman, onde nada se faz, nada se pensa, nada se deseja e apenas “é”, pratica então nada fazer, nada pensar, nada desejar e apenas “ser”, e assim avança espiritualmente. Aquele que compreende sua individualidade eterna e a existência de Deus em tudo e todos, querendo assim entrar em total comunhão com o aspecto divino da realidade a sua volta, faz exatamente isso ao fixar sua consciência na Superalma, e assim avança espiritualmente. E aquele que compreendeu sua individualidade eterna e o aspecto pessoal de Deus, querendo assim apenas viver um relacionamento amoroso infinito e eterno com o Senhor Transcendental, faz exatamente isso ao relacionar-se com Ele pessoalmente, chamando-O, alimentando-O, tocando-O, presenteando-O, cuidando dEle, etc., e assim avança espiritualmente.

Portanto a adoração da Deidade é uma prática natural e importante no processo de nos re-estabelecermos em nosso eterno e amoroso relacionamento pessoal com Deus, bhakti-yoga, e, exatamente por isso, causará estranheza para aqueles que são materialistas e/ou estão buscando outras metas transcendentais.


 A Missão
por Giridhari Das


Parte 1 - Introdução


Os Vedas nos explicam o conceito fundamental de que a vida eterna, com desejos, emoções e ações , existe em sua forma puramente divina. Agora mesmo podemos estar experimentando estas coisasExperimentamos desejos, emoções e ações agora, porém com o ranço do egoísmo e a contaminação da matéria mortainerte, o que os torna insatisfatórios, limitados ou mesmo desagradáveis. Deus nos oferece diferentes técnicas para nos livrarmos destes defeitos e, assim, a cada passo, nos aproximarmos do estado divino de ser. Dentre elas, a bhakti-yoga possui uma característica especial: o processo não é diferente do objetivo. Ou seja, ao praticarmos bhakti-yoga estaremos praticando a vida puramente divina e eterna, mesmo que ainda sob o jugo do egoísmo e apego material. A teoria por trás da técnica é muito inteligente: uma única coisa não pode estar em dois lugares ao mesmo tempo . Ao praticar a consciência de Krishna, não há como, ao mesmo tempo, manter a consciência egoísta mundana. São estados mentais opostos. Podemos, enquanto imaturos, em um instante estar em consciência de Krishna e no próximo cair para a consciência mundana, mas nunca estaremos nos dois ao mesmo tempo. O que nos traz avanço em bhakti, portanto, é nos ocuparmos cada vez mais em bhakti. E ocupar-se em bhakti significa ocupar-se em todos os níveis onde atuamos: desejos, emoções e ações.

O termo “sadhana” significa a prática regular para se atingir um objetivo (“sadhya”). Os praticantes de yoga costumam seguir um programa de práticas regulares (japa, estudos, adoração da Deidade, disciplinas morais, limpeza, etc.) que os ajudam no processo de purificação do egoísmo e apego material. Mas nunca devemos esquecer que tais práticas possuem um objetivo final. Assim, a prática (“sadhana”) é um meio para nos ajudar a chegar ao objetivo (“sadhya”). E, como citado anteriormente, o objetivo final é estar plenamente situado em uma vida de desejos, emoções e ações puramente divinas. A consciência de Krishna, portanto, não é nem nunca foi plenamente atingida apenas por seguir-se certas práticas durante alguma parte do dia. O “néctar pelo qual sempre ansiamos”  é experimentado a partir do ponto onde dedicamos significativa parte de nossa vida à consciência de Krishna. O sadhana é indispensável, porém insuficiente. Sem sadhana caímos novamente para a plataforma animal e desperdiçamos nossa vida humana. Só praticar sadhana, no entanto, nos faz correr o risco de perder o entusiasmo pela vida espiritual e vê-la se tornar penosa, podendo assim nos levar a perder o gosto pela consciência de Krishna, que significa que novamente desenvolveremos crescente apego ao mundo material ilusório. Mais do que perder o gosto por sadhana, sem a ocupação em um programa completo de vida divina, poucos sequer desenvolvem suficiente determinação para manter uma prática de sadhana firme. Assim, enquanto o sadhana for uma ferramenta para manter e atingir um estado de bem-aventurança real e diário, será muito mais atraenteserá muito mais atraente e fácil de mantê-loser mantido.

Parte 2 – Além do Sadhana

Esta vida divina ou, em outras palavras, esta plena ocupação em bhakti, não é algo místico ou fantasioso. É de fato algo muito real e prático, tendo sido definida definido e apresentada apresentado por Deus em Sua vinda como o Avatara Dourado Sri Chaitanya Mahaprabhu há cerca de 500 anos atrás, e tem sido praticada com sucesso desde então. O grande sucesso de Srila Prabhupada foi justamente sua capacidade de nos ocupar nesta missão de Krishna, nesta vida divina. Prabhupada não se contentava em simplesmente ensinar a filosofia metafísica védica (sankhya), nem em simplesmente apresentar as diferentes e poderosas técnicas de japa, estudo, adoração da Deidade, etc. Prabhupada enfaticamente nos explicou que a vida espiritual era para ser vivida agora, em sua plenitude e ilimitada variedade, ocupando-nos nesta missão. .

O desejo expressado e praticado por Krishna em Suas últimas duas vindas ao mundo, conforme registrado nas escrituras védicas, é que nos ocupemos em difundir a ciência espiritual, abrindo assim o caminho para que todas as pessoas possam novamente receber e expressar o mais alto objetivo da vida: o puro amor divino (“prema”). Pode-se argumentar que, não por coincidência, entre estas duas vindas de Deus, surgiu no oriente médio um poderoso shakti-avesa avatar de Krishna, Jesus Cristo, com a mesma missão. Claramente, portanto, o desejo não sectário de Deus é que encaremos a ocupação em difundir as glórias e mensagem de Deus como nossa vida e alma. Esta missão está aberta a todos, sendo a forma mais direta e intensa de nos fixarmos em verdadeira consciência divina. Pode-se afirmar sem exageros que, quem não adotar esta missão de ajudar a elevar a consciência dos humanos, estará se limitando existencialmente e, como conseqüência, pouca ou nenhuma bem-aventurança poderá experimentar.

Parte 3 – Distorções e Oportunidades

Existe um temor na consciência coletiva que aflora imediatamente, quando se menciona a ocupação em trabalhos missionários. Os vários abusos cometidos por pessoas estúpidas inescrupulosas e violentas em nome de Deus geraram, ao longo dos anos, um compreensível medo que difundir a missão de Deus equivale a destruir culturas, matar pessoas e cometer todo tipo de atrocidade.  Estas barbaridades continuam hoje: guerras são travadas, bombas são explodidas e crianças são assassinadas em nome da religião ou de Deus.  IstoIsso, contudo,  não é razão para perdermos o entusiasmo, mas sim para redobrarmos nossos esforços. Mais do que nunca, é necessário mostrar a todos a verdadeira face de Deus, tal e qual Ele Se apresenta: como nosso melhor amigo, o Pai, a Mãe e o Avô de todos. É preciso mostrar ao mundo que Deus não é um religioso fanático ou um demônio monstro disposto a torturar e matar quem não compreender o dogma correto. A ciência de Deus, baseada no amor, compaixão, pureza, paz, não-violência, visão equânime, conhecimento, etc. é o tônico para livrar o mundo da nefasta doença do ódio religioso e da utilização do nome de Deus para todo tipo de insanidade egoísta.

Existe um termo em sânscrito  que serve especificamente para descrever este estado de vida centrada em Deus, em ilimitada variedade de desejos, emoções e ações: “lila”. Através dos ensinamentos confidenciais dos Vedas podemos compreender que a perfeição da existência eterna é participar da “lila” de Deus.  Infelizmente alguns adotam o conceito que isto só poderá acontecer após a morte ou em outra vida distante. Em parte isto é compreensível porque, a maioria das “lilas” acontecem
acontece em Vaikuntha ou nos diferentes planetas transcendentais. Porém, não estamos vivendo uma encarnação comum! Está acontecendo aqui e agora a “lila” mais doce de Krishna: a distribuição do puro amor divino (“prema”).  Esta “lila” é a mais importante dentre todas as que podem ser realizadas no mundo material, pois nela prevalece a superexcelente qualidade da compaixão. Prabhupada ocupou a todos nesta missão de forma muito intensa, o que trouxe imediata bem-aventurança para aqueles que aceitaram participar, independentemente do nível de avanço espiritual anterior, grau de escolaridade, raça, sexo ou classe social. E o melhor de tudo é que esta “lila” não terminou com a partida de Prabhupada do planeta, pois ele nos deixou sua Sociedade, a ISKCON. Assim, ainda hoje, ao redor do mundo, quem verdadeiramente compreende o propósito da ISKCON e o propósito da vida, desfruta de crescente bem-aventurança ao participar desta suprema “lila”, ocupando-se nesta missão.

Parte 4 – A ISKCON

A ISKCON é uma sociedade missionária. Não é um mero clube de praticantes de bhakti-yoga ou de admiradores da cultura védica. Assim, ainda hoje, ao redor do mundo, pessoas desfrutam de crescente bem-aventurança ao participar desta suprema “lila” utilizando-se da estrutura física (editoras, templos, fazendas e comunidades ao redor do mundo, rico acervo de arte, músicas, livros, etc.) e ideológica (os ensinamentos de Prabhupada e a experiência dos seus seguidores avançados) da ISKCON.  Ocupar-se nesta missão, nesta “lila”, não é muito fácil de se fazer sozinho. O desafio é grande demais para uma pessoa, ou mesmo um pequeno grupo de pessoas.  Porém, ao unirem-se todos, cada qual poderá fazer sua parte, de acordo com sua natureza, inclinação, grau de entusiasmo, etc. muito facilmente.Quem pede para ser iniciado e assim, espiritual e formalmente fazer parte da ISKCON, necessita entender isto. Um seguidor de Prabhupada é, acima de tudo, um missionário. Se um membro da ISKCON não realiza nenhum trabalho missionário, então esta pessoa não está integralmente seguindo os ensinamentos de Prabhupada (e nem tampouco de seu respectivo mestre espiritual, que certamente é um missionário). Quem não se ocupa em nenhum trabalho missionário e prefere simplesmente cuidar de sua vida, mesmo que mantenha um bom sadhana, é um membro da ISKCON em nome apenas.

Nos primeiros anos da ISKCON, este conceito era muito enfatizado e claro. Não havia dúvidas quanto a isso. Porém, criou-se uma distorção ao enfatizar que só havia um único real trabalho missionário e um único tipo de pessoa que o pudesse realizar: a distribuição de livros na rua por monges celibatários. Como poucos (quase ninguém) têm a natureza de se manter um monge celibatário e como poucos têm o perfil psicofísico para distribuir livros na rua, gradualmente houve uma queda muito acentuada do trabalho missionário da ISKCON . Aqueles que paravam de distribuir livros na rua e se dedicavam a criar suas famílias, estudos, emprego, negócio, etc. viam como encerradas suas carreiras missionárias ou até mesmo se afastavam da ISKCON.

Estes são dois extremos que precisam ser eliminados, trazendo um espírito saudável missionário a todos os membros da ISKCON. Sem fanatismo, mas também sem comodismo, todos devem procurar uma maneira de se ocupar nesta “lila” tão atraente de Krishna. Não porque seja uma obrigação, mas porque esta ocupação nos traz ilimitada bem-aventurança, acompanhada de um firme avanço espiritual! Basta perguntar a qualquer pessoa que pelo menos uma vez tenha se ocupado intensamente no trabalho missionário para ouvir quão maravilhosa e inesquecível foi a experiência.  A famosa “alegria” que virou marca registrada dos Hares nada mais é que a expressão da bem-aventurança interna de estar ocupado tão perfeitamente no serviço a Deus.

Todos podem participar da missão. Sem exceção! E pode-se fazer de tudo. Quem é músico, pode atrair as pessoas com belos bhajans. Quem tem dom para decorar um ambiente e torná-lo atraente, pode ajudar a decorar os locais onde são realizados programas espirituais. Quem quer desenvolver uma carreira acadêmica, pode fazer isso para difundir a consciência de Krishna no mundo acadêmico. Quem é bom administrador pode administrar projetos, ONGs e templos existentes ou criar novos. Solteiro, casado, divorciado, viúvo – não importa! É para todos. Não devemos achar que deve ser algo grandioso. Nem devemos achar que ser missionário significa agir em tempo integral. Muito pelo contrário, nos dias de hoje são raros os que podem se dedicar em tempo integral, mesmo por um ou dois anos da vida. Qualquer ato para o benefício da missão é louvável. Ajudar na faxina depois de um programa, dirigir até o mercado para comprar alimentos para um projeto, contribuir com alguns reais... tudo que possa ser útil é válido e, com certeza, trará ótimos resultados para o praticante! Quem é casado e trabalha pode criar programas em sua casa, pode participar ativamente de programas existentes e ajudá-los financeiramente ou até mesmo criar novos programas urbanos ou rurais.

Deus é ilimitado e Sua missão é ilimitada. Ninguém fica sem lugar. Basta ser sincero e fixo em no desejo de participar que coisas literalmente mágicas acontecerão neste sentido. Dons que desconhecíamos possuir se revelam, obstáculos ou “travas” desaparecem, recursos materiais e humanos tornam-se disponíveis, etc. E, o que é melhor, a realização e o amor de Deus em nosso coração se firmam e fortalecem a cada momentopasso. É um ciclo virtuoso e poderoso onde obtemos mais realização e poder (shakti) de Deus, que nos leva a nos ocupar de forma mais intensa e produtiva na missão de Deus, que em retorno nos traz ainda mais realização e poder.

Parte 5 – A Essência e a Conclusão

Ao falar da missão de Prabhupada, não podemos deixar de enfatizar a distribuição de livros da consciência de Krishna. Isto porque cada livro é uma encarnação de Krishna e de Prabhupada. Cada livro contém o poder de transformar a vida de uma pessoa permanentemente, pois oferece uma visão transcendental da Realidade e a metodologia para realizá-la. Cada exemplar é uma unidade independente para levar esta realização e amor divino a uma pessoa. A vida humana se destina a obter e aplicar este conhecimento transcendental. E os livros fazem justamente isto. Portanto, o livro é um passo crucial na vida espiritual de todos. Novamente, devemos buscar o equilíbrio entre dois extremos: um é achar que o único trabalho missionário é somente distribuir livros e o outro é achar que os demais trabalhos missionários podem ocorrer sem dar atenção central à distribuição da literatura transcendental. Quem pode distribuir livros em tempo integral, de forma madura e equilibrada, realiza um poderosíssimo trabalho missionárioé um grande herói, e a história confirma a grande bem-aventurança e rápido avanço espiritual experimentado por estas pessoas. Porém, nem todos têm possibilidade ou mesmo um perfil para tal. Mas, independente de quem somos, todos podem usar sua inteligência para distribuir livros de alguma forma, nem que sejam apenas alguns por mês, na forma de presentes para amigos ou colegas de trabalho. É essencial compreender o papel central e indispensável do livro no trabalho missionário, não importa o nível de comprometimento com a missão.

Outro ponto fundamental é entender que não podemos ser arrogantes em nome de Deus. Queremos, sim, transformar a sociedade ao introduzir a ciência espiritual do yoga e do amor devocional, mas não conseguiremos este objetivo demonstrando desprezo às normas da sociedade ou contrariando a cultura vigente. A história demonstra claramente que quem despreza a sociedade é por ela desprezado. Existe uma inteligência aplicada em participar de um grupo, e ao mesmo tempo guiá-lo e modificá-lo. Neste contexto é que cabemse tornam essenciais as discussões sobre termos comoo tema de “inserção social” ou sobre o tema de “entender “o que é védico”. Ao estarmos inseridos na sociedade temos o poder de afetá-la. Excluídos dela, nada podemos fazer. Não se trata de modificar nossa mensagem, mas sim apresentá-la de forma relevante e atual. Como a sociedade está em constante transformação, não podemos nos prender a soluções do passado. Precisamos estar com o “dedo no pulso”, sabendo inteligentemente apresentar a consciência de Krishna para as pessoas ao nosso redor.

Meu apelo é de que reacendamos o espírito missionário. Não de forma saudosista ou retrógrada, mas de forma madura e inteligente. Resumindo, devemos compreender que a ocupação no trabalho missionário é, primeiramente, vantajosa para o individuo que deseja saborear a vida transcendental, sendo uma técnica consagrada para elevar a consciência. Vamos, cada um de nós, Devemos nos lembrar todos os dias que temos a opção de sair da vida egoísta ilusória mundana e entrar, de corpo e alma, na vida divina, na “lila” de Deus. Segundo, devemos entender que agir em harmonia com os desejos de Deus é um direito nato e razão de ser de todo ser vivo.  Não é uma prerrogativa de uma classe de pessoas especialmente dotadas ou algo disponível apenas para os que não têm qualquer outra ocupação na vida. Temos tTodos nós temos, ao nosso alcance, esta oportunidade de participar das atividades de Deus.  Terceiro, devemos entender que a ISKCON é uma sociedade missionária e todos que se identificam com ela devem usufruir da principal benção que ela nos oferece, que é de nos dar a oportunidade de compreender e nos ocupar nesta vida transcendentade “turbinar” nossa vida espiritual e de tornar nossa vida repleta do néctar da vida transcendental, fazendo o tipo mais elevado de caridade, a forma mais intensa de satisfazer Deus.  Krishna diz no Bhagavad-gita (18.68-9):

“Para aquele que explica aos devotos este segredo supremo [da consciência de Krishna], o serviço devocional puro está garantido, e no final, ele voltará a Mim. Não há neste mundo servo que Me seja mais querido do que ele, nem nunca jamais haverá alguém mais querido.” 

Nossa filosofiaTodas as principais escrituras do mundo nos ensinam que a perfeição da vida é agradar Deus. Neste verso do Bhagavad-gita, de forma tão clara, Ele Deus nos ensina como fazer isto.  É tão simples e sublime. Se quisermos experimentar a consciência de Deus, se quisermos nos livrar dos grilhões da consciência mundana, aqui está a solução mais eficaz e atraente. Vamos então aceitar este convite e tornar nossa vida gloriosa feliz, gratificante e cada vez mais repleta de amor divino.


Amor, Paz e Caridade

Um verso muito importante do Bhagavad-gita* diz o seguinte: “Há três portões que conduzem a este inferno — a luxúria, a ira e a cobiça. Todo homem são deve afastar-se destes desvarios, pois eles conduzem à degradação da alma” (BG 16.21). É a conclusão de uma fascinante descrição que Krishna faz acerca da mentalidade demoníaca e de seus efeitos e causas, que começa no verso 16.7. Essa descrição existe não para apontarmos o dedo para o outro em reconhecimento delas, mas para reconhecermos em nós mesmos essas falhas, e assim começar o processo de cura.

Devemos seriamente pesquisar e praticar esse processo de cura, se estamos realmente interessados em avançar espiritualmente ou, para usar um termo comum hoje em dia, seguir adiante no nosso processo de ascensão.  Krishna aqui deu-nos o caminho das pedras ao mostrar o caminho inverso, o da degradação da alma. Da mesma forma que se usa a própria causa da doença para encontrar ou desenvolver o seu antídoto, assim também podemos pegar esses três poderosos vírus da alma para encontrar seus respectivos antídotos.

Começando de trás para frente, vamos primeiro meditar em cobiça. Cobiça (lobha, em sânscrito) é o desejo de obter o domínio ou posse de coisas para si mesmo, para seu prazer egocêntrico. Infelizmente, nossa sociedade consumista gira em torno desse princípio e a todo lado somos bombardeados com impulsos que reforçam essa doença da alma. O contrário da cobiça, seu antídoto mais forte, é a caridade. Krishna explica no Bhagavad-gita (18.3) que nunca se deve abandonar a caridade, não importa quão avançado estejamos em auto-realização. A caridade é um ponto central dos ensinamentos do Senhor Jesus, como também foi do Profeta Maomé.

Agora que temos o remédio, precisamos saber como aplicá-lo. Krishna explica que existem diferentes tipos de caridade (de acordo com os modos da natureza material) nos versos 17.20-22 do Bhagavad-gita: “A caridade dada por dever, sem expectativa de recompensa, no local e hora apropriados e dada a alguém digno, está no modo da bondade. Mas a caridade executada com expectativa de alguma recompensa, ou com desejo de resultados fruitivos, ou com má vontade, diz-se que é caridade no modo da paixão. E a caridade executada em lugar impuro, em hora imprópria e feita a pessoas indignas ou sem a devida atenção e respeito, diz-se que está no modo da ignorância.” Acima disso, Ele explica que o ato de caridade feito sem fé no Supremo é inútil, tanto nessa vida como na próxima (BG 17.28). Indo mais além, Srila Prabhupada sempre nos mostrou e ensinou que a maior caridade de todas é ajudar os demais no avanço espiritual. Da mesma forma que estamos sendo constantemente influenciados a praticar a ganância, devemos igualmente ficar constantemente meditando na caridade, se quisermos combatê-la completamente. Não basta dar algum dinheiro para uma instituição beneficente uma ou outra vez por mês ou dar esmolas no semáforo. Devemos mesmo praticar o mais elevado nível de caridade constantemente, ao estar sempre meditando em como podemos usar cada momento que estamos vivendo e tudo que possuímos para ajudar o próximo a avançar espiritualmente.

O segundo portão da consciência demoníaca é a ira (krodha, em sânscrito). Nos versos 2.62-3 do Bhagavad-gita, Krishna explica como surge a ira: “Enquanto contempla os objetos dos sentidos, a pessoa desenvolve apego a eles, e de tal apego se desenvolve a luxúria, e da luxúria surge a ira.” Portanto, a luxúria e a ira agem juntos. É dito que a ira é o irmão caçula da luxúria. Se quisermos evitar a ira, devemos, antes de tudo, evitar a luxúria, o portão infernal mais difícil de se evitar. A outra forma de combater a ira é cultivando seu antídoto: a paz. Mesmo não podendo evitar a luxúria por completo, podemos ficar cientes de nossos estados psíquicos e atentos ao surgimento de algo tão maléfico quanto a ira. A ira é facilmente reconhecida, ao passo que a luxúria pode ser bastante sutil. Krishna explica no Gita, no verso 3.40, que a luxúria se permeia por nossos sentidos, mente e inteligência, tornando-a um inimigo formidável. A ira, por outro lado, pelo menos em sua forma manifesta, é muito fácil de detectar, o que nos permite, com um mínimo de vigília ao nosso estado de consciência, impedi-la de seguir seu curso de ação na forma de palavras estúpidas e grosseiras ou atividades destrutivas, intencionando a dor de um outro ser ou até de nós mesmos.

Cultivar a paz significa cultivar um estado mental equilibrado, livre de agitação excessiva. Muitos fatores influenciam o estado mental. Um dos mais importantes é a dieta, quem a preparou, como também onde e como foi feita a refeição. Outro fator muito importante é o tipo de música ou imagem que se absorve no dia a dia. Muitas músicas populares e praticamente tudo que se vê na TV (até mesmo noticiários tem sido identificados como fontes de medo e estresse na vida moderna) agitam nossa mente de forma muito intensa. Já foi cientificamente comprovado que fazer exercícios físicos é muito importante para manter um estado mental saudável, especialmente aqueles que trazem uma certa sabedoria holística de bem-estar, como caminhadas em lugares agradáveis, yoga e certas práticas de arte marcial como Tai Chi Chuan. Certos fatores são mais difíceis de evitar, como a poluição sonora e atmosférica das grandes cidades, ou ainda ambientes de competição, frustração e infelicidade no local de trabalho. Em todo caso, devemos ficar cientes que temos o poder de trazer a paz para nossa vida ao ajustar a forma em que vivemos e especialmente a forma em que interagimos com o mundo. Na medida que cultivamos a paz, fecharemos o portal da ira não só na nossa vida, como também ajudaremos a fechá-lo para os outros. Como a ira, a paz é contagiante e influencia aqueles a nossa volta.

O primeiro e mais largo portal para a consciência infernal é a luxúria. Infelizmente em nossa atual sociedade, o termo luxúria foi ridicularizado como algo careta e repressor. Algo bobo, ingênuo, que não é mais aplicável em nossas modernas, divertidas vidas de liberdade plena, livre da opressão das religiões. O resultado se vê a nossa volta na forma de um mundo a beira de um cataclismo ecológico e/ou econômico, acelerada degradação social, etc.

A luxúria não significa simplesmente desejar sexo. Luxúria significa desejar se satisfazer, para o prazer egoísta, indiferente do que isso implica para os outros. Significa colocar a satisfação imediata de seus sentidos acima de qualquer outra consideração, inclusive de sua própria saúde mental e física, o que dizer do bem-estar de outros. Luxúria significa que quero usar a realidade, tanto os recursos materiais como as pessoas a minha volta, exclusivamente para resolver minhas questões egocêntricas. Eu, eu, eu! Abusar dos outros, ferir sentimentos, ignorar a moralidade, destruir o planeta... Nada disso é um obstáculo para as atividades da luxúria. Nem mesmo o infanticídio (aborto) e genocídio são levados em consideração sob a influência da luxúria. Se o aborto irá trazer mais oportunidades para o prazer egocêntrico da mãe, então por que não realizá-lo?  Se nossa comunidade terá mais oportunidades para o prazer egocêntrico destruindo um rio ou floresta e assim matando todos os animais que dependem dele, porque não seguir em frente? Assim funciona a consciência demoníaca infernal sob a influência da luxúria.

Sendo a luxúria o vírus mais poderoso da consciência, não é de se surpreender que seu antídoto também seja o remédio mais poderoso de todos: o amor. Amor significa agir para o bem do amado, totalmente livre de qualquer consideração pessoal. Cada gotinha de consideração pessoal é uma gotinha de luxúria que enfraquece o amor. O grande segredo que temos que redescobrir é que não há nada mais agradável para nós mesmos que agir em puro amor, e nada mais desagradável que agir em pura luxúria. Ou seja, na medida que agimos sem pensar em nossa egocêntrica satisfação, mais satisfação obtemos! É algo aparentemente contraditório, mas a inescapável e maravilhosa verdade acerca da realidade criada por Deus. Nossas vidas oferecem ilimitadas oportunidades de praticarmos o amor puro, não só em relação a todos que cruzam nossa trajetória de vida, inclusive os que apenas aparecem por um breve momento numa fila de banco ou nos corredores, mas também em relação a todos seres vivos do planeta, na maneira que nos comportamos em relação à Mãe Terra (Bhumi Devi, em sânscrito).

Não é preciso muita reflexão para compreender que qualquer ato antiecológico, como consumo desnecessário de plásticos, a compra de alimentos desnecessariamente industrializados, o desperdício de água ou energia elétrica, etc. é um sintoma de luxúria, uma falta de amor. Isso porque estamos agindo pensando em nosso imediato prazer e bem-estar e ignorando o nosso próprio bem-estar futuro ou de gerações futuras, e o bem-estar de Bhumi Devi. A conclusão inevitável é que agir de forma antiecológica é um sintoma de falta de avanço espiritual.

O Senhor Sri Krishna Caitanya Mahaprabhu disse: “prema pum-artho mahan” – o amor é o objetivo último do ser vivo. O amor por si só é um remédio tão poderoso que não só acaba com a luxúria, mas com todos os demais vírus da consciência, da mesma forma que um antibiótico muito poderoso, feito para acabar com o pior tipo de bactéria, acaba com as demais bactérias mais fracas também. Assim, a prática do amor é absolutamente indispensável e importante para todos aqueles que desejam atingir a consciência divina e, como tal, precisa ser praticada constantemente.

É preciso sempre estar consciente das nossas motivações em tudo que façamos. Precisamos ter muito cuidado para detectar a motivação egoísta e, portanto, luxuriosa, em nossos atos e relacionamentos. Como dito antes, a luxúria é muito sutil e permeia toda nossa existência material. Assim sendo, é necessário um nível de atenção muito elevado e refinado para detectarmos sua presença. Isso não é fácil e não acontecerá do dia para noite. É tarefa mesmo para o resto de nossas vidas condicionadas!

Praticando bhakti-yoga, de forma imotivada e constante (ahaituky apratihataSrimad-Bhagavatam 1.2.6), automaticamente nos situamos longe desses três portões da consciência infernal, pois bhakti é justamente a ciência da consciência, a técnica que limpa nosso coração (ceto-darpana marjanam – Siksastaka 1) ao direcionar nossa consciência rumo ao Divino. Esses três poderosos remédios, amor, paz e caridade, surgem no decorrer de uma prática eficaz e sincera de bhakti-yoga. Cabe-nos apenas cultivá-los ao máximo para fortalecer nossa prática e encurtar nossa volta ao lar, ao Supremo, ou seja, nossa volta à consciência divina.

* Traduções tiradas do Bhagavad-gita Como Ele É, de Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada, fundador-acharya da ISKCON.


Hinduísmo


por Giridhari Das

A definição técnica e jurídica do termo Hinduísmo foi dada pela Suprema Corte da Índia, que definiu hindu como sendo aquele que aceita os Vedas como sua escritura.

Os Vedas são um vasto corpo de literatura, onde destaque-se as quatro escrituras (samhitas) Rg, Yajur, Sama e Atharva-Vedas, os Puranas (cujo principal é o Srimad Bhagavatam), o Mahabharata (do qual o Bhagavad-gita é a seção mais importante), Vedanta-sutra e Upanishads (do qual o Sri Isopanisad é um dos mais importantes). As quatro samhitas básicas não são práticas para nós, pois descrevem atividades que não podem ser realizadas nessa era (de acordo com os próprios Vedas). Basicamente esses textos descrevem elaborados sacrifícios e seus respectivos mantras para obtenção de ganhos materiais e promoção a planetas superiores dentro do universo material. Tecnicamente esse tipo de prática é chamada de karma-kanda. Porém, os Vedas nos ensinam que além de karma-kanda existem os processos de yoga (jnana, astanga e bhakti) que nos proporcionam resultados muito mais importantes que a mera religião materialista ou atividade piedosa.

Estamos habituados a entender o termo yoga como sendo algum tipo de exercício físico. Mas, na verdade, a palavra significa “ligar, conectar”. E também é usada para descrever um processo, uma ciência. Portanto, essas diferentes práticas de yoga são, na verdade, diferentes processos de se re-conectar (religar – religare – religião) com Deus.

O Srimad Bhagavatam (1.2.11) explica que Deus pode ser visto de três maneiras distintas: 1) Brahman: Seu aspecto impessoal, todo penetrante, energia cósmica, luz divina; 2) Paramatama: Seu aspecto localizado dentro de todo ser vivo; e 3) Bhagavan: Seu aspecto pessoal supremo.

Simplificando bastante, pode-se entender que jnana-yoga é o processo de obter Brahman, astanga-yoga é o processo de obter Paramatma e bhakti-yoga é o processo de se obter Bhagavan, a Suprema Personalidade de Deus.

E, de todos as práticas de yoga, Krishna (um nome de Deus que significa o todo-atraente) explica no Bhagavad-gita, no verso 6.47, que a prática superior é bhakti-yoga (consciência de Krishna). A conclusão é que a essência de todo o conhecimento védico é a pura consciência de Krishna — essa declaração se encontra no Bhagavad-gita, onde Deus, Krishna, diz: "Através de todos os Vedas, é a Mim que se deve conhecer. Na verdade, sou o compilador do Vedanta e sou aquele que conhece os Vedas" (15.15). Explico melhor esse processo de bhakti-yoga, ou consciência de Krishna, no livro Ciência Espiritual – Visão Geral e Prática. No ocidente essa prática, também denominada de Vaishnavismo, foi introduzida e continua sendo largamente difundida pela Sociedade Internacional para Consciência de Krishna (ISKCON), popularmente conhecida como o Movimento Hare Krishna.

Para entendermos o atual uso do termo “hinduísmo” devemos analisar sua história, dividindo-o em três principais períodos.

O primeiro, que podemos chamar de antigo ou védico, é marcado pela total inexistência do termo. Hindu ou hinduísmo simplesmente não existiam na antiguidade e nunca foram usados em qualquer escritura. Esse termo foi criado pelos invasores do que hoje chamamos de Índia. Quando Alexandre, o Grande, invadiu a Índia em 325 a.C. ele cruzou o rio Sindhu, que fica onde hoje é o Paquistão, e o chamou de Indus, por ser mais fácil de pronunciar em grego. Em grego o “h” é silencioso como ainda vemos hoje em palavras como homo, herói e nomes como Helena, Hércules, Heitor, etc. Assim, as terras ao leste desse rio ficaram conhecidas como “Índia”. Muitos séculos depois, os invasores muçulmanos chamaram o rio de Hindu, pois tinham dificuldade de pronunciar Sindhu e as terras ao leste do rio ficaram chamadas então de “Hindustan”.

O segundo período, marcado pela presença já consumada de invasores muçulmanos na Índia, dura do século quatorze ao século dezenove. Nessa época, o termo era usado pelos seguidores dos Vedas apenas quando os mesmos se dirigiam aos muçulmanos. Entre eles, o termo não era usado. Ou seja, como os invasores rotularam todos os habitantes nativos de “hindus”, os mesmos usavam o termo para fins práticos. Mas, como entre eles o termo não havia verdadeiro sentido, não havia outro uso do termo. Isso está muito bem documentado e preservado na literatura medieval da Índia, em livros como o Caitanya Bhagavata.

Em sânscrito encontramos dois termos que descrevem esse tipo de comportamento: paramartika e vyavaharika. Paramartika é a linguagem para descrever o sentido último das coisas, uma linguagem filosófica e profunda. Vyavaharika é a linguagem comum, para assuntos do dia a dia. Por exemplo, ao abrir uma conta no banco, temos que preencher um cadastro. Eles lhe perguntam seu nome, data e local de nascimento, etc. Se respondermos que não temos local e data de nascimento porque somos seres espirituais eternos, em pouco tempo estaremos sendo conduzidos para fora do banco pelos seguranças. Temos que usar uma linguagem prática – vyavaharika. E, por outro lado, se estamos tentando compreender assuntos filosóficos, metafísicos e espirituais mas apenas nos identificamos com nossas designações externas, então novamente não teremos muito sucesso. Nessa situação teríamos que usar uma linguagem profunda – paramartika. Então, o que vemos nesse segundo período é o uso de “hindu” no sentido vyavaharika, mas não paramartika. Ou seja, nenhum seguidor dos Vedas considerava que isso era um termo que realmente o identificava em termos espirituais ou filosoficamente profundos. Era apenas uma designação externa que era prática de se usar em certas circunstâncias.

Devemos entender que a cultura védica é muito liberal e não sectária. Sempre foi assim. No Vedas, encontramos o seguinte verso:

“A suprema ocupação [dharma] para toda a humanidade é aquela pela qual os homens possam atingir o serviço devo­cional amoroso ao Senhor transcendental. Este serviço devocional tem que ser desinteressado e ininterrupto para satisfazer o eu completamente” (Srimad Bhagavatam, 1.2.6).

Aqui, não se fala que tem que se adorar uma forma específica do Senhor ou seguir uma doutrina e não outra. A questão é técnica, cientifica. É algo onde se compreende que o importante é o conhecimento (veda significa conhecimento em sânscrito) e que esse conhecimento explica que existem diferentes caminhos para diferentes pessoas – com diferentes resultados. Então, o que se via eram diferentes grupos seguindo diferentes caminhos, mas com a compreensão correta do que cada um estava buscando. Um exemplo grosseiro para melhor entender o ponto pode ser visto em um restaurante. Lá, todos estão com o mesmo cardápio, mas diferentes pessoas pedem diferentes pratos de acordo com seu gosto. Mas todos entendem que estão fazendo a mesma coisa, comendo, e todos reconhecem o cardápio como sendo um só. O ponto aqui é entender que não fazia parte da cultura védica o tipo de violento sectarismo que sempre fez parte das culturas religiosas do Oriente Médio e a concomitante necessidade de rotular as pessoas de acordo com suas crenças. Portanto, com raríssimas exceções, não se vê na história da civilização védica (apesar de ser a mais antiga da Terra ainda existente) conflitos violentos entre pessoas de diferentes compreensões espirituais. É apenas no período moderno que uma certa classe de pessoas mais ignorantes adotaram esse tipo de comportamento sectário, após séculos de domínio sob invasores altamente sectários.

O último período, que podemos chamar de moderno, começa no século dezenove e é marcado pelo uso do termo como é visto hoje. Nesse período moderno os seguidores dos Vedas se auto-rotulam como hindus e sua religião como sendo hinduísmo. Além disso, o termo “hindu” ainda foi adotado para simplesmente indicar alguém que nasceu na região, independente de sua fé ou filosofia de vida.

Durante o domínio Inglês, os políticos usavam o termo “hindu” ou “hinduísmo” de forma pejorativa, para acirrar a distinção entre muçulmanos e a população que seguia suas tradições antigas. Isso fazia parte da política inglesa de “dividir e dominar”. Escritores ocidentais adotaram o termo por ser conveniente e os demais foram influenciados por eles.

Devemos recordar que os ingleses adotaram uma política extremamente agressiva contra a cultura védica. Era a expressa e documentada missão dos ingleses fazer com que os seguidores dos Vedas abandonassem suas práticas e cultura e adotassem o cristianismo e a cultura deles. Com a chegada da modernidade, com trens e telégrafos, a difusão do conhecimento aumentou enormemente. Isso estava sendo usado pelos ingleses para acelerar seu objetivo. Sentindo-se ameaçados, um grupo de pessoas, liderados por Vivekananda e pelo Doutor Radhakrishna, iniciaram um movimento para unir os seguidores dos Vedas. Eles pensavam que, para resistir a esse maciço ataque cultural, precisavam defender uma única filosofia, uma única bandeira.

Como foi explicado anteriormente, na cultura védica existe uma enorme variedade de crenças, que incluem crenças panteístas de religião materialista, sistemas de filosofia impersonalistas, processos de misticismo e filosofias completamente teístas. Temendo que isso os estava enfraquecendo, essas pessoas, em especial Vivekananda, acharam por bem escolher um dos caminhos e dizer que isso era hinduísmo. Ele escolheu a filosofia impersonalista de Shankaracarya (um tipo de prática de jnana-yoga). Devido a sua influência, a rápida difusão de conhecimento da era moderna e a falta de correta e filosófica compreensão dos Vedas da população em geral, essa decisão logo se concretizou. Hoje, em livros sobre hinduísmo, em cursos universitários e na visão geral daqueles que se denominam de hindus, essa é a compreensão da cultura védica. Não só foi escolhida a filosofia de Shankaracarya, mas, o que é pior, uma versão popular e bastante frouxa de sua filosofia. Acadêmicos reconhecem que Vivekananda tinha pouco conhecimento sobre os Vedas, o que pode ser verificado ao ler as transcrições de suas palestras. Um exemplo disso é visto na sua palestra no final do século dezenove numa conferencia mundial de religiões em Chicago, onde ele disse que o conceito de pecado não existia no Hinduísmo, apesar de termo ser absolutamente comum em toda literatura védica, inclusive a principal, o Bhagavad-gita. Na verdade ele era uma espécie de político.

Essa decisão, do ponto de vista filosófico e espiritual, foi desastrosa por ignorar completamente a riquíssima amplitude da verdadeira cultura védica, em especial a elevada filosofia e cultura monoteísta Vaishnava (bhakti-yoga). Até mesmo do ponto de vista estritamente numérico é falha, pois pesquisas mostram que 60% dos hindus acreditam num Deus pessoal.

Portanto, uma compreensão mais profunda e verdadeira sobre o Hinduísmo teria que levar em consideração essas diferentes práticas e caminhos espirituais descritos nos Vedas. Interessante notar que existe uma diferença muito maior em termos filosóficos e práticos entre esses diferentes caminhos védicos do que entre judaísmo, cristianismo e islamismo. Isso mostra como é inadequado querer aglomerar todos sob um único termo. Felizmente, está havendo uma mudança nessa errônea compreensão e a verdadeira riqueza espiritual dos Vedas está sendo conhecida por cada vez mais pessoas.


 

Biografia



Giridhari Das (Gustavo Dauster)

-          Nascido em Praga, Tchecoslováquia, 6 de maio de 1969
-          1ª Iniciação em 1998, sob o guru Srila Hridayananda Das Goswmami Acharyadeva, membro da ISKCON e discípulo de Sri Srimad A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada, fundador-acarya da ISKCON
-          2ª Iniciação em 2001
-          Casado com Carana Renu DD em 26 de setembro de 2008

Estudos

1979-1987      American School in London, Londres, Inglaterra
Middle and High School
1987-1988      Brown University, Providence - Rhode Island, EUA
1989-1991      Universidade de Brasília, Brasília, Brasil
1999                Diploma em Economia, Charter Oak State College,
New Britain, Connecticut
2003                Diploma de Bhakti-shastri, com menção de honra

Ocupação em Auto-realização e Yoga

1998-presente - Coordenador do Programa Amigos de Krishna

2001-2010 - Presidente da Associação BBT Brasil (Editora da ISKCON)
2004-presente - Presidente e fundador da ONG Paraíso dos Pândavas
2005-presente - Membro do CGB (Conselho Governamental do Brasil)
2008-2010 - Vice-Presidente e membro do Comitê Executivo do CGB
2009-2011– Membro do Conselho Nacional de Nova Gokula
2010-2011 - Presidente e membro do Comitê Executivo do CGB
2011-2013 – Secretário Zonal para a ISKCON Brasil
2013-presente – Membro do Brazil Regional Team do Krishna West
2013-presente – Membro do Global Board do Krishna West

Livros Publicados (em Português)

Ciência Espiritual - Uma Introdução à Sabedoria do Yoga, 2005
Yoga Sutra de Patanjali - Uma Abordagem Prática, 2007
-  Publicado também em Chinês em 2008 (9000 exemplares), e em Polonês em 2011.
Método 3T, 2012

Notas:
- ISKCON - Sociedade Internacional da Consciência de Krishna - www.harekrishna.com.br.
- Bhakti-shastri é um título da ISKCON que é concedido apenas a aqueles que demonstram grande competência na compreensão filosófica das escrituras védicas.
- Amigos de Krishna é o programa da ISKCON do Brasil de aconselhamento e ensino de bhakti-yoga à distância.
- A BBT (Bhaktivedanta Book Trust) é a maior editora de livros de filosofia védica do mundo.
- ONG Paraíso dos Pândavas é uma OSCIP dedicada a difusão dos valores do yoga, ecologia e assistência social.
- O CGB é órgão administrativo máximo da ISKCON do Brasil.
- RGB – Regional Governing Body, corpo administrativo regional da ISKCON mundial.
- Nova Gokula é a projeto rural mais antigo e proeminente do Brasil - www.novagokula.com.br.
- O livro “Yoga Sutra - Uma Abordagem Prática” já está disponível em 5 idiomas (Português, Chinês, Polonês, Inglês e Espanhol)

 Li-Sol-30

 Giridhari.com.br

Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres. 
Sejam abençoados todos os seres.

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