Synphonien Nr.35,40,41 - Wolfgang Amadeus Mozart
- Herbert von Karajan - 66min.
Uma análise teológica de Alice no País das Maravilhas
Por Daniel John Clark
Aluno do Segundo Ano do STBC
1.0 Introdução
Muitos conhecem a história de Alice no
País das Maravilhas apenas nas versões simplificadas para crianças ou no
filme de Walt Disney . Porém nesse trabalho nós nos basaremos no
"Annotaded Alice" comentada por Martin Gardner e que contém a versão
original das duas histórias
sobre Alice : "Alice no País das Maravilhas" e "Alice através do Espelho."
Iremos concentrar nas várias filosofias
apresentadas de maneira cômica nas duas histórias e na sua relevância
para estudantes de teologia , concluindo como uma análise do discurso de
Paulo no "Aerópago" de Atenas como um paradigma do confronto cristão
com a filosofia secular e pagã .
Esperamos que esse trabalho possa mostrar um pouco mais da grande profundidade dessa obra prima da literatura inglesa .
2.0 Dados Biográficos
"Eu vi um homem muito velho , sentado no portão ."
Lewis Carroll foi o pseudônimo adotado pelo
Reverendo Charles Lutwidge Dobson , nascido em 1832 na cidade de
Daresbury , em Cheshire , Inglaterra . A sua família tinha 11 filhos
sendo quatro homens e sete mulheres.Nesse ambiente predominantemente
feminino Carroll cresceu para ser um jovem sensível , religioso e tímido
.
Carroll formou-se em Matemática na Christ Church
College em Oxford aonde ele viria a ser palestrante . Aos 29 anos ele
foi ordenado como diácono da Igreja Anglicana mais nunca foi ordenado
sacerdote .Além das suas duas obras primas a respeito de Alice Carroll
escreveu um poema popular "Sylvie e Bruno" e outras obras de menor sucesso .
Um homem solitário , sem nunca ter se casado , a
vida particular de Carroll era destacada pela sua excêntrica amizade com
crianças , especialmente meninas . A uma delas , Alice Liddell ,
Carroll dedicou as duas histórias que serão analisadas nessa monografia
.
Sempre tendo uma vida particular discreta Carroll veio a falecer em 1898 .
2.1 Resumo das Duas Histórias
"Dessa maneira nasceu o conto do país das
maravilhas , vagarosamente uma a uma , os seus episódios foram criados ,
e agora o conto está pronto ."
2.1.1 Alice no País das Maravilhas
Nessa história Alice decide seguir um coelho
branco falador que estava olhando para o seu relógio através de um
buraco e cai numa terra estranha cheio de personagens malucos e confusos
. Depois de percorrer essa terra Alice volta à normalidade e descobre
que estava sonhando . Essa história foi contada por Carroll para Alice e
sua irmã durante um passeio e destaca-se por sua extrema espontaniedade
.
2.1.2 Alice através do Espelho
Desta vez Alice atravessa o espelho e entra
numa terra estruturada como um jogo de xadrez a qual ela precisa
atravessar para tornar-se uma rainha . Essa história não tem a mesma
espontaniedade da anterior mas em compensação mostra um preparo melhor
da parte de Carroll sendo mais atraente para leitores adultos . Essa
história nos interressará mais pois muitos dos personagens que ela
encontra representam filosofias diferentes existentes na época de
Carroll e os quais são relevantes para nós aspirantes a teólogos .
Novamente no fim da história Alice descobre que estava apenas sonhando .
2.3 A Razão de uma Monografia sobre Alice
"E nós somos apenas crianças mais velhas , querida , chateados ao descobrir que é hora de dormir."
Nesse momento o leitor mais atento , e mais
crítico , deve estar se indagando , porque fazer uma monografia num
curso de teologia , sobre um livro feito para crianças . Como
justificativa apresento as seguintes razões :
- O livro não é escrito apenas para crianças e têm atraído cada vez mais adultos , sendo um dos livros mais citados em palestras e em discursos .
- O livro explora brilhantemente e de maneira cômica e accessível , profundas questões filosóficas .
- Creio que como seminaristas nós muitas vezes somos como Alice , nos achamos ingenuamente e inocentemente no meio de uma terra estranha , cheio de filosofias e idéias estranhas e muitos personagens ( Sartre , Nietzsche , Bultmann , Aitzer , Hamilton) que nos parecem malucos . Infelizmente nós não podemos , como Alice , simplesmente acordar e descubrir que tudo não passou de um sonho .
- Esse livro já tem sido submetido a várias análise e interpretações : psicanalíticas , linguísticas e filosóficas e creio que uma análise teológica seria um acréscimo interessante nesse processo .
- Esse livro têm sido uma das grandes influências na estruturação ( ou des-estruturação ! ) da minha maneira de pensar e é o meu livro predileto da literatura inglesa .
"Quem nesse mundo eu sou? Ah ! Esse é o grande enigma ."
3.0 Conceitos Filosóficos Abordados por Carroll em Alice
Nessa seção iremos nos juntar com Alice num
passeio pelo País das Maravilhas e A Terra do Espelho e encontrar
várias formas diferentes de pensar .
3.1 Uma Conversa com um Lagarto
Uma das características da primeira
história são as constantes alterações no tamanho da Alice . Por isso
quando o Lagarto a pergunta : "Quem é você ?" Alice responde :
" Eu não sei , Senhor –nesse momento- pelo menos
eu sabia quem eu era quando acordei hoje de manhã , mas eu creio que eu
devo ter mudado diversas vezes desde então."
Essa dúvida que Alice tem reflete o
espírito contemporâneo devido ao ataque pós-modernista ao eu cartesiano
que desde Descartes caracteriza o pensamento moderno . A nossa ciência
moderna está baseada no eu consciente e racional que existe a parte do
corpo e desejos e que percebe o mundo ao seu redor como sendo objeto . O
ser humano ideal do iluminismo é o cientista racional que consegue
evitar que suas emoções e desejos irracionais interferem na sua busca do
conhecimento e que portanto pode chegar à única e objetiva verdade .
Todavia atualmente este eu cartesiano está sendo substituído pelo
conceito de Heidegger de :
" seres … no mundo emaranhados em redes sociais ."
Dessa maneira o eu pós-moderno encontra se
fragmentado e dissolvido no seu contexto social e cultural , não
existindo mais a separação entre o sujeito e objeto ou entre o racional
e irracional . Consequentemente ninguém pode ter certeza se é a mesma
pessoa que acordou de manhã .
3.2 O Gato de Cheshire e a Filosofia do Absurdo
Mais adiante Alice encontra-se com um gato
e ao perguntar-lhe que tipo de pessoas habitavam na sua terra ela
escuta a seguinte resposta :
"todos somos malucos aqui . Eu sou maluco , você é maluca ."
Portanto além de habitarmos num mundo aonde o
eu encontra-se dissolvido e fragmentado , esse é um mundo aonde todos
são malucos . Na verdade um detalhe é consequência do outro , se não
existe um eu consciente para ordenar o mundo e nossa compreensão dela ,
tudo não passa de um caos , do absurdo .
Essa visão do gato de Cheshire reflete a posição do existentialista que segundo David Cook :
"crê que não há significado em nada , ou em tudo
colocado junto . O mundo é absurdo e sem sentido . Ser humano é escolher
face ao absurdo desse mundo."
Essa escolha perante o absurdo é
denominado pelos existencialistas como o processo de "autentificação"
mediante a qual a pessoa afirma a sua humanidade num mundo definido por
Sartre como sendo um mundo na qual é impossível encontrar "valores"
quaisquer .
Todavia
, conforme critica o filósofo cristão Francis Schaeffer a escolha que
nos torna humanos em si é vazia pois o seu conteúdo não importa .
Schaeffer cita como exemplo o próprio Jean-Paul Sartre que afirmava que
ao observamos uma velhinha atravessar a rua não havia diferença entre
ajudar-lá ou atropelá-la pois em ambos os casos estávamos escolhendo ,
sendo humanos .
Na teologia um exemplo de tal posição é encontrada
em Rudolf Bultmann . Levado por sua exegese a duvidar do valor
histórico das escrituras e interpretar-lás como sendo míticas Bultmann
afirma que Deus não está mais presente na história mas na experiência
subjetiva do homem histórico . Dessa maneira a fé destaca-se por trazer
até nós subjetivamentee uma nova possibilidade de existência .Todavia
como crítica Etienne Higuet:
" Bultmann substitui a questão da responsabilidade
por um mundo de justiça no seio de uma história social e política pela
questão de uma existência em acordo consigo mesma."
Como no existencialismo de Sarte o conteúdo da
experiência existencial perde o seu valor e o ser humano apenas se
autentifica num mundo na qual ele não pode transcender o seu
individualismo .
Como teólogos cristãos não podemos cair na
armadilha do existencialismo pois compete a nós trazer significado e
mostrar o próposito divino nesse mundo criado por Deus .
3.3 A vida como um jogo de Xadrez
Na segunda história ao olhar sobre a
terra Alice percebe que ela tem o formato de um jogo de xadrez . Ela
pergunta à rainha vermelha se ela pode participar e escuta a seguinte
resposta:
"Você pode ser o peão da Rainha Branca já que a
Lily é jovem demais para brincar , e você começará no Segundo Quadrado e
quando chegar ao oitavo quadrado você será uma rainha ."
Esse tema da vida como um jogo de Xadrez
aparece diversas vezes na literatura e na filosofia especialmente em
relação ao problema do determinismo . Até que ponto os seres humanos são
livres para agir e até que ponto as suas ações são determinadas por
forças fora do controle deles ?
Por exemplo em seu livro The Undying Fire H.G Wells começa a sua história com uma conversa entre Deus e o diabo que estão jogando Xadrez :
"O Rei do Universo cria o tabulareiro , as peças e
as regras , ele faz todos os movimentos … o seu antagonista pode porém
introduzir um certo elemento de erro que precisará de correção ."
Na teologia essa questão surge na polêmica a
respeito da doutrina da predestinação formulada por Agostinho e
elaborado por João Calvino . Nessa visão o que determina o destino
eterno de Deus é a soberana vontade de Deus .Todos os seres humanos
estão destinados ao inferno mas pela sua graça ele escolhe alguns para
serem salvos enquanto que os outros são na prática escolhidos para não
serem salvos . Efetivamente os seres humanos são portanto reduzidos a
peças de xadrez cujo destino é determinado por forças fora do seu
controle . Um argumento tradicional usado pelos calvinistas é que o
termo "predestinação" aparece na Bíblia mas o termo "livre arbítrio" não
.
Naturalmente tal visão nunca foi facilmente
aceita por Cristãos e sempre tem havido na teologia a busca de
introduzir um espaço para a liberdade do ser humano na definição do seu
destino eterno desde o pelagianismo ao arminianismo . Nesse contexto é
interessante observar que a Declaração Doutrinária da Convenção Batista
Brasileira busca reconciliar uma posição basicamente arminiana com a
ênfase calvinista sobre a soberania de Deus .No nosso pensamento batista
Deus continua controlando o jogo de xadrez , mas as peças ainda tem
liberdade de decidirem o seu destino . Tal visão teria a simpatia de
Lewis Carroll pois na sua história Alice age com autonomia .
Biblicamente a posição de Carroll aparece no
Livro de Jó . Superficialmente Jó parece ser uma vítima de uma discussão
cósmica entre Deus e o diabo a respeito da sua fidelidade .Todavia numa
análise mais profunda percebemos Jó agindo com bastante autonomia . É
sua a decisão de não blasfemar contra Deus , todavia ele não hesita em
negar que seu sofrimento seja consequência de seu pecado e a desafiar o
próprio Deus para explicar a sua situação .Na Bíblia os seres humanos
não tem controle total sobre as suas vidas , mas também são muito mais
do que peças manipuladas em um jogo .
3.4 A floresta onde as coisas não tem nome e o problema da correspondência
"O que isso se chama ? Eu creio que ele não tem nome , com certeza ele não tem ."
No terceiro quadrado do seu jogo de xadrez
cósmico Alice entra numa floresta aonde nada , inclusive ela , tem nome
algum . Isso levanta o problema da correspondência , o fato de não
podermos ter certeza nenhuma de que os nomes que nós damos às coisas
correspondem ao que elas são de fato . Segundo os filósofos
pós-modernos :
"Simplesmente não casamos partes da linguagem com
partes do mundo , tampouco uma determinada linguagem fornece um "mapa"
preciso do mundo. As linguagens são convenções sociais que mapeiam o
mundo de diversas maneiras , dependendo do contexto em que estamos
falando."
Portanto as nossas palavras não
representam um mundo objetivo e sim criam um mundo subjetivo socialmente
relativo . Por exemplo na física isso significa que não podemos teer
certeza que a palavra "àtomo" representa e seja correspondente a
qualquer coisa .Não existe um mundo objetivo mas apenas o mundo da
linguagem , criado mediante um jogo linguístico entre quem fala e quem
ouve .
Todavia tal cosmovisão destroí qualquer
possibilidade de conhecimento e nós nos tornamos prisioneiros do nosso
próprio mundo subjetivo . Dessa maneira não é nenhuma surpresa o fato
de Alice atravessar a floresta agarrado com um veado em silêncio
absoluto pois se não há uma correspondência objetiva não há sobre o que
conversar .
3.5 Alice e os gêmeos idealistas
Uma tentativa de ordenar o estranho mundo
na qual Alice se encontra é praticada pelos gêmeos Tweedledee e
Tweedledum . Ao olharem para o Rei Vermelho dormindo surge o seguinte
diálogo com Alice :
"-Ele está sonhando agora- disse Tweedledee :- e sabe sobre o que ele está sonhando ?
Alice disse - Ninguém pode saber isso .
-Ora sobre você !- exclamou Tweedledee , batendo
palmas com triunfo .-E se ele parasse de sonhar sobre você , aonde você
imagina que estaria ?
-Aonde eu estou agora é claro - disse Alice .
-Você não!- retrucou Tweedledee com desprezo - você estaria em lugar nenhum . Ora você não passa de uma coisa no sonho dele ’
Aqui encontramos a filosofia idealista
do Bispo Anglicano George Berkeley . Segundo Berkeley as coisas só
existem se são percebidas mas a existência de um mundo objetivo é
assegurado pelo fato de Deus estar observando tudo . Portanto uma àrvore
continua a existir mesmo se eu deixar de olhar para ela porque Deus
está a percebendo .
Todavia enquanto que na floresta sem nomes todos
ficamos presos sem a existência de um mundo independente das nossas
mentes , aqui a situação é mais devastadora pois o que existe é apenas
um mundo de natureza idealista presente na mente de Deus . O que nós
olhamos e acreditamos ter uma existência concreta na realidade é apenas
uma ilusão . Não é o caso do platonismo que afirmava existir um mundo
ideal por detrás do mundo material , mas a negação da própria existência
do mundo material .
3.6 A Semântica do Grande Ovo Nominalista e a Morte da Comunicação
A seguinte conversa frustrante surge entre Alice e o Grande Ovo : Humpty Dumpty .
"-Eu não entendo o que você quer dizer com glória ,- Alice disse .
Humpty Dumpty sorriu com desprezo :
-É claro que você não entendeu, até eu te explicar , eu quis dizer aí está um argumento devastador !
-Mas glória não significa um argumento devastador ,-Alice protestou .
-Quando eu uso uma palavra ,- Humpty Dumpty disse ,
de uma maneira arrogante , ela significa o que eu quero que ela
significa , nada a mais , nada a menos .
-A pergunta é - disse Alice ,-se você pode fazer palavras terem tantos significados diferentes
-A pergunta é ,-disse Humpty Dumpty ,-quem será o mestre , apenas isso.
Aqui Humpty Dumpty adota a posição
nominalista na semântica , a visão que prevalece entre os empiristas
lógicos , de que as palavras são apenas sons verbais e não tem
correspondência nenhuma a existências objetivas a não ser aquelas
definidas por quem as usa .
Na teologia isso torna-se importante porque
trabalhamos com termos chaves ( Deus , pecado , salvação , perdão ,
Trinidade etc …) e muitas vezes não nos damos o trabalho de definir que
queremos dizer com esses termos . Dessa maneira muitos dos grandes
debates teólogicos , quando analisados profundamente não passam de
discussões sobre como definir termos chaves .
Todavia levado ao extremo a posição de Humpty
Dumpty nos conduziria ao silêncio absoluto , pois se não existe nenhum
controle sobre como usamos as palavras nós todos iremos acabar falando
línguagens completamente diferentes .
Uma saída engenhosa foi elaborada por Roger W. Holmes no seu artigo : A Alice do Filósofo no País das Maravilhas ."
"Em um certo sentido as palavras são os nossos
mestres ou a comunicação seria impossível . Em outro sentido nós somos
os mestres , ou não haveria poesia ."
Portanto a comunicação torna-se possível pois
todos aderimos ao significado socialmente definido das palavras , mesmo
se dessa maneira qualquer comunicação torna-se subjetiva , fruto dos
sentidos socialmente negociados e culturalmente definidos das palavras.
4.0 O Conceito de "Nonsense" de Lewis Carroll
Um conceito muito importante nas histórias
a respeito de Alice é a palavra inglesa "nonsense" que não tem
equivalente no português . Literalmente o sentido da palavra "nonsense" é
"sem sentido" e é usado para designar o uso de frases absurdas e
paradoxais para efeitos cômicos . Todavia na obra de Carroll o uso de
"nonsense" também tem implicações filosóficas e teológicas .
Basicamente o uso de "nonsense" por Carroll tem três dimensões :
4.1 O "Nonsense" Literalista
Nessa dimensão as palavras são interpretadas
de uma maneira literal tão extremada que ocorrem situações absurdas como
o seguinte diálogo entre Alice e o Rei Branco :
"-Não há nada como comer feno quando se está perto de desmair- ele disse enquanto mastigava.
-Eu imaginaria que seria melhor jogar agua gelada sobre si mesmo ,- sugeriu Alice - ou tomar sais.
‘Eu não disse que não havia nada melhor’ o Rei replicou .’Eu apenas disse que não havia nada como comer feno.’"
Teologicamente isso serve
como uma alerta contra o fundamentalismo que tende a sempre buscar uma
interpretação literal das escrituras .Existe todavia uma consequência
linguística desse "nonsense"de proporções enormes .
O "nonsense" mostra que a mesma
linguagem usada para formular frases "sérias" pode ser usada para
formular frases absurdas . Mas surge então a pergunta de como podemos
ter certeza a respeito da nossas frases "sérias" ? Como podemos ter
certeza que a nossa ciência e a nossa sabedoria acumulada durante os
séculos não é na verdade tão ridículo e absurdo quanto a conversa do Rei
Branco ? Os habitantes do mundo das maravilhas e da terra do espelho
negariam essa certeza a nós e zombariam de qualquer pretensão nossa à
transcendentalidade da nossa linguagem .
4.2 O "Nonsense" Paradoxal
Nessa dimensão Carroll coloca juntos elementos
que não tem relação nenhuma com efeito extremamente cômico . Um exemplo
clássico são os versos abaixo extraídos do poema "A onça marinha e o Carpinteiro." declamado por Tweedledee :
"O sol brilhava no mar
Brilhando com todo o seu poder
…
E isso era estranho
Por que era meia noite
A lua brilhava chateada
Porque achava que o sol
Não tinha direito de estar lá
Depois do dia terminar
‘É Extrema falta de educação’ ela disse
‘Ele vir estragar a diversão’
…
‘A hora chegou ‘ a onça marinha disse
‘De falar de várias coisas :
De sapatos – navios – e selos
Repolhos e reis
Sobre porque o mar está fervendo
E se porcos tem asas .’"
Nesse poema Carroll zomba da nossa pretensão
iluminista de querer estruturar e organizar o universo na qual habitamos
. Ele mostra que essa organização pode ser feita facilmente de outra
maneira com efeitos cômicos . Na realidade as nossas "Categorias ou
Conceitos Puros do Entendimento" valorizadas por Kant como essencias no
processamento da informação não passam de especulações a respeito de "repolhos e reis"
4.3 O "Nonsense" de "Jabberwocky"
Todavia o "nonsense" Carrolliano atinge o seu
àpice no poema "Jabberwocky" considerado por críticos como um dos dez
melhores poemas já escritos na língua inglesa . Aqui incluiremos apenas o
primeiro verso :
" Twas brillig and the slithy tothes
Did gyre and gymble in the wabe
All mimsy were the borogroves
And the mome raths outgrabe . "
O essencial desse poema é que ele parece
inglês , tem o som inglês , tem a estrutura gramatical do inglês , mas é
escrita numa linguagem sem sentido . Aqui temos o nominalismo na sua
forma extrema , as palavras são apenas meros sons , e qualquer
comunicação objetiva é impossível .
Esse "nonsense" adotado por Carroll nos leva à
narrativa bíblica da Torre de Babel . Nessa história conhecida os seres
humanos buscam construir uma torre para chegar no céu . Descontente
disso Deus desce e espalha a confusão de línguas mostrando como era
absurdo e ridículo a pretensão humana de chegar à divindade .
Semelhantemente Carroll mostra como é absurdo e
ridículo a nossa pretensão de qualquer conhecimento que seja absoluto ou
objetivo , pois na realidade tudo que descobrimos por si só é sem
sentido , "nonsense." Ou nas palavras de Francis Schaeffer :
"Os filósofos chegaram à conclusão que eles não
iriam encontrar um círculo unificado rationalista que poderia conter
todo pensamento , e na qual eles poderiam viver . Foi como se o
rationalista descobrisse que estava preso numa sala redonda sem portas
ou janelas , apenas a escuridão total ."
Tal attitude é refletida na descrição dos vários
personagens com tendências filosóficas . O Gato de Cheshire não tem
nenhuma forma corpôrea , o grande ovo nominalista é apenas um
pretencioso , arrogante que sofre uma grande queda . Os gêmeos
idealistas Tweedledee e Tweedledum são na verdade dois meninos mimados
que brigam por qualquer besteira .
Teologicamente isso nos mostra que qualquer
filosofia que não parte da revelação divina , que seja apenas
racionalista em sua forma é vã e pretenciosa . O ser humano naufraga
completamente quando deseja fugir da sua dependência de Deus pois ele é
dependente da revelação divina para adquirir o conhecimento e da graça
divina para obter a sua salvação .
Na análise do Livro de Gênesis alguns autores
consideram a história da Torre de Babel uma mera etiologia destinada a
explicar a existência de várias línguas diferentes ignorando o
significado da história na teologia de Gênesis . Colocado antes do
chamado de Abraão ela mostra o fracasso da tentativa dos seres humanos
de alcançar a divindade em contraste ao desenrolar do plano da salvação
na família de Abraão . Cabe a nós , como teólogos evangélicos , expôr o
absurdo das filosofias humanas em contraste com a salvação oferecida de
maneira gratuita por Deus .
5.0 O Comportamento de Alice como metáfora do dilemma do Seminarista
O comportamento de Alice face ao mundo
estranho na qual ela se encontra é refletido muitas vezes no
comportamento de seminaristas quando confrontados com as novas , e
muitas vezes estranhas , idéias filosóficas e teológicas no seu curso .
Um exemplo muito vivo disso é o debate entre Alice e os gêmeos
idealistas . Esse diálogo tem duas principais características : o
desespero e o desprezo .
5.1 Desespero
Quando confrontado com o idealismo de
Tweedledee e Tweedledum a primeira reação de Alice é o desespero como
ilustra o seguinte trecho :
"-Ora , não faz sentido você falar em acordar ele
,- disse Tweedledum ,- quando você é apenas uma das coisas no sonho dele
. Você sabe muito bem que você não é real .
-Eu sou real!- disse Alice e começou a chorar .
-Você não se tornará real chorando- comentou Tweedledee :-não há razão para chorar.
Da mesma maneira é comum percebermos
reações exaltadas e desesperadas entre seminaristas quando confrontados
com idéias novas . Mas , parafraseando Tweedledee , nada muda com o
desespero .
5.2 Desprezo
A segunda reação de Alice perante os gêmeos idealistas é o desprezo pelas idéias deles :
"-Eu sei que eles estão falando besteira- Alice pensou para si mesma -e é besteira chorar a respeito disso."
Muitas vezes existe a tentação de desprezarmos
as idéias dos outros e ao invés de as debater simplesmente
desprezar-lás como besteira . Dessa maneira nos isolamos num ghetto
evangélico marginalizados dos grandes debates filosóficos da nossa era .
Pode ate ser que muitas das idéias defendidas
pelos nossos opositores sejam realmente "besteira" mas isso não nos
livra da obrigação de as discutir e as refutar .
Sendo o desespero e o desprezo adotados por Alice
soluções insatisfatórias iremos encerrar o nosso trabalho com um
exemplo positivo de engajamento teológico e filosófico , a do Apóstolo
Paulo .
6.0 O Discurso de Paulo no Areópago em contraste com Alice
O discurso de Paulo aos intellectuais
gregos no Aerópago (Atos 17: 15-34) poderia em si só ser tema de uma
monografia , porém nosso objetivo será contrastar a atitude de Paulo com
a atitude de Alice e a de muitos seminaristas . Como Alice e qualquer
pessoa que entra num seminário em Atenas Paulo encontra um mundo
estranho ,o que I . H Marshall chama-de :
"uma mistura de idolatria supersticiosa e filosofia iluminada"
Mas ao contrário de se esconder na "cidade da Filosofia" Paulo
enfrenta os filosofos e intellectuais no seu próprio terreno . De
exemplar no discurso de Paulo temos os seguintes elementos :
6.1 Coragem e Autoridade
Em contraste com o desespero e o choro de
Alice Paulo não hesita em pregar a palavra de Deus com autoridade mesmo
sendo desprezado e mal-entendido pelos atenienses conforme o seguinte
trecho indica :
"Ora, alguns filósofos epicureus e estóicos
disputavam com ele. Uns diziam: Que quer dizer este paroleiro? E outros:
Parece ser pregador de deuses estranhos; pois anunciava a boa nova de
Jesus e a ressurreição."
6.2 Respeito
Enquanto que Alice apela para o desprezo pelas
idéias de seus opositores Paulo mostra respeito e compreensão . Em
contraste com muitos hoje em dia , Paulo consegue ver o positivo nas
idéais dos seus opositores e que pode ser usado para transmitir a
mensagem do evangelho :
"porque nele vivemos, e nos movemos, e existimos;
como também alguns dos vossos poetas disseram: Pois dele também somos
geração."
A referência aos poetas gregos mostra a disposição
de Paulo em , ao invés de rejeitar completamente a cultura grega ,
utilizar elementos da própria cultura dos seus leitores para pregar a
mensagem divina .
6.3 Relevância Cultural
Outro elemento a ser louvado no discurso de
Paulo é a sua disposição em transmitir a mensagem cristã numa maneira
que seja relevante aos seus ouvintes . Os filósofos epicureus
acreditavam que as divindades ,se existissem , não interferiam na vida
humana enquanto que os estóicos adotavam uma visão panteística . Paulo
,segundo Marshall :
"utiliza as perspectivas dos filósofos no seu
ataque contra as crenças da população de Atenas ; os epicureus atacavam a
crença supersticiosa e irracional nos deuses , expressos na idolatria
enquanto que os estóicos enfatizavam a unidade da humanidade e sua
ligação com Deus , e a consequente obrigação moral do homem . O que
Paulo faz é apoiar os filósofos e depois demonstrar que eles não foram
longe o suficiente."
Paulo não compromete a mensagem cristã
no seu discurso de Atenas mas ele a estrutura e apresenta de uma maneira
que seja culturalmente compreensível e relevante para os seus ouvintes .
Muitas vezes não temos sucesso no nosso evangelismo porque apresentamos
a nossa mensagem de uma maneira que não pode ser compreendida . Se
queremos ser relevantes precisamos adotar uma terminologia e uma
abordagem contextualizada que possa ao mesmo tempo ser fiel à mensagem
do evangelho .
7.0 Conclusão
"A vida , o que ela é senão apenas um sonho?"
O que resta a ser dito depois de termos
caminhado com Alice pelo País das Maravilhas e a Terra do Espelho ?
Depois de termos conversado com lagartos , encontrado gêmeos idealistas e
debatido com um ovo nominalista qualquer conclusão será por natureza um
anti-clímax. Após o poder do "nonsense" como aventurar-se a trazer
qualquer síntese ?
Todavia se como o Gato de Cheshire afirma "somos todos loucos aqui" farei a loucura de tentar tirar duas conclusões teológicas a respeito das histórias de Alice .
7.1O Fracasso de qualquer projeto humanista ou racionalista
Carroll zomba das nossas tentativas de construir
sistemas de pensamento que partam da nossa existência como seres humanos
. O "nonsense" não deixa dúvidas :as nossas pretensões à objetividade
não passam de absurdo , conversas sobre "repolhos e reis".Desse
modo Carroll pode ser considerado como visionário prevendo o ambiente
intellectual do final do século na qual o projeto iluminista e
modernista está em frangalhos .
- A Necessidade de uma dependência completa de Deus
O fracasso do projeto humanista e racionalista
nos lança na completa dependência de Deus . O caos e o absurdo cessam
apenas quando se confia num Deus amoroso e criador . O conhecimento e a
comunicação são apenas possíveis quando se têm a consciência de que Deus
se revela até nós e comunica-se conosco através de sua Palavra .
A situação dos orfãos do modernismo é expressa na música "Bullet with Butterfly Wings"
"Agora eu estou nú , não passo de um animal ,…
mesmo assim eu acho que eu posso mostrar todo o meu charme frio , Apesar
de minha ira eu não passo de um rato na gaiola, E alguém dirá que os
perdidos nunca poderão ser salvos … e eu ainda acredito que não posso
ser salvo."
Aos que estão perdidos no caos e no
desespero devemos pregar a mensagem do evangelho , a única que pode
trazer significado à existência humana .
Façamos como Paulo e caminhemos destemidos pelo País dos Filósofos.
A simbologia esotérica de Pinóquio e de Alice no País das Maravilhas
As Aventuras de Pinóquio e Alice no País das Maravilhas são duas histórias para crianças carregadas de mensagens transpessoais, psicológicas e esotéricas, dois relatos de desenvolvimento pessoal, em que Pinóquio e Alice se vão desprendendo dos seus defeitos, limitações, ignorância e adormecimento, e tornar-se verdadeiros seres humanos com ajuda de duas personagens, respectivamente, o Grilo Falante e o Coelho, como acontece com a dupla Tamino-Pamina de A Flauta Mágica.
Mozart - Die Zauberflöte K 620
Franz-Joseph Selig... 164min.
Há pouco tempo, Cecilia Gatto Trocchi, antropóloga da Universidade de Perugia, explicava que Pinóquio não passava de um texto maçônico carregado de esoterismo, cujas peripécias seriam perífrases de livros esotéricos, como o Livro dos Mortos e O Conto da Serpente Verde, do também maçom Goethe.
Realmente, Pinóquio, e também Alice no País das Maravilhas, é um texto maçônico, iniciático.
A razão é porque, não só ambas as histórias estão repletas de simbologia maçônica, como foram escritas por dois conhecidos maçons, o italiano Carlo Collodi e o inglês Lewis Carrol, respectivamente, no século 19, tal como a partitura da Flauta Mágica o tinha sido, pelo maçom Mozart, no século 18, sobre o texto de uma fábula maçônica.
De fato, na história de Pinóquio, Gepeto é um velho mestre que usa avental (mestre maçom) e, sonhando ter uma criança, faz um boneco de madeira (segundo os astecas, os Deuses criaram o ser humano de madeira, que tem um paralelismo com o trabalhar a Pedra), desenhando-o com um compasso (objeto maçônico). Ao ver a estrela azul (estrela flamígera), implora a realização desse desejo, o qual lhe é concedido: enquanto dormia, a Fada Azul (Mãe Divina) deu vida ao boneco, advertindo-o para que se comportasse como um menino de verdade (Homem autêntico, autorrealizado). E para aconselhá-lo, presenteia-o com o Grilo Falante (a Consciência).
Mas Pinóquio tem um Ego hipertrofiado, produto de distintos vícios que foi acumulando. As mentiras fazem-lhe crescer o nariz e as orelhas de burro depois, num paralelismo muito semelhante à história do Príncipe com Orelhas de Burro, que a tradição maçônica costuma utilizar para exemplificar nossa vida superficial, fútil e inconsciente.
Pinóquio paga as consequências dos seus atos quando é engolido por uma baleia, à semelhança do Jonas bíblico, num paralelismo também à Câmara de Reflexão das iniciações e ao Ritual no 3º grau na morte de Hiram Abiff, existentes na Maçonaria.
No ventre da baleia, Pinóquio decide mudar, deixando para trás a vida inconsciente, e, sendo expelido pela Baleia, afoga-se, também num paralelismo com a Morte Mística do iniciado, que, na Câmara de Reflexão, morre para a vida profana, renascendo para a vida iniciática, e do mestre que, no Ritual de 3º grau, se desprende de sua carne e ossos, para ressuscitar espiritualmente.
E da mesma forma que o iniciado e mestre, Pinóquio acorda do afogamento, renascendo sob uma forma humana mais elevada, tonando-se um Homem de verdade.
E Pinóquio é Homem de verdade, também segundo a interpretação psicológica da história, quando, transformando-se num menino de carne e osso, vence o gato e a raposa (as manifestações egoicas nos Centros Instintivo-Motor e Emocional).
No antigo tratado japonês Yagyun sobre a espada e a
filosofia zen, explica numa frase: “Transforma-te num boneco de madeira:
o boneco não tem Ego, nada pensa, e deixa que o corpo e os membros
trabalhem por si mesmos de acordo com a disciplina que experimentaram. É
este o caminho para a vitória”.
Na história de Alice no País das Maravilhas, que, inicialmente, de forma reveladora do seu carácter simbólico, o seu autor intitulou Alice Debaixo da Terra, numa alusão à descida ao interior de si próprio do aprendiz maçom, o paralelismo com as Aventuras de Pinóquio é notório:
A estrutura da história segue do princípio ao fim o esquema de uma a sessão iniciática de um templo gnóstico-maçon, a que são adicionados alguns elementos de fantasia e personagens. Alice estava aborrecida, cansada de ficar sentada num banco com a irmã, sem nada para fazer. Estava de olho no livro que a irmã lia, mas logo se desinteressou, já que ele não possuía imagens ou diálogos. A menina estava convencida de que um livro sem imagens e sem diálogos não valia a pena (futilidade, inconsciência).
No meio dessa monotonia, levanta-se para colher margaridas para um colar, sendo surpreendida por um velho coelho de luvas brancas (mestre maçom de luvas brancas que introduz o Iniciado), sempre preocupado com o atraso para a reunião (no templo ou na loja).
Curiosa, Alice segue o coelho, entrando numa toca (Câmara da Reflexão, caixão do Mestre Hiram), onde vê uma porta, mas não consegue entrar antes de passar por sucessivas transformações e provas (como as provas de iniciação maçônica) e só depois tem acesso, através da porta, que finalmente se abre, ao jardim onde três jardineiros (os três oficiantes da loja: Sacerdote, 1º e 2º Vigilantes) pintavam rosas brancas de vermelho (a transformação que se opera em cada um ao transpor a porta do templo) e chamavam-se uns aos outros como se tivessem números (nomes simbólicos dos maçons), o cortejo da rainha (o cortejo de entrada), o jogo de críquete entre todos (a Cadeia de União ou de Irradiação de Amor), a ordem de cortar as cabeças (o gesto do estar “à ordem” em Maçonaria), as deliberações e votações (também na forma maçônica), todos elementos da iconografia e simbologia maçônica, provas essas, que a levaram ao conhecimento de si mesma.
Isso tudo sem falar do famoso chá, feito de uma certa “planta de poder”, usada para amplificar a Consciência (aumentar ou diminuir de tamanho), usada por Iniciados para experienciar os Mundos Internos…
Cada experiência pela qual Alice passa, com as sucessivas transformações em que cresce e diminui, explica-lhe que vivemos cercados de estímulos aos quais se reage conforme o Nível de Ser que se tem. “O País das Maravilhas existe.” O trabalho de autoaperfeiçoamento na subida gradual na Escada de Jacó, que é o símbolo maçônico do crescimento gradual na Sabedoria, é possível.
Como diz a última frase da história: Alice aprendeu “que para voltar ao País das Maravilhas basta conservar o coração puro e os olhos tão transparentes como o céu de verão”. Uma conclusão que se pode reverter na máxima maçônica: o maçom, para estar em comunhão com a ordem, basta ter o coração puro e os olhos transparentes como o céu estrelado da sua loja.
O Grilo Falante de Pinóquio e o Coelho de Alice representam a nossa Alma Divina, a Consciência, também nosso “Remorso”, adormecida e presa pelo Ego e pela Mente, pelos desejos inferiores egoicos que temos, como Pinóquio e Alice, que ouvir e seguir na formação do coração e esclarecimento do espírito.
Ambas as histórias relatam simbolicamente o caminho longo e cansativo de um iniciado maçom. O Trabalho pelo qual a Pedra Bruta se transforma numa pedra trabalhada e viva…
Demonstram os passos do Caminho, as suas Provas, nas quais se prepara o espírito para se tornar digno de entrar no Templo (Interior), naquele templo verdadeiro, que é feito sem ruído de pedra ou de martelo, em que a luz do Conhecimento (Gnose) permanece eternamente.
A entrada de Pinóquio no ventre da Baleia e a descida de Alice à toca do Coelho é o regressus ad uterum de todos os ritos iniciáticos que implicam transformação simbólica em embrião e uma pré-morte, seguida do regresso à Grande Mãe da etiologia, onde o iniciado nasce pela segunda vez.
Essa penetração na Grande Mãe é muitas vezes perigosa: no Pinóquio, a entrada no ventre da Baleia, além da já referida semelhança bíblica, encontra-se muitas vezes noutros mitos e sagas do antigo Oriente e do mundo mediterrânico de raiz iniciática, tendo paralelismo com o mito polinésio de Mauí, o grande herói maori que, regressando à pátria, para a casa da avó, encontrando-a adormecida, se despe e penetra no corpo de uma gigante, a Grande Dama da Noite, Huie-muite-po, atravessando-a, mas, ao sair, ela acorda de sobressalto, apertando-o entre os dentes e cortando-o ao meio.
Em Alice, a descida à toca tem paralelismo com os ritos iniciáticos relativos às grutas e fendas das montanhas, símbolos da matriz Terra-Mãe em muitas culturas. Por exemplo, o termo chinês “tang”, designando gruta, também significa “misterioso, profundo, transcendental”, todos arcanos revelados nas iniciações.
Essas duas representações do Além, em Pinóquio sob a forma de ventre da Baleia, e em Alice sob a forma de toca, ilustra que o outro mundo é um local de acesso extremamente difícil.
A porta em forma de mandíbula, no caso de Pinóquio, e a simples porta impossível de transpor, no caso de Alice, significam a dificuldade da passagem e refletem a necessidade da mudança do modo de ser para poder atingir o mundo do espírito.
Em suma: independentemente da interpretação psicológica que muitos autores fazem das histórias de Pinóquio e Alice, que é rebuscada e não estava na intenção dos seus autores, elas têm na sua gênese uma conotação maçônica e esotérica, porque os seus criadores eram maçons, a simbologia e estrutura de ambas é maçônica e descrevem a viagem atribulada e solitária da cada ser humano, pobre, nu e cego, na procura constante da Sabedoria e da Espiritualidade, que vem já das mitologias e dos ritos de iniciação antigos e que várias culturas, religiões e a própria Gnose e Maçonaria adotaram para explicar simbolicamente a transformação espiritual de cada indivíduo para comungar com a Divindade.
Análise Psicológica e Interpretativa
do Romance Alice no País das Maravilhas
Aline Haiddé de Brito
UNIPAM
– Orientação:
Prof. Dr. Luís André Nepomuceno
Interpretações
Psicológicas e Filosóficas do romance Alice no País das Maravilhas
Alice é uma obra que permite várias
interpretações. Uma delas é a de que as mudanças,
conflitos
e aprendizados da adolescência podem estar representados na obra. Alice
entra
na aventura sem pensar em nada, de repente, como se entra na adolescência. A
questão do tamanho nos lembra que a adolescência está presente em todos os
episódios da história:
“Alice está sempre
crescendo e diminuindo dependendo da
situação
e isso certas vezes é conveniente ou não para ela”.
Resumo Alice no país das maravilhas, de
Lewis Carroll, é um romance inglês moderno
extremamente
complexo que propõe as mais variadas interpretações por abordar em seu
contexto
assuntos de diferentes temáticas. Através deste artigo, por meio de uma
pesquisa
bibliográfica,
pretende-se fazer uma análise de caráter interpretativo do romance Alice no País das Maravilhas.
Palavras-chave:
Alice no País das Maravilhas.
Lewis Carroll.
Romance Inglês Moderno.
1. Considerações iniciais
Alice no país das maravilhas é um
dos livros mais editados da literatura moderna e
influenciou
vários grandes escritores, como Jorge Luis Borges, Cortazar, Maria Clara
Machado e
Guimarães Rosa. Um romance extremamente complexo que propõe as mais variadas interpretações
por abordar em seu contexto assuntos de diferentes temáticas.
Os
dois romances de Lewis Carroll (pseudônimo de Charles Lutwidge Dodson), Alice
no país das maravilhas e Alice através do espelho,
publicados em 1865 e 1872, são extremamente intrigantes
e capazes de mexer muito com a imaginação de seus leitores, porém este
artigo detém-se apenas na análise do primeiro.
Os
elementos típicos dos contos de fada, animais que falam, reis e rainhas,
mudanças
de
tamanho em um passe de mágica, personagens enigmáticos que aparecem e
desaparecem de
uma hora para outra, além do fato de a história se passar dentro de um sonho, torna
tudo muito complexo e curioso.
Partindo-se
dos referidos pressupostos, desenvolvemos uma análise interpretativa
da
obra Alice no país das maravilhas,
buscando compreender um pouco melhor o seu enredo.
2. O autor e sua obra
Charles
Lutwidge Dodgson (mais conhecido como Lewis Carroll) nasceu em 27 de
janeiro
de 1832, em Daresbury, Inglaterra e morreu em Guidford, Inglaterra, em 14 de
janeiro
de
1898. Filho de um pastor anglicano, Lewis Carroll tinha 10 irmãos e cresceu num
ambiente
onde aprendeu a contar histórias, cuidar e distrair crianças. Apaixonado por
matemática e
fotografia, foi nomeado professor de matemática em Oxford em 1861. Como
fotógrafo amador,
fotografava invariavelmente meninas entre 8 e 12 anos de idade.
Tornou-se
famoso por seus dois livros, Alice no país das maravilhas e
Alice no país
do espelho, que tiveram como
inspiradora Alice Liddell, de apenas dez anos, por quem ele
tinha
uma paixão platônica. Carroll nunca assumiu sua paixão por meninas, que ficou
registrada através
de várias fotos de nu infantil feitas por ele.
Não
se deve afirmar com certeza que os livros Alice no País das Maravilhas e
Alice
através do espelho, sejam
necessariamente livros infantis. “Pois não há nada por trás dos
enredos
e personagens desses dois livros que não esteja rigorosamente referenciado,
seja
através
de dados da própria existência de Carroll, seja através de inúmeras alusões
literárias,
científicas,
lógico-matemáticas, etc.” (CARROLL, 1980, p. 7).
3. Origem do livro
Em
4 de julho de 1862, um barco a remo transportava o reverendo Charles Lutwidge
Dodgson
numa excursão pelo rio Tâmisa. Junto a ele, além do amigo Robinson Duckworth,
estavam
as três irmãs Liddell: Lorina Charlotte, de 13 anos; Alice Pleasence, de 10
anos;
e Edith, de 8 anos. Cada uma recebeu um apelido, ao longo da viagem, respeitando
a
ordem
de nascimento. Assim, Lorina foi denominada “Prima”, Alice “Secunda” e Edith
“Tertia”.
O evento não era algo incomum na vida daquelas pessoas, o reverendo acostumara-
se
a levar as irmãs Liddell em passeios pelo rio, alternando conversas e contos de
fadas
inventados
em cada ocasião, geralmente esquecidos nos momentos seguintes. Porém, Prima, Secunda
e Tertia foram eternizadas num poema, que alude explicitamente àquela sexta-feira,
naquela tarde de verão. E a história que povoou a imaginação das três meninas
foi anotada,
escrita e reescrita, depois publicada pelo reverendo em 1865, tornando-se um
dos maiores
clássicos da literatura de todos os tempos. O poema e a história foram
dedicados a Alice
Pleasence Liddell. Assim, Alice no país das maravilhas e
depois Alice através do espelho alçaram
o pseudônimo Lewis Carroll à posição de destaque na história da literatura, marcada
pelo pioneirismo no tratamento das situações e também pelo uso até certo ponto incomum
do recurso do nonsense (termo inglês que indica
ausência de sentido) para o público infantil.
O
nonsense de Carroll continha um
elemento extra na formação do texto: a matemática.
A
obra de Carroll foi constituída através de jogos de linguagem, baseados na
Lógica,
nos
quais os capítulos só terminam quando as proposições se esgotam. Carroll usou
de
seus
conhecimentos matemáticos e lógicos para construir proposições em Alice no País da
Maravilhas, sendo muitas vezes o
significado particular da frase superado pela forma, sugerindo brincadeiras
comuns em sua época.
4. Composição do romance
Os
episódios que compõem uma narrativa, localizados no tempo e no espaço desejados
pelo
escritor, dependem de algum recurso de ligação para garantir a sua coerência
interna.
Este recurso pode ser estabelecido através do ritmo, do narrador, de um limite
de
tempo
ou até mesmo de um personagem, entre outras possibilidades.
A
análise do sumário da obra, observando os títulos dos capítulos, permite ver
uma
colagem
de histórias, casos curtos que poderiam existir independentemente, se não fosse
a
intenção
do autor escrever um verdadeiro conto de fadas, tornando a viagem pelo país das
maravilhas
um sonho de Alice, e fazendo a correspondência ao episódio inicial em que ela
lê
um
livro enfadonho antes de cair no sono. A Lagoa de Lágrimas, Um Chá Maluco e O
Campo
de
Croqué da Rainha são capítulos que remetem o leitor a cenas muito visuais, seja
pela
descrição
nada usual dos acontecimentos ou pelo inusitado dos diálogos.
A
concordância entre o início e o final aparece como uma prova de coerência na
construção
da narrativa, pois os leitores não exigem uma lógica total dos acontecimentos
dentro
do romance, uma vez que se trata do enredo de um sonho, universo onde as coisas
mais
incomuns são aceitas como naturais.
5. As diversas alusões dentro da obra
Vários
personagens e situações de Alice no país das maravilhas tiveram
como inspiração
o
cotidiano de Lewis Carroll e a comunidade onde viveu. A personagem Alice foi
inspirada
em Alice Liddell, filha de Liddell, amigo de Carroll. Apesar de a menina e a
personagem terem
o mesmo nome, ambas eram muito diferentes: Alice Liddell era morena, comum e
insípida, ao contrário da Alice de Lewis, que era loira, esperta e agitada. As
irmãs
Liddell
eram muito afeiçoadas aos dois gatos malhados da família, Dinah e Villikens.
O
frasco de remédio vitoriano era arrolhado, com um rótulo de papel amarrado no
gargalo
assim como a garrafa com o líquido que Alice toma para encolher em sua primeira
mudança
de tamanho.
Uma
chave de ouro que destrancava portas misteriosas era um objeto comum na
literatura
vitoriana.
A portinha para um jardim secreto era para Carroll uma metáfora de
eventos
que poderiam ter acontecido se tivesse aberto certas “portas”. As doze mudanças
de
tamanho
sofridas por Alice ao longo da história poderiam estar ligadas ao desejo dele
de
que
Alice Liddell fosse adulta para que pudesse se casar com ela. O poema da carta
usada
como
prova pelo Coelho Branco no julgamento é inspirado pela canção Alice Gray, que
conta
à
história do amor não correspondido de um homem por uma moça chamada Alice.
Carroll
pode ter pretendido que a “corrida em comitê” simbolizasse o fato de que os
membros
de comitês políticos geralmente correm muito em círculos, sem chegar a lugar
algum,
pois todos almejam um mesmo prêmio político. O dedal tomado de Alice e depois
devolvido
a ela como prêmio pela corrida, pode simbolizar o modo como os governantes
tomam
dinheiro do bolso dos cidadãos e depois devolvem na forma de projetos
políticos.
Mary
Ann, na época de Carroll, era um eufemismo britânico para criada. O coelho
Branco
chama Alice assim em um momento no qual dá ordens a ela. Ele está sempre
procurando por
suas luvas, peças tão importantes para Lewis quanto para o Coelho, pois em
todas as
estações do ano o escritor sempre usava um par de luvas de algodão cinzentas ou
pretas.
No
capítulo “Conselhos de uma Lagarta”, a lagarta lê o pensamento de Alice.
“Carroll
não
acreditava em espiritualismo, mas acreditava na realidade da percepção
extrasensorial
e
no poder da mente mover ou deformar objetos inanimados.” (GARDINER, in:
CARROLL,
2002, p. 50). A Lagarta fora inspirada nos professores que davam conselhos na
Universidade
de Oxford, onde Lewis estudou.
Em
toda a história de Alice são encontrados 24 poemas, entre os quais 10 são
paródias
de
poemas e canções inglesas da época de Lewis Carroll. “Os poemas e os versos que
Alice
recita, e que parecem não ter sentido nenhum, são sátiras aos poemas enfadonhos
que
as
crianças inglesas daquela época tinham que saber de cor.”
(www.educ.fc.ul.pt/docentes/
opombo/seminario/alice/comosurgiu.htm).
A posição de Alice, de mãos unidas, ao fazer
recitações
indica que era exigido das crianças da época saber as lições de cor.
O
autor do romance adorava crianças, mas detestava meninos. “Certamente não foi
sem
malícia que Carroll transformou um bebê do sexo masculino num porco, pois não
tinha
menininhos
em alta conta.” (GARDINER, in: CARROLL, 2002, p. 61).
A
nogueira onde aparece o Gato de Cheshire ainda existe nos dias de hoje, no
jardim
do
Colégio de Deanery. O Gato de Cheshire refere-se aos queijos do condado de
Cheshire
(onde
Carroll nasceu) que tinha a forma de um gato sorridente. Ao partir o queijo na
forma
de
gato, a tendência seria começar pela calda até que finalmente só restasse na
travessa a
cabeça
sorridente, o que nos remete ao episódio no qual o gato desaparece a começar
pela
cauda
e termina com o sorriso.
O
dia do chá maluco não é uma data qualquer, é o dia do aniversário de Alice
Liddell,
4
de maio. Ninguém diria a uma menina vitoriana que seu cabelo estava comprido
demais.
A observação “seu cabelo está precisando de um corte” dita pelo Chapeleiro
Louco,
na
verdade, era uma frase muito ouvida por Carroll, pois este usava os cabelos
mais longos
do
que era costume. A história que o caxinguelê conta sobre 3 irmãs que vivem em
um poço
de
mel (Elsie, Lacie e Tillie), refere-se às 3 irmãs Liddell: Lorina, Edite e
Alice. A parte na
qual
a Lebre de Março e o Chapeleiro Louco tentam enfiar o Caxinguelê no bule de chá
pode
estar
relacionada ao fato de que crianças vitorianas costumavam ter ratinhos como
bichos
de
estimação e conservavam-nos dentro de bules cheios de capim ou feno.
A
Lebre de Março refere-se ao mês do cio das lebres; o Chapeleiro é louco por
causa
de
uma substância alucinógena usada na fabricação de chapéus; o Leirão dorme muito
por
ser
um animal que hiberna no inverno e a Falsa Tartaruga refere-se à sopa de falsa
tartaru-
ga,
que na verdade é feita com carne de vitela. Na catedral, onde o pai de Lewis
era reverendo,existe
talhada em madeira a imagem do grifo que inspirou o Grifo, amigo da Falsa
Tartaruga.
“O
grifo é um monstro fabuloso com cabeça e asas de águia e a parte inferior do
corpo
de leão.” (GARDINER, in: CARROLL, 2002, p. 91).
“A
“Quadrilha da Lagosta” pode ter sido pensada como uma brincadeira com a
“Lancers
Quadrille”, dança para 6 a 8 pares que era imensamente popular nos salões de
baile
ingleses na época em que Carroll escreveu seus livros de Alice.” (idem, 2002,
p. 97).
Carroll
dedicava muito tempo à invenção de maneiras inusitadas de jogar jogos
conhecidos,
e
talvez por isso, o jogo de croqué da Rainha possuísse elementos vivos. Camomila
era
um medicamento extremamente amargo, muito usado na Inglaterra Vitoriana, e era
extraído
da planta de mesmo nome, por isso, Alice afirma que a camomila torna as pessoas
amargas.
Durante
uma conversa com a duquesa, Alice fica indecisa entre classificar mostarda
como
animal, mineral ou vegetal. Trata-se de uma referência ao popular jogo de salão
vitoriano “animal,
vegetal, mineral”, em que os jogadores tentavam adivinhar o que alguém
tinha
em mente.
As primeiras perguntas feitas eram tradicionalmente:
É um animal? É
um vegetal?
É um mineral?
As respostas tinham de ser sim ou não, e o objetivo era adivinhar
corretamente
em 20 perguntas ou menos.
Devido
às semelhanças no comprimento dos nomes, e às posições das vogais, consoantes
e
letras duplas no último nome, acredita-se que Charles tenha se inspirado na
formação
do
nome de Alice Liddell para criar seu pseudônimo Lewis Carroll.
6. Alice e o tamanho
6.1 O tamanho e o caminho para a maturidade
Alice no país das maravilhas é a
narrativa do sonho de uma garotinha. Como é comum
em
todos os sonhos, as regras da realidade são quebradas, e isso é analisado pela
própria
personagem
como em um jogo. A garotinha precisa entender e resolver o jogo, antes
que
sua irmã a acorde e a traga de volta ao mundo real e normal.
Alice é uma obra que permite várias
interpretações. Uma delas é a de que as mudanças,
conflitos
e aprendizados da adolescência podem estar representados na obra. Alice
entra
na aventura sem pensar em nada, de repente, como se entra na adolescência. A
questão do
tamanho nos lembra que a adolescência está presente em todos os episódios da
história:
“Alice
está sempre
crescendo e diminuindo dependendo da situação
e isso certas vezes é
conveniente ou não para ela.”
(http://www. pt.wikipedia.org/wiki/ Alice_ no_
País_das_Maravilhas).
No
primeiro capítulo, Alice reduz de tamanho e parece se tornar insignificante.
Essa
transformação
faz com que ela tenha medo de encolher até desaparecer. Em alguns episó-
dios,
Alice cresce de forma desenfreada. O adolescente se sente insatisfeito, ao
perceber que crescer
traz consigo inúmeras responsabilidades.
Em
várias circunstâncias o tamanho representa novas possibilidades. Pequena, Alice
pode
entrar no jardim, mas grande, pode pegar a chave. Grande, sente-se mais
confiante
no
julgamento no final do livro.
Na
passagem em que o pescoço de Alice cresce, sua capacidade de observação se
torna
mais ampla. Depois de experiências vividas na adolescência passamos a ter uma
nova
visão
do mundo. Alice considera o país das maravilhas mais divertido, mas sente
saudades
do
mundo real. O adolescente adora as novas possibilidades dessa fase, mas sente
saudade
das
facilidades da vida enquanto criança.
No
país das maravilhas, Alice sente que pode usar a mágica como recurso para
tornar-
se
invencível. Ao afirmar que quando for adulta vai escrever um conto de fadas,
revela o
desejo
de controlar tudo que acontece no mundo a sua volta.
Quando
Alice fala sobre a dúvida de quem realmente é, no diálogo com a cigarra, a
personagem
demonstra um estado confuso típico da adolescência diante da rapidez com
que
as mudanças acontecem.
Ao
final do livro, Alice recupera seu tamanho normal, porém a maturidade vinda
das
experiências vividas ao longo da história a investe de uma grande coragem para
enfrentar
o
julgamento. Quando Alice acorda, sua irmã pensa se ao crescer ela conservará o
coração
simples
e amoroso da infância. Lembra alguém que passou pela adolescência e se lembra
dela
com saudades. Nesse momento, a irmã de Alice percebe que ela despertou do sonho
muito
mais madura.
6.2 Alice e o problema do tamanho
As
mudanças de tamanho mexem com o psicológico da personagem, levando-a a
explorar
suas capacidades, enquanto impõe novas circunstâncias a cada capítulo, fazendo
o
romance
progredir.
Tome-se
por exemplo um dos episódios iniciais em que Alice está num grande salão e
identifica
uma porta pequena na parede, antes escondida por uma cortina. A menina
então
encontra uma chave minúscula, sobre a mesa de vidro, e abre a portinha,
revelando
um
belo jardim. Sua intenção é chegar àquele novo lugar. E a necessidade de
Carroll
é
avançar no romance, criando novas
peripécias para a protagonista. A transformação
do
tamanho aparece, pois, como uma solução para o desejo de Alice (e de Carroll).
(http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum/orientando20.htm#*).
O
problema do tamanho lida com o crescimento e os obstáculos encontrados no
caminho
para
a maturidade. A personagem busca se superar diante de cada obstáculo
desenvolvendo
a
postura de uma heroína, e nem mesmo a sua constante crise de identidade a
impede
de continuar questionando e desejando mudar seu tamanho para ultrapassar portas
e
adentrar recintos novos. A última mudança acontece espontaneamente, talvez
porque
Alice
estivesse prestes a voltar à realidade.
7. Teorias científicas presentes na obra
Na
época de Carroll, era uma curiosidade comum desejar saber o que aconteceria se
alguém
caísse em um buraco que passe pelo centro da terra. Estudando sobre a travessia
até
o centro da terra feita pela toca do coelho, percebe-se a referência feita à
teoria de Galileu
sobre
a relação entre velocidade e aceleração. Em alguns trechos nos quais ocorre
queda
livre,
ele teria, de certa forma, antecipado a “experiência de pensamento” em que
Einstein
usou
um elevador imaginário em queda para explicar certos aspectos da teoria da
relatividade.
As
mudanças de tamanho sofridas por Alice também fazem alusão ao princípio do
telescópio,
o qual fascinava Carroll imensamente. Estudiosos da obra de Lewis, usando a
teoria
da relatividade, comparam o chá maluco, em que são sempre 6 horas, com a porção
do
modelo do cosmo de De Sitter, em que o tempo permanece eternamente imóvel.
8. Referências histórico-lingüísticas e
socioculturais
As
histórias de Carroll possuem referências histórico-lingüísticas, e muitas
vezes, é
necessária
a decodificação para uma compreensão perfeita de sentido do que é dito.
Carroll
usou elementos típicos dos contos de fadas para chamar a atenção das crianças,
como
animais que falam e a presença de reis e rainhas, além da cronologia
indefinida.
Porém,
as histórias de Alice não podem ser consideradas contos de fadas, pois abordam
questões
históricas em suas narrativas, como por exemplo, críticas à sociedade inglesa
do
período
vitoriano.
A
obra reproduz vários aspectos comuns à cultura inglesa da época vitoriana. Até
mesmo
na Inglaterra é provável que o leitor de Alice não seja capaz de compreender
todos
os
significados propostos por Carroll, considerando os costumes do século XIX, as
menções
ao
folclore regional, as piadas que só eram entendidas em Oxford e as alusões à
sociedade
daquele
período.
A
inversão do sentido presente na obra pode ser caracterizada como crítica,
considerando-
se
a Inglaterra de meados do século XIX como um dos países onde mais se afirmava a
racionalidade,
ou ao menos um princípio lógico para justificar tudo na sociedade, até mesmo
questões
difíceis de serem justificadas, como os privilégios e a miséria.
9. Considerações Finais
Para
uma interpretação mais satisfatória do romance Alice
no País da Maravilhas,
foi
necessária uma pesquisa sobre os diferentes temas abordados de forma direta e
indireta
dentro
da obra, pois o autor Lewis Carroll utilizou-se de vários fatores de seu
cotidiano como
também
de conhecimentos matemáticos e científicos para criar os episódios que compõem
o
livro.
A
composição da história criada durante um passeio de Carroll e das irmãs Liddell
pelo
rio Tâmisa sofreu influência das várias lembranças da infância do autor no
Condado de
Cheshire
e também dos conhecimentos por assuntos que muito interessavam a ele, como a
matemática
e as diversas teorias científicas, que determinaram todo o desenvolvimento da
trama
de Alice, principalmente no que diz respeito à ligação dos capítulos pelas
inúmeras
mudanças
de tamanho sofridas pela personagem principal.
As
críticas e alusões a costumes da sociedade inglesa do período vitoriano também
tiveram
imensa importância na construção do romance, o que de certa forma, torna a
compreensão
para leitores externos a este contexto um tanto complicada, pois o livro traz
informações
em que a compreenção ficaria limitada, até mesmo, a determinadas regiões da
Inglaterra.
Assim,
fizemos uma leitura do romance tão profunda quanto nos foi possível com o
objetivo
de compreender um pouco melhor o enredo do mesmo, desvendando o universo
dessa
trama que mistura “sonho” e “realidade”, seduzindo os leitores através do
fantástico.
Li-Sol-30
www.oocities.org/heartland/plains/2619/alice.html
www.gnosisonline.org/.../a-simbologia-esoterica-de-pi.
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