O cubismo literário afirma-se a partir de um artigo de Georges Polti, aparecido na revista Horizon (15-11-1912) e durará até 1920, sendo divulgado em várias revistas literárias.
Tornam-se obras de referência do cubismo literário títulos como Le Cornet à dés (1917), de Max Jacob, Espirales (1918), de P. Dermée, Calligrames (1918), de Apollinaire, e Le Cap de Bonne-Espérance (1919), de J. Cocteau.
Em Portugal (mas vivendo em Paris), Santa-Rita Pintor descobre a nova estética expondo o seu quadro O Silêncio num Quarto sem Móveis, no Salão dos Independentes em Paris.
Mário de Sá-Carneiro, companheiro de Santa-Rita em Paris, é o primeiro a atentar no cubismo literário e artístico, escrevendo alguns versos segundo os preceitos desta estética. A primeira vez que se lhe refere é numa carta a Fernando Pessoa:
"No entanto, confesso-lhe, meu caro Pessoa, que,
sem estar doido, eu acredito no cubismo.
Quero dizer: acredito no cubismo, mas não nos
quadros cubistas até hoje executados. Mas não
me podem deixar de ser simpáticos aqueles que,
num esforço, tentam em vez de reproduzir
vaquinhas a pastar e caras de madamas mais
ou menos nuas — antes, interpretam um sonho,
um som, um estado de alma, uma deslocação
de ar, etc. Simplesmente levados a exageros de
escola, lutando com as dificuldades duma ânsia
que, se fosse satisfeita, seria genial, as suas
obras derrotam, espantam, fazem rir os levianos.
Entretanto, meu caro, tão estranhos e
incompreensíveis são muitos dos sonetos
admiráveis de Mallarmé. E nós compreendemo-los.
Porquê?
Porque o artista foi genial e realizou a sua intenção. Os cubistas talvez ainda não a realizassem. Eis tudo."
(Cartas a Fernando Pessoa, vol.I, Ática, Lisboa, 1978, p.80). Fica ainda o registo do célebre comentário de Sá-Carneiro à catedral da Sagrada Família, em Barcelona, que classifica como uma "Catedral Paúlica (...) Sim! Pleno paulismo — quase cubismo até". Sá-Carneiro deixou-nos em Indícios de Oiro alguns versos que são já verdadeira poesia cubista, como o poema "Cinco Horas" que contém quadras como estas:
Minha mesa no Café,
Quero-lhe tanto... A garrida
Toda de pedra brunida
Que linda e que fresca é!
Um sifão verdade no meio
E, ao seu lado, a fosforeira
Diante ao meu copo cheio
Duma bebida ligeira.
(Eu bani sempre os licores
Que acho pouco ornamentais:
Os xaropes têm cores
Mais vivas e mais brutais).
Em comentário a este poema, Alfredo Margarido nota que "não é difícil reconhecer a analogia com a pintura cubista, que fez do café, do seu mobiliário e dos objectos que aí circulam o centro vital da sua busca plástica.
Minha mesa no Café,
Quero-lhe tanto... A garrida
Toda de pedra brunida
Que linda e que fresca é!
Um sifão verdade no meio
E, ao seu lado, a fosforeira
Diante ao meu copo cheio
Duma bebida ligeira.
(Eu bani sempre os licores
Que acho pouco ornamentais:
Os xaropes têm cores
Mais vivas e mais brutais).
Em comentário a este poema, Alfredo Margarido nota que "não é difícil reconhecer a analogia com a pintura cubista, que fez do café, do seu mobiliário e dos objectos que aí circulam o centro vital da sua busca plástica.
Por outro lado, o poema de Sá-Carneiro pertence a um registo inteiramente visual, como se o poeta estivesse a elaborar um desenho onde o carvão fosse alegrado pelas cores dos xaropes" (1990, p.101).
Fernando Pessoa esteve igualmente atento a este nova estética, embora sem a adoptar como modelo de escrita. Registam-se apenas alguns comentários e raros versos soltos próximos do cubismo. Em 1915, Pessoa escreve um "Manifesto", onde regista as diferenças entre "cubismo", "interseccionismo" e "futurismo":
Álvaro de Campos, num dos poemas dedicados a Walt Whitman, "Futilidade, irrealidade, (...) estática de toda a arte" (s.d.), esboça um poema de inspiração cubista:
Poema que esculpisse em Móvel e Eterno a escultura,
Poema que (...)se palavras
Que (...) ritmo o canto, a dança e (...)
Poema que fosse todos os poemas,
Que dispensasse bem outros poemas,
Poema que dispensasse a Vida.
Irra, faço o que quero, estorça o que estorça no meu ser central,
Force o que force em meus nervos industriados a tudo,
Maquine o que maquine no meu cérebro furor e lucidez,
Sempre me escapa a coisa em que eu penso,
Sempre me falta a coisa que (...) e eu vou ver se me falta,
Sempre me falta, em cada cubo, seis faces,
Quatro lados em cada quadrado do que quis exprimir,
Três dimensões na solidez que procurei perpetuar...
Sempre um comboio de criança movido a corda, a corda,
Terá mais movimento que os meus versos estáticos e lidos,
Sempre o mais verme dos vermes, a mais química célula viva
Terá mais vida, mais Deus, que toda a vida dos meus versos,
Nunca como os duma pedra todos os vermelhos que eu descreva,
Nunca como numa música todos os ritmos que eu sugira!
Nunca como (...)
Eu nunca farei senão copiar um eco das coisas,
O reflexo das coisas reais no espelho baço de mim.
(Álvaro de Campos - Livro de Versos, edição crítica de Teresa Rita Lopes, Estampa, Lisboa, 1993)
De uma forma geral, a literatura cubista entende o poema como um objecto artisticamente autónomo, evitando o descritivo e privilegiando as descontinuidades e a fragmentaridade das ideias e dos versos. Não ordena os registos da memória, não narra o contínuo histórico, não opta por lirismos fáceis, não escreve sobre sentimentalismo amorosos. Graficamente, desafiam as convenções da escrita, não respeitam a gramática nem a prosódia, preferem a paródia da representação tradicional dos objectos.
Fonte:
http://www.bepeli.com.br/cubismo.htm
http://www.fcsh.unl.pt/edtl/bullet3c.gif
Sejam felizes todos os seres.
Vivam em paz todos os seres. Sejam abençoados todos os seres.
2 comentários:
Ótimo post! Me ajudou bastante.
Parabéns..
Sempre me falta, em cada cubo,
seis faces,
Quatro lados em cada quadrado
do que quis exprimir,
Três dimensões na solidez que procurei perpetuar...
Ah que delícia vagar nesta onda cubista!
Com quantos lados,ledos,lidos se faz uma alegria? Heim?
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